– Olá olá, outra vez nas compras?
– Foi só uma saia, Guida…
– Espero que tenha bolsos, para esconder essas mãos!
Lembram-se deste anúncio? Pois eu lembro-me. Não sei qual era a marca de creme de mãos (acho que Atrix) mas lembro-me do diálogo porque cada vez que alguém me dizia “Olá olá” eu não resistia a fazer um monólogo em duas vozes. E já agora, lembram-se de mim? Crónicas do cocó mas sem cheiro? Hmm? Alguém?
Pois a maioria provavelmente não se lembrará… outros, simpatizantes e apoiantes destas diarreias cerebrais lembrar-se-ão de moi même. Pois é, para os que se lembram, I’m alive! Não me “esmerdei” (mais nenhuma vez, só mesmo aquelas duas vezes…curvas desgraçadas) de triciclo pelas ruas e rotundas de Barcelona e confirmo que conduzir em duas rodas é muito divertido e faz bem à alma. Descobri também que parar nos semáforos bem equipada debaixo de um tremendo calor é terrível e que cantar de capacete é muito mais divertido do que cantar no carro porque ninguém percebe que estou aos berros.
Para os que não me conhecem…Olá, o meu nome é Sofia e adoro escrever crónicas do Cocó no Mais Opinião e é um privilégio fazer parte desta família talentosa e maravilhosa, mesmo que seja uma filha desnaturada que não tem vindo visitar com a frequência desejada mas tenho desculpa, sou emigra e isto de uma hora de diferença provoca-me muito jet lag.
A verdade é que desapareci desde a minha visita de emigra a Portugal. Cansaço, pouco tempo livre para devaneios literários mas muito aconteceu desde lá. Fiquei mais sábia (alguns gostam de dizer que se ficou mais velho… eu prefiro sábia), descolorei o cabelo e pu-lo vermelho mas durou pouco…back to black again! Além da sabedoria, ganhei também mais umas gramitas de stress ternurento, algum bronze mediterrânico, acabei as quinze temporadas do E.R., visitei a Costa Dourada e mais…e mais…
Ah, estou finalmente um pouco melhor da alergia graças à vacina mensal que estou a tomar desde que regressei de Lisboa, tive cá a mamã e a priminha a celebrar os meus redondos 38 anos, descobri que conduzir mota me faz queimar calorias exatamente como se estivesse a fazer caminhadas (descoberta feita graças à minha pulseira Fitbit e que me deixou radiante pois encontrei o meu novo desporto!) e claro, como qualquer emigra que se preze tenho sofrido horrores com o Euro 2016.
Provavelmente irei, mais uma vez, sumir-me como uma autêntica ninja porque se avizinha um projeto de revisão de tradução que me vai fazer dormir à pressa durante umas quatro a seis semanas e… bolas! Porque preciso de férias em modo dolce far niente! Mas se sentirem assim muito, mas mesmo muito a minha falta, gritem “queremos cocó” e eu venho aqui escrever umas calinadas.
Mas a principal razão pela qual regressei esta semana prende-se com o facto de ter começado a pensar…”Oh Sofia, mas isto é o Mais Opinião. Ok que podes escrever o que te dá na telha mas já agora podias efetivamente opinar sobre algo, não?”
Barcelona é a terra da arte, da água quentinha, repleta de energia positiva mas nem tudo são rosas senhores. Pois é, Barcelona é também a terra das lombas (que fazem o meu delicado traseiro saltar do triciclo com bastante frequência) e… dos petardos! Eles é petardos porque o Barcelona joga, eles é petardos porque há festa no bairro, eles é petardos só porque sim…
Existem dezenas e dezenas de lojas que só vendem petardos, quiosques que vendem petardos, petardos online… é a terra do petardo. Chega o calor e com ele estes barulhinhos que me deixam “petardada” da vida. Desde meados de Maio até Setembro é o pão nosso de cada dia. O lema deles é cem petardos por dia dão saúde e alegria!
E claro, nada melhor do que uma festividade para usar petardos com fartura. Estou a falar da Fiesta de San Juan, ou para os locais, Revetlla de Sant Joan, uma festa pagã que celebra o solstício de Verão, o dia mais longe ou a noite mais curta do ano (para mim, a noite maislonga do ano!) e onde a luz vence as trevas. Na noite de 23 de Junho acendem-se fogueiras para queimar todas as coisas más. Esta festa traz com ela o feriado de dia 24 e uma semana de pura loucura.
Aqui no bairro a festa começou logo dia 22 e acabou dia 26. Muitos concertos no parque, fogueiras na praia, coca e cava (não se trata de todo de malta a consumir cocaína como se não houvesse amanhã e a cavar as suas próprias sepulturas mas sim de um bolo local, que de aspeto faz lembrar o nosso Bolo Rei, acompanhado de vinho espumante Cava, semelhante ao champanhe francês e que é muito apreciado por estas bandas) e claro, muito fogo-de-artifício e… petardos!
Eu sofro um pouco se estiver na rua porque literalmente salto de susto cada vez que rebenta um petardo. Mas se eu sofro, o meu Nine Manuel sofre muito mais… A Zucka pronto, não gosta dos petardos e eriça-se toda e ladra que nem uma louca mas consigo dissuadi-la com um biscoito. Já o Nine, pobre coitado, faz dó de ver. O D. diz “pois, tu estragas o cão todo com mimos”… provavelmente tem razão! Mas ainda assim, Barcelona não é muito simpática com o Nine Manuel. Trovoadas com relativa frequência e os ditos cujos petardos.
Claro está que nesta altura passeá-los no parque está fora de questão e infelizmente qualquer zona é complicada porque tranquilidade é zero. Mas nem em casa estamos safos! Chegamos a ter mais de 8 horas non-stop de petardos e não sei como o pobre não tem um fanico. Ele treme, ele salta pelas nossas cabeças, ele esconde-se onde pode…não há como distraí-lo. Nem com biscoitos, nem com a televisão bem alta. E eu até me porto muito bem porque, apesar de me custar horrores, aguento-me firme e não o vou confortar porque não quero reforçar o comportamento e sentimento de medo.
No ano passado experimentei o Adaptil em difusor. Basicamente este produto liberta constantemente no ar, uma feromona que acalma os nossos patudos (mais precisamente a feromona que as cadelas libertam para tranquilizar os seus filhotes). É inodora para nós humanos de duas patas e outros animais. Resultou? Bom, estavam mais tranquilos de uma forma geral mas ainda assim reativos aos barulhos. O pobre Nine andou atormentado a pensar “que mal fiz eu para emigrar!”
Pois este ano, já a antever a semana diabólica que se avizinhava, lembrei-me de ter lido algo sobre exercer pressão na zona do dorso para acalmar os patudos e lá fui eu investigar. Acabei por descobrir uma roupita que dizem ser milagrosa e que ajuda a uma série de comportamentos e fobias, a ThunderShirt! Para começar, o nome é fantástico, comecei logo a imaginar o Nine a correr entre petardos a gritar “I’m the Thunder Dog!”.
Basicamente, esta capa milagrosa exerce pressão suave e constante na zona do dorso, fazendo com que cães ou gatos se sintam abraçados, ficando assim calmos e menos ansiosos. Como o Nine é um ratinho elétrico, comecei logo a considerar as situações em que a capinha poderia ajudar e até mesmo para a Zucka, dado que fica muito ansiosa cada vez que saímos e gosta de esburacar paredes como se tivesse mestrado em construção civil. Vi uns vídeos do produto e fiquei convencida. Claro está que eu podia ter feito uma camisola que exercesse o mesmo efeito mas como não tenho jeito nenhum para essas coisas e o prazo era curto, comprei para experimentar com o Nine.
Resultados…
Bom, a camisola não fez milagres mas ajudou bastante. O intestino do Nine nestes dias teimou em não trabalhar e a noite de 23 foi mais uma vez de petardos das 16 às 4 da manhã mas, ao contrário do ano anterior, o Nine esteve mais tranquilo. O facto de a Zucka reagir aos petardos também fazia alguma diferença. Quando ela ladrava, ele ficava mais nervoso, se ela não ladrasse, ele deixava-se ficar, portanto, acalmando a Zucka, acalmava-se o Nine. Só posso dizer que fiquei com o braços dormentes de tanto afagar e massajar as costas da Zucka para que não ladrasse. Já imaginaram o que são sete horas de petardos non-stop?
Efetivamente, notei que com esta camisola ele reagia de forma muito menos ansiosa e medrosa, e saía do registo “pânico” mais rapidamente. Claro que na rua, estava sempre ansioso, a caminhar rápido e bastava um petardo para deitar o passeio ao lixo. Depois do som, era vê-lo a puxar a trela para vir para casa e a esgravatar todas as portas dos prédios para entrar. No entanto, não o vi saltar sob as nossas cabeças nem fugir para a casa de banho como no ano passado. Lá se mexia, reclamava e deitava-se novamente, sem os habituais tremores de pavor.
Tenho alguma pena de não ter ainda participado deste grande evento e ver realmente como é a festa, mas não me imagino a deixar os meus meninos sozinhos numa noite como esta… nem pensar!
Pronto…e lá escrevi eu um testamento gigante para opinar muito pouco… desculpem lá qualquer coisinha! Over and out!
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