A teoria da minha professora primária – Telma Henriques

Eu sou do tempo em que aos professores do primeiro ciclo do ensino básico se chamava: ” professor primário”.

Como era (e talvez ainda seja) uma profissão maioritariamente feminina  tive uma “professora primária”.

Eu própria, num período já distante, também fui “professora primária”.

Porque era um curso que ficava “bem” às meninas.

Ser-se  “professora primária” é um bocado pejorativo.

É-se “primária”.

Sei que o é porque durante anos ouvi esta piadola*:

“És um bocado primária, tu, pá!”

Fui para a escola primária (vão desculpar-me a utilização e a repetição da expressão) logo após o 25 de Abril de 1974.

Numa aldeia perdida no Portugal mais ou menos profundo.

A minha professora era extraordinária.

Apesar de gostar muito do “respeitinho”.

De não embarcar em “revoluções”.

Era, por natureza, uma alma recta.

E justa.

De quando em vez utilizava uma forma de “pedagogia activa” que hoje está em desuso.

Nós, os seus alunos, não lavávamos a mal.

Embora o rabo nos doesse.

A sua utilização da dita pedagogia era digna de uma tese de mestrado.

As nossas orelhas localizavam-se no rabo quando estávamos a ser inconvenientes ou mal educados.

Nunca a santa senhora a utilizou para “reforçar” o ensino de qualquer matéria.

Quando não percebíamos alguma coisa  era a própria imagem da paciência. Da bondade. Da ternura.

Quando algum de nós tinha mais de três erros no ditado (três – era o limite) tínhamos de escrever vinte vezes a palavra da forma certa.

Era esta a punição.

Se nos enganávamos numa conta  ou não percebíamos o raciocínio por detrás de um problema o “castigo” era ir ao quadro preto e de lá não sair até termos percebido.

As crianças são cruéis como sabeis, daí que:

o desgraçado (a) a quem acontecessem tais “horrores” ouvia vezes sem conta a palavra “burro” (a) da boca dos colegas.

Ao recreio.

À saída.

À entrada.

Hoje seria considerado bullying naquela altura era “a vidinha”.

Ora a minha professora não era surda.

Um belo dia decidiu explicar-nos a diferença entre ser-se “burro” e ser-se “ignorante”.

“Ignorante – dizia ela –  é quem não entende. A culpa não é dele (a). É de quem não lhe explicou devidamente.”

“Burro” – dizia ela – é quem não sabe, não quer saber e não deseja que lhe expliquem porque está convencido que sabe tudo.”

Aplicando a teoria da minha professora à vida real podemos  inferir :

estamos (nós) os “ignorantes” a ser governados pelos “burros”.

Estava capaz de dar um rim para não ser “ignorante”.

Dinheiro é que não.

As minhas filhas têm a mania de comer (pelo menos) três vezes ao dia. (parecendo que não,  sai caro)

Tenho de pagar impostos.

Água.

Luz.

De modo que, peço encarecidamente:

um professor/explicador capaz de me fazer entender aquilo que não percebo.

PSSTTT  Ó DR. ANTÓNIO BORGES!!! 

Pode atender ao meu pedido?

Agradecida.

* Piadola: é uma piada sem muita graça

 

E assim me vou.

Até para a semana!

 



Crónica de Telma Henriques
1001 teorias para ler antes de morrer