O Senhor Outono – Laura Paiva

São as árvores que se despem, languidamente, ao sabor do vento, espalhando as suas folhas pelo chão formando um tapete que pinta de amarelo e castanho o meu caminho.
Também as há magnificamente trajadas nos seus vestidos de cores outonais, tão deslumbrantes que a Primavera teria inveja.
São os amores-perfeitos que não tardam a desabrochar.
São os vendedores ambulantes de castanhas assadas que espalham no ar o odor dos magustos de S. Martinho, que povoam as memórias da minha infância.
São os diospiros, as uvas e o vinho doce.
É a noite que aparece, abruptamente, mas sei que ainda é cedo, que ainda há muitas horas para disfrutar.
É a chuva que deixa o chão espelhado para duplicar a minha visão e que, quando se vai, deixa o azul do céu reconfortar-me e o Sol voltar a brilhar, com um sabor muito especial, conferindo formas e cores diferentes a tudo o que me rodeia.
É o Sol que, mais do que noutra estação do ano, me aquece o corpo e a alma.
São as camisolas fofas de lã, com golas altas.
São as botas e as pantufas.
É o édredon que me aconchega os sonhos.
É a lareira que, a crepitar, me atraí. A dança das suas chamas convida-me a olhá-las, hipnoticamente, até me render ao sono.
É aquela música tão especial que é capaz de me fazer querer dançar, cantar e partilha-la com o resto do Mundo.
É a voz amiga, do outro lado do telefone.
É o elogio sincero que me apanha de surpresa.
É a atmosfera do quase-Natal.



São as montras decoradas, as ruas e os edifícios engalanados, com decorações reluzentes e coloridas, para receber o Natal.
É a cadeira, de braços abertos, preparada para receber o Pai Natal, num qualquer espaço comercial ao qual os pais vão acorrer, em massa, para fazer as delícias dos seus rebentos.
É a compaixão e a entreajuda que, mais do que nunca, se fazem sentir – entre campanhas e eventos, sei que a época é propícia a que me apelem aos mais nobres sentimentos pelo próximo.
É o mendigo que, trazendo dentro do casaco um pequeno cão, me rouba um sorriso cheio de admiração.
É a pobre alma à qual ofereço um cigarro, em troca das parcas beatas que acabara de apanhar do chão, e que, surpreso e sem palavras, me agradece apenas com o olhar.
É o estar na longa fila da caixa do supermercado e encontrar alguém que, mesmo apressado, nos cede a vez por termos, apenas, um simples saco de pão para pagar.
É o dar, do pouco que tenho, tudo o que posso para ajudar alguém.
É o ceder o assento a quem dele mais necessita.
É o segurar a porta para outra pessoa entrar.
É o tentar fazer, todos os dias, algo que me faça sentir bem, viva e grata.

Algo se passa comigo. É algo bom mas não sei explicar do que se trata.
Dei comigo a adorar o Outono!

Crónica de Laura Paiva
O mundo por estes olhos