Diz que… A visão dos estrangeiros e a nossa

A minha crónica de hoje foi “desviada” nas últimas horas. Um debate na televisão ontem à noite (que já vi repetido esta tarde) fez-me mudar a ideia que tinha para esta crónica. Mas acho que os leitores ficam a ganhar.

O debate tinha como tema “a crise e Portugal, analisada por jornalistas estrangeiros”, moderado pela Cecília Carmo, na RTP Informação, e contou com um jornalista brasileiro, um jornalista alemão e uma jornalista espanhola. Destes, a que está em Portugal à menos tempo é a espanhola, e já reside no nosso país há 10 anos (inclusivamente o filho da mesma nasceu cá, confidenciou).


Retive algumas afirmações dos intervenientes deste debate. O jornalista alemão disse não ver com bons olhos que produtos com o mesmo custo de produção sejam vendidos ao dobro do valor em Portugal, do que na Alemanha. O jornalista brasileiro disse que, sendo uma crise politica, têm de ser os políticos a resolver, mas a população tem de ajudar permanentemente, através do movimentos cívicos. Disse também que de cada vez que há uma alteração politica num país, todo o “aparelho especulativo” (a expressão é de minha autoria) move-se e ganha dinheiro. A jornalista espanhola afirmou que, aquando da entrada na CEE, Espanha defendeu a sua agricultura e pescas e com isso ganhou uma maior quota nessas áreas, algo que Portugal não fez na altura e devia fazer agora. Outro facto apontado é o de que, na manifestação dos indignados, os portugueses foram lá marcar a sua posição, mostrar a sua insatisfação, mas não foram para a violência, não foram criar distúrbios, o que leva a jornalista espanhola a acreditar que o povo português é um povo com futuro, um povo que marca a sua posição, mas com responsabilidade.

Esta visão dos jornalistas estrangeiros a trabalhar em Portugal não será nova para a maioria dos portugueses, mas tem visões que há muito foram convenientemente esquecidas. Já ninguém se recorda (a não ser com “reminders” do género do que estamos hoje aqui a fazer) que, 13 anos depois de termos aderido à CEE,  a PAC (Politica Agrícola Comum), criada em 1982 (antes da nossa adesão), foi revista em 1999, tendo Portugal sofrido rude golpe nas quotas dos produtos agrícolas e do pescado que podia comercializar, em favor de outros países como França ou Espanha que foram claramente beneficiados. Recuperando a opinião da jornalista espanhola, bem como de muitas outras personalidades, reveladas ao longo dos anos, o Governo de então, liderado pelo nosso actual Presidente da Republica, não soube ou não foi capaz de, na negociação, defender os interesses da nossa agricultura e pescas. E que falta nos fazia agora que esses sectores não tivessem sido, à altura, decapitados, pois importamos muitos produtos que podíamos produzir, em quantidade e qualidade.

Outro alerta a lançar é o dos preços excessivamente altos. Sem limite de margens de lucros, as empresas colocam os preços nos valores que entendem. Nalguns casos com margens de lucro fabulosas. Especialmente a seguir à adopção da moeda única, aproveitando a confusão que isso criou na cabeça da maioria dos portugueses. E normalmente são essas as mesmas pessoas que hoje em dia se queixam da crise e de quão mal andam os negócios.

Por fim mas não menos importante, há algum tempo atrás comentava entre amigos que esperava que os portugueses fossem inteligentes e não começassem a partir coisas que, na maior parte das vezes, é o erário público (ou seja, todos nós) que vai pagar. As recentes manifestações têm mostrado que os portugueses são realmente inteligentes, cientes que uma manifestação deve ser encarada como uma acção  responsável, civilizada, de exercício pleno de cidadania num Estado de Direito democrático, e não num ringue de pancada, violência e destruição. Bem hajam todos aqueles que encaram as manifestações desta forma e, mantendo esta postura, continuam nelas a participar.