Greve dos funcionários públicos – a paródia dos beneficios – Sandra Castro

Sou a Sandra, tenho 28 anos, e sou funcionaria de uma empresa cuja actividade é o comercio, empresa esta que não usufrui de nenhumas regalias do Estado, muito pelo contrário, paga impostos, muito pesados no orçamento de uma empresa, como IVA, IRC, Segurança Social, para cobrir as despesas desnecessárias que o Estado têm.

No dia 8 de Novembro, sexta-feira (dia interessante para se fazer uma greve), eu tive poucos clientes, trabalhei pouco e consequentemente a empresa para qual eu trabalho, não facturou nada nesse dia.

Como empregada de balcão que sou, e como pessoa inferior ao estatuto que os funcionários públicos têm, e que vossas excelências fazem tanta questão de o demonstrar, não sou licenciada, percebo pouco de cultura, leis, direitos e deveres, portanto fui pesquisar na Wikipedia o significado de greve.

Greve é a cessação colectiva e voluntária do trabalho realizada por trabalhadores com o propósito de obter benefícios, como aumento de salário, melhoria de condições de trabalho ou direitos trabalhistas, ou para evitar a perda de benefícios. Por extensão, pode referir-se à cessação colectiva e voluntária de quaisquer actividades, remuneradas ou não, para protestar contra algo, de conformidade com a CLT.

Repito, como sou uma simples e reles empregada de balcão que limpa retretes e serve cafés no balcão (não necessariamente por esta ordem), não leio jornais nem leio livros, também fui pesquisar na Internet os motivos desta greve.

A greve dos funcionários públicos, no dia 8 de Novembro de 2013, foi convocada para protestar e dar resposta às medidas gravíssimas (dizem eles) do Orçamento do Estado para 2014, medidas entre as quais destaco:

Cortes entre 2,5 % e 12% às remunerações mensais acima dos 600 euros. Como sou uma ignorante da classe media-baixa, fui buscar  a minha velha maquina de calcular. Ora num ordenado de 620 euros, o funcionário do estado vai perder 16 euros e uns cêntimos. Acho que esta valor qualquer um de nós pode engolir em prol de um país em crise! Num ordenado de 1000 euros, vai perder 52 euros e uns trocos. Ora, 52 euros é o valor que as famílias de pobres rendimentos, com salários mínimos de 431 euros com os descontos, pagam pelos passes dos filhos para estes frequentarem as escolas. Num ordenado de 1200 euros o funcionário vai ver emagrecer da sua conta 78 euros e uns trocos. Este valor é o abono de família que fui obrigada a ceder recentemente em prol da santa crise, eu e muitas famílias. Num cheque de 1500 euros, emagrece 129 euros e uns cêntimos. Acham muito dinheiro? Eu também! E de facto é! Mas têm a noção de quantos funcionários de empresas privadas viram os seus ordenados descerem em valores francamente mais altos do que este? Não, não têm a noção!

Aumento da carga horária de 35 horas semanais para as 40 horas semanais. Não percebo o porquê de tanta choradeira e tanta birra! Eu sempre trabalhei 40 horas semanais, muitas vezes 50 horas, eu e milhares de portugueses, e desculpem a expressão grotesca, nunca me caiu nada ao chão! O problema que se coloca aqui é que, muitos destes funcionários não trabalham por vocação, foram parar a uma repartição das finanças, a um balcão da segurança social ou a um lugarzinho na câmara municipal através da famosa cunha, o tio, o irmão, o pai, o primo, enfim. E quando temos que, obrigatoriamente, nos deslocar a esses locais deparamos-nos com caras feias e antipáticas, com um atendimento lento e arrogante, sem qualquer empenho em ajudar a pessoa que está à sua frente.

Redução em 3% os trabalhadores nas empresas públicas e em 2% os funcionários do Estado. Acho uma boa medida se está for iniciada na Assembleia da República pelos 230 Deputados, que a julgar pelas fotos que circulam na Internet, uns a tirar uma sesta, outros com a pagina do facebook ligada, parece-me uma medida justa.

Não é permitido o recrutamento de trabalhadores que não possuam já um vinculo público e também fica restringido a renovação dos actuais contratos a termo, nada que já não aconteça no sector privado.

Com as medidas de mobilidade especial e  rescisões amigáveis, o Governo pretende emagrecer os quadros de pessoal em 30 mil funcionários públicos e poupar mais uns quantos milhões. Ora, vamos pensar bem nesta medida, se 30 mil vão dar de frosques, então quer dizer que eles não eram realmente necessários? Estavam funcionários a mais nos serviços? Os que lá vão ficar vão rentabilizar mais o seu trabalho? Então esses supostos 30 mil nunca deviam ter ido lá parar e assim, nunca se gastaria o que agora se está a tentar poupar!

Aumento dos descontos para a ADSE. Desculpem a minha sinceridade, mas nunca percebi o porquê desta treta existir! Se eu vou ao medico e tenho de pagar, porque raio os funcionários públicos têm um sistema que financia as suas despesas de saúde? Depois é vê-los irem ao dentista, ao ginecologista, ao psicólogo, ao massagista terapêutico e mais não sei o quê…

O mesmo sucede com o subsidio de doença que vai convergir com o do privado. Já não era sem tempo! A receberem  o ordenado por inteiro, com excepção dos primeiros 30 dias em que lhes é retirado 10% do ordenado, depois é vê-los ( lá estou eu com os meus palpites) a estarem em casa de baixa, numa boa, a curtirem na maior a sua doença chamada cara-de-pau ou ainda outro nome engraçado, grande-lata!

Férias diminuem de 25 dias para 22 dias, como no privado. Mais uma vez, é uma medida que nunca devia ter sequer existido, porque não há motivo algum para a função pública ter mais dias de ferias que o resto da população.

Não interpretem mal a minha arrogância, fazer greve é um direito nosso. Não me confundam com a Margarida Rebelo Pinto (eu sou mais bonita e menos feminista) , apesar de que gostei e concordo com algumas coisas que ela referiu. Acho apenas que, na minha humilde opinião de empregada de balcão, que a função pública esteve muitos anos a usufruir de benefícios que só lhes beneficiou para proveito próprio e não para a economia do país. Aproveitaram-se da abundância e do estatuto de funcionário público, e deram isso como garantido. Agora o Governo quer retirar esses benefícios, que na realidade nunca deveriam ter sido dados, porque a função pública deveria ter estado sempre ao nível do sector privado. Afinal, somos um povo ou não somos?

Crónica de Sandra Castro
Ashram Portuense