Há males que vêm por bem

Há males que vêm por bem, diz o ditado popular português. Às vezes até é verdade.
Entregar e distribuir o CV por todo o lado é algo que remete para o “déjà vu” – ou “déjà moo”, quando a merda das situações (the bullshit) se repete indefinidamente nos argumentos do costume: habilitações literárias a mais; não haver verba suficiente para pagar a um tão bom CV (!!) ; perfil não adequado aos cargos de call center – agora tão na moda como technical adviser  ou treta semelhante a nível de nomenclatura – que querem candidatos com licenciaturas e mestrados, e conhecimentos de línguas e outros atributos e lhes atiram com o ordenado mínimo nacional para trabalhar 40 horas por semana, em turnos de 8 horas (que podem ser nocturnos) e que falam sempre em prémios indefinidos. 

outofafrica

Mas entregar o CV é tarefa de desbravar terrenos que já estão “arrendados” aos conhecidos e amigos; prisioneiros do sistema, presos por dentro a uma nova escravatura dos séculos da globalização. Muitas entidades ditas empregadoras nem se dão ao trabalho de enviar uma resposta curta e simpática. Não há tempo para isso, desculpam-se. Muitos candidatos, muitos CV’s para analisar. Não têm tempo. Então, deixa-me lá ver se tenho tempo para estas merdas…parece que não. Já NÃO!


Tanto mais, que ao descer na imensa profundidade do Ser, descubro que a criatividade e empenho, empreendorismo e dedicação não são compatíveis com nada disto. Na realidade, não fazem mesmo ideia de quem somos, do que temos como projectos, sonhos e metas. Mas urge, urge de facto, ilustrar o quanto os pássaros voam nos cérebros de muitos, em fantasiosas danças de criatividade, mostrando que somos capazes de realizar muitas coisas – mesmo que tenhamos de o fazer fora do país (para alguns, de novo).

Ó pra mim aqui, espreitando esta janela aberta ao mar das probabilidades. Afinal, parece que ainda sei escrever. Quem diria?!?

Mulher escrevendo, 1940
Almada Negreiros

Em termos pessoais, o embrutecimento sofrido no país por longo e penoso período de quase 9 meses (curiosamente o tempo de uma gestação humana) não provocou danos colaterais irreversíveis! Assim, cá estou de novo, pronta para o salto de fé.

O meu CV? Outra vez? Esqueçam lá isso.

Há males que vêm por bem!