Eu…e…Ela! – Aida Fernandes

Hoje quando falava em família que ia escrever a minha cronica, e que por falta de tempo começava a ficar preocupada, a minha filha abordou-me com a seguinte questão: – mãe, ainda te resta que escrever sobre velhinhos?- Claro que sim filha, resta e restará, falar sobre o ser humano e sobre aquilo que vivemos diariamente lado a lado, nas experiências diárias, é algo que não tem limite. Ela olhou-me e disse: …tens razão…mas acho que ás vezes é um pouco triste e que já vives tanto o dia a dia deles!… Pois, mas aí é que está o segredo… viver e amar o que fazemos é a chave para a nossa felicidade e para a dos outros! Então lembrei-me…

– se eu fosse velhinha que terias tu para dizer sobre mim? Claro que ainda não sou (só um bocadinho!), mas se estivesse já velhinha ou incapacitada como me julgarias?

Que pergunta mãe, não quero pensar que vais ficar velhinha, apesar de achar que com este andar, se nada te acontecer, vais ser uma velhinha muito querida!…. Agora já és uma mulher que fazes tudo pelos outros, pareces uma jovem, tens uma vontade incrível de viver e vencer, tens atitudes de “adolescente” que muitas vezes comento com as minhas amigas!…Ao mesmo tempo as lágrimas começaram a cair-lhe pelo rosto…e eu pensei! Que fiz eu, fui mexer com a sensibilidade de uma jovem, que não tem que se preocupar já com esta etapa! Tentei dar-lhe a perceber que não é preciso lágrimas quando se fala em velhice, acima de tudo é preciso coragem, amor, carinho e muita paciência.

-Pois mãe, mas só em pensar eu fico triste, continuava ela…ficas triste porque ainda não aprendeste a lidar com este avanço da idade! Mas á medida que os anos forem passando tu vais aprender e lidar melhor com tudo isto. Há uma coisa que eu quero que tu saibas…se eu sou mãe, sou mais velha, se sou mais velha, vou envelhecendo primeiro….isso é inevitável! Por isso só te peço … que tenhas paciência e carinho com os idosos…que escrevas algo sobre mim quando eu já não estiver cá, sabes porquê? Porque eu li um dia assim…”Não vivas de forma a que a tua presença seja notada mas de forma que a tua ausência seja sentida”. Aí sim, vais ver que vale a pena escrever e falar sobre idosos…velhos…chatos…como lhe queiras chamar.

Eu nunca te vou exigir nada, Saramago diz que”…filho é um ser que nos emprestaram para fazer um curso intensivo de como amar…”, eu concordo na sua plenitude, não te quero assustar com a minha velhice, não quero que te preocupes, se a vida permitir que me ajudes se eu precisar, eu vou ficar feliz, se não permitir, vamos viver da forma que o futuro tem para nos reservar.

Detesto aqueles pais que passam a vida a pensar que os filhos têm obrigação de tudo, muitas vezes imploram a sua forma de viver a todo o custo. Não temos esse direito, temos sim o dever de ir caminhando lado a lado até onde for possível.
Com esta conversa, desviei o tema que tinha pensado para esta semana he he he….até prometia! Falar de sexo…sexo e tudo o que envolve o tratamento a homens na terceira idade! Como eles reagem ás mulheres! Como se comportam!…tantas outras coisas!

Afinal há mesmo muito ainda que falar…mas vai ficar para a próxima cronica, hoje dedico esta á minha filha, porque tenho a certeza que ela própria vive comigo todo este envolvimento que tenho com os idosos…até ponderamos hoje fazer um Natal com alguns deles!

Só para concluir a nossa conversa:- sabes uma coisa filha, se me fizesses a mesma pergunta, eu iria responder-te o seguinte:- Tu já foste velhinha para mim, porque já te carreguei nove meses dentro da barriga, já te mudei as fraldas, já te dei de comer, já te dei banho, já fiz tudo o que se faz a um velhinho…já deixei de dormir noites sem fim…ia contigo ao médico e tinha que lhe explicar o que tinhas (porque tu ainda não eras capaz) …e tantas outras coisas que não fazendo parte da ultima mas sim da primeira, muito se identificam!

Ela olhou-me novamente nos olhos…e juntas…deixamos cair as lágrimas! Mas lágrimas de emoção!…e eu, consegui ser uma “velhinha” muito feliz! Acho que por momentos tive um envelhecimento precoce!

Aida FernandesLogo

Crónica de Aida Fernandes
A última Etapa