O Coliseu

Não há, em toda a minha mera existência, visão que seja comparável. E pensar que tal foi conseguido há milhares de anos, numa época de limitada tecnologia, onde o conhecimento ainda era pontuado por diversas crenças que levavam os seres humanos a cometerem as atrocidades que tornaram a nossa espécie reconhecida pelos próprios.

A sua existência sobrepõe-se a qualquer outra numa ampla cidade que é Roma, ou, até, em toda a Europa, não se contentando em ostentar toda a adjetivação humanamente impossível, limita-se a ser. É. O. Coliseu.

É o monumento para assombrar todos os monumentos.

É a suprema ironia da criação.

Eu, humilde descritor de tal ânsia arquitetónica, pelas diversas vezes que a minha mente deambula por entre os rios da ignorância e da divagação, pergunto-me quantos pormenores, estórias e conhecimentos me falham, falharam e falharão, cometendo uma terrível injustiça perante aquele que outrora chegou a ser o centro social e político do Império Romano.

Não existe descrição mais apropriada para o Coliseu do que a lenda conter similar edifício em brumas da memória do que foi. Foi isso que, da janela do elétrico que me levou ao Coliseu, pelo primeira vez da minha ainda curta vida, desencadeou uma ação que eu pensava haver abandonado após a minha sociabilidade Católica: aproximei-me, com a admiração de uma criança que observa um prédio, pela primeira vez, e ajoelho-me. Frequentemente, é nos atos mais simples que reside a mais pura da admiração. E foi ali, prostrado sobre as altas colunas que o peso da história se abateu sobre mim. Foi ali que eu recordei as centenas de milhares (talvez milhões) de pessoas e animais, que morreram para puro gáudio das populações, revezando-se no princípio que se pensava extinto, até os estudos sociais demonstrarem o contrário: panem et circenses.

Fora ali que milhares de guerreiros conheceram a sua última morada.

Fora ali que se desvendaram segredos, tragédias, horrores, mas também alegria (ainda que, parte dela, apenas assegurada pela morte de terceiros milhares… Incontáveis).

Foi ali que se alcançou o mais próximo que um ser humano esteve do divino, ao tornar-se um Deus da Areia, do Fogo e do Sangue, encarnando o ditado “a história não é feita sem uma ponta de ironia”. Onde mais poderemos encontrar um local, tão magistralmente realizado, um hino à criação humana, cujo seu principal objeto é a chacina em massa?

Foi também ali que eu prestei a minha homenagem ao guerreiro caído, ajudado pela queda de flocos de neve.

Foi também ali que fiz a minha primeira promessa:

“Um dia voltarei”.