A maioria e as contas

Andava eu sem saber sobre o que escrever e surgem-me duas noticias: ministra (das finanças) não exclui novos cortes nas pensões e ministro da saúde quer indexar despesa do sector a percentagem fixa do PIB.

Ambos me causaram perplexidade.  Mas começando por Maria Luís Albuquerque,  como é explicável esta afirmação, depois da maioria andar a “vender”  que salvaram Portugal do despesismo socialista?  Não andaram a colocar em todos os meios de comunicação que agora é que o país estava no rumo certo e se os socialistas voltarem ao poder está tudo perdido?  Então,  porque ponderar mais cortes?
A explicação é simples: quem paga para a segurança social é a população activa, com emprego. E se já existia mais pessoas a receber do que a pagar, devido ao envelhecimento da população, com a enorme taxa de desemprego, há cada vez menos gente a pagar. E como o governo da maioria preferiu cortar nas pensões em vez de criar condições para aqueles que estão no desemprego arranjem uma ocupação e recomecem a contribuir, a tendência é para que as contas da Segurança Social nunca se aproximem do equilíbrio. Porque se o caríssimo leitor pensar bem, aqueles que estão no desemprego continuam a receber pensões sociais (como a do desemprego). Então, cada português no desemprego é (efectivamente ou em potência) uma despesa para a Segurança Social, quando podia ser uma receita, se o Estado tivesse politicas que fomentassem o emprego, quer no sector público, quer no privado.

Paulo Macedo,  por seu turno,  pensou em fazer como na defesa e limitar a despesa na saúde a uma percentagem do PIB,  de forma a controlar melhor a despesa.  Eu concordo em absoluto em melhoria do controlo da despesa,  mas indexar a uma percentagem do PIB?  Então isto quer dizer que,   situação de crise económica como a que vivemos,  que leva à queda do PIB,  a despesa do SNS teria obrigatoriamente de descer. O que quer dizer que os portugueses,  já a sofrer com a crise económica (nomeadamente o aumento da taxa de desemprego e da pobreza),  seriam ainda confrontados com a diminuição da capacidade de resposta do SNS,  por ter de fazer a despesa descer.
Há uma verdade absoluta que ninguém pode esquecer: não é suposto a Saúde (ou o SNS) dar lucro. O lucro do SNS é qualquer vida salva, qualquer doente curado, qualquer família acompanhada. Não quero dizer com isto que se deve gastar desmedidamente. Mas podemos poupar no desperdício, podemos poupar nos cargos de chefia e podemos poupar sendo mais eficazes e eficientes. E aumentar no que faz falta, que são essencialmente as pessoas, os profissionais de saúde (enfermeiros e médicos, em especial) e nos meios (equipamentos e medicamentos) mais eficazes e económicos. Nós temos o Infarmed e das melhores universidades do mundo. Unindo esforços com os hospitais, podemos chegar às soluções mais eficientes para o SNS. Mas precisamos de pessoas que percebam e pensem em Saúde à frente do ministério e não gestores que só pensam com a calculadora.

Crónica de João Cerveira

Este autor escreve em português, logo não adoptou o novo (des)acordo ortográfico