O Modus Operandi do Correio da Manhã

Portugal parou quando se soube do falecimento do filho de Judite de Sousa. Quer dizer, nem todo o Portugal parou. Eu, por exemplo, estava a praticar o jogging quando tive conhecimento desta triste notícia, e estive quase, quase, quase, quase, para parar de correr. Mas foi porque fui atacado pela famosa e absurda “dor de burro”. Mas fiz-me num homo sapiens dos rijos e continuei a correr como se a humanidade dependesse disso. E corri mais 5 minutos e parei, porque senti que se não o fizesse, um dos meus pulmões iria estoirar. E como é que a humanidade podia depender de um tipo cujo pulmão tinha estoirado a praticar jogging…? Era chato. Especialmente para limpar, porque deve ser coisa para sujar imenso.

Eu, honestamente, não fazia ideia de quem era o filho de Judite de Sousa. Aliás, eu não fazia ideia de que a Judite de Sousa tinha um filho. Mas, graças ao grandioso jornal Correio da Manhã, fiquei com a sensação de que, de facto, já conhecia o André Sousa Bessa desde pequenino. Através do Correio da Manhã, eu fiquei a saber quase tudo da vida do rapaz, o que acho extraordinário, visto que antes do trágico acidente que o vitimou, eu nem sabia que ele existia. Por isso, peço a todos os leitores que estão a ler esta crónica, que, durante um minuto inteiro, batam palmas em homenagem ao grande Correio da Manhã. Já está? Porreiro, então prossigamos.

De certa forma invejando a capacidade do Correio da Manhã em conseguir – constantemente, e de forma até algo impressionante – ir actualizando tudo o que se ia passando no dias que se seguiram ao trágico acidente com o filho de Judite de Sousa, tomei a liberdade de “pegar” numa das inúmeras notícias que o Correio da Manhã foi avançando, e elaborar um pequeno diálogo sobre como foi apresentada ao director do Correio da Manhã, Octávio Ribeiro, antes de ser publicada. Algo do género…

(Um jornalista bate à porta do gabinete do director…)

Director: Sim?

Jornalista: Sou eu, o Mendes. Posso, s´nhor director?!

Director: Podes. Mas tens de ser breve, porque tenho muito para fazer.

Jornalista: Com certeza, s´nhor director. Tudo como o s´nhor director quiser. Irei ser o mais breve possível. Tão breve, que quando der por isso, já nem estou cá. Não é por acaso que me chamam o Flash Gordon cá do sítio…

Director: Ó Mendes…

Jornalista: Diga, s´nhor director…?

Director: DESEMBUCHA LÁ COM ISSO! TU NÃO VÊS QUE EU TENHO MAIS QUE FAZER?

Jornalista: Com certeza s´nhor director. Vou ser muito breve, s´nhor director. É que trago notícias bastante relevantes sobre o caso do falecimento do filho da Judite de Sousa. Notícias que podem ser capa da edição de amanhã. Notícias bastante bombásticas, direi. Notícias que farão o Correio da Manhã, ser o jornal mais vendido nas bancas durante o dia de amanhã.

Director: Demoras muito…?

Jornalista: Demoro muito a fazer o quê, s´nhor director…?

Director: A ir buscar-me um café, queres ver…

Jornalista: Ah, mas com toda a certeza que irei, s´nhor director. É que é para já! Fazendo jus à minha alcunha, vou ser tão rápido que, enquanto o diabo esfrega um olho, eu já estarei aqui com o seu cafezinho…

(Nisto, o jornalista levanta-se da cadeira e desloca-se para a porta de saída do gabinete…)

Director: Ó minha besta, onde é que tu pensas que vais?

Jornalista: Então, vou buscar um café ao s´nhor director…

Director: Oh Deus me livre, homem… Sente-se aí quieto e desembuche mas é as notícias que tem sobre o caso do falecimento do filho da Judite de Sousa.

Jornalista: Mas já não quer o cafezinho?

Director: Não, porra!

Jornalista: Ok. Não me custava nada, mas o s´nhor director é que sabe… Bom, segundo as minha fontes, parece que o Ministério Público ordenou a abertura de um inquérito à morte do jovem. É, ou não é, uma notícia do camandro?!

Director: Não, nem por isso. Isso é uma notícia banal. Eu quero mais!

Jornalista: Mais, s´nhor director?! Como assim, mais?!

Director: Para uma notícia dessas ser capa da edição de amanhã, tem de se saber o porquê, de o Ministério Público abrir um inquérito…

Jornalista: Ah… Então… Mas… Ah, já sei! O Ministério Público suspeita de que o rapaz possa, eventualmente, ter sido assassinado.

Director: Hum… Está melhor, mas não sei se chega… Tens de me dar mais! Isso soa-me a pouco…

Jornalista: S´nhor director, eu… eu… não tenho mais nada… Mas, e se eu prometesse todos os dias tirar-lhe um cafezinho, o s´nhor director publicaria esta notícia amanhã…?

Director: Um café não custa nada a tirar. A máquina é automática…

Jornalista: E se eu lhe pagar o café?!

Director: Não esperaria menos de ti, Mendes…

Jornalista: Ah, então vai publicar a notícia…?

Director: Não. Não chega.

Jornalista: E se eu pagar-lhe todos os dias o pequeno-almoço?

Director: Não.

Jornalista: O almoço?

Director: Nem pensar!

Jornalista: Hum… A minha mulher, s´nhor director! Eu ofereço-lhe a minha esposa. Por favor, publique lá…

Director: Mas tu nem és casado, ó Mendes!

Jornalista: Ah, porra… Você agora apanhou-me… Então, e se for a minha irmã?! Tem 30 anos e está solteira… É uma loiraça de olhos verdes, que faz até o mais galã dos galãs tremer, assim que ela passa…

Director: Eish! Combinado! A notícia sairá na capa da edição de amanhã. Trata lá do encontro com a “mana top-model”…

Jornalista: Com certeza, s´nhor director! Vai ver que não vai se arrepender… (pensando) “Ai, estou tramado… Quando ele souber que eu sou filho único, até vai subir as paredes do gabinete… Mas que se lixe, ao menos posso afirmar que tive na capa do Correio da Manhã, uma notícia desbravada por mim…”

(Não digam a ninguém, mas eu bebi um café com uma folha de hortelã, logo pela manhã. Acho que isso explica suficientemente bem, o enorme amontoado de parvoíce que acabei de escrever…)

Até para a semana, malta catita…