Porque venceu Barack Obama? – Francisco Duarte

Democracia é poder votar no candidato que se desgosta menos.

Robert Byrne

 

Admito que esta semana estava um pouco aflito acerca do que iria eu escrever para esta crónica. Tenho alguns temas em trabalho, mas nenhum ainda completo. Iria eu acabar um texto à pressa, ou iria replicar alguma velha glória? Felizmente para mim, deram-se dois eventos felizes: as eleições americanas, e o facto de eu ter tropeçado neste canal do YouTube.

E dei comigo a pensar na questão de como conseguiu Barack Obama ganhar as eleições de um modo tão evidente sem ter sido o candidato preferencial? Evidentemente que teve mais votos, mas o facto é que não foram assim tantos, e ele nem precisaria de ter tido a maioria para vencer. Porquê, pergunta você?

Por causa do peculiar sistema de eleição presidencial americano.

Ora, vejamos, os Estados Unidos da América estão divididos em 51 estados, todos eles com diferentes populações. O Colégio Eleitoral foi criado com a declarada intenção de conseguir dar igual valor aos Estados e é composto por 538 representantes que correspondem aos diferentes Estados e que oferecem os votos disponíveis ao candidato que conseguir a maioria dentro de cada estado. Veja-se que os votos do Estado não são fornecidos de acordo com a percentagem que votou em certo candidato, mas antes são todos entregues ao mais votado, num sistema conhecido como “o vencedor fica com tudo.”

Mas há mais: o valor destes votos não corresponde exactamente à população de cada Estado. Declaradamente para conseguir equidade entre os Estados, cada um tem, no mínimo, direito a 3 representantes, e mais uns quantos de acordo com a população, então. Para complicar a coisa, o número total de representantes é limitado, pelo que se subtraem uns quantos de alguns Estados, de modo a que todos se possam enquadra neste sistema.

Uma das coisas que podem ser algo evidentes nesta questão é que se somarmos o valor que cada Estado tem para a decisão final, acabamos por ver que o sistema tem algumas falhas por demais evidentes. Primeiro, dado que a escolha é feita de acordo com os votos fornecidos pelo Colégio, concluímos que certos Estados contam mais para a decisão final do que outros.

Há outra questão que se relaciona com os chamados “swing States”, os Estados indecisos, em que nenhum dos dois partidos tem maioria definida. São os Estados em que ora lideram os Republicanos ora lideram os Democratas. Alguns destes locais são especialmente importantes neste sistema de avaliação desigual dos votos, e os candidatos a presidente passam muito mais tempo a desenvolver campanhas aqui do que no resto do país, se é que vão ao resto do país numa dada campanha.

Só para se ter uma noção mais completa da questão, existe um exercício matemático muito interessante, que demonstra que se o candidato conseguir metade dos votos mais 1 nos Estados certos (lembre-se que quem vence a eleição num estado fica com os votos todos e não há distribuição equitativa), então esse candidato poderia tornar-se presidente tendo apenas 22% da população a votar nele. Isto faz com que muita gente declare o sistema como antidemocrático e considere a necessidade de o mesmo ser revisto.

Sistema bipartidário

Uma outra consideração interessante em relação ao sistema político americano é o bipartidarismo. Só existem dois partidos (ou pelo menos apenas dois que interessam). Porque é que isto acontece?

Porque em todos os sistemas em que a escolha do governante implique um método de “o vencedor fica com tudo” (como sucede em quase todos os governos chamados democráticos) a tendência é sempre para a bipartidarismo. Isto deve-se à tentativa do votante de fazer o seu voto contar. Pense assim, você até pode simpatizar com o Partido dos Verdes, mas sabe que votar neles pode significar que muito pouco vai mudar, pois não têm apoiantes suficientes para vencer as eleições. Portanto, se calhar, você vai olhar para os partidos dominantes do país em busca de alguém em quem colocar o voto. Olha para um lado, para o outro e, quem diria, dá de caras com o PS e o PSD. Existe mais algum partido de igual dimensão no país neste momento? Evidentemente que não, pois com o tempo as pessoas foram vendo que partidos reuniam mais apoiantes e forem cedendo esses votos aos grandes partidos até restarem apenas dois, como você está agora a fazer neste exercício (ok, se retiramos a teorização, há bem mais partidos em Portugal, mas os dois grandes reuniram um domínio da paisagem politica nacional). E você poderá nem gostar do PS, mas vai gostar um pouco menos do PSD, pelo que vai votar nos candidatos que odeia menos.

No fim, o PS até pode ganhar a eleição, mas será por 100%? Ou 80%, ou 50%? Provavelmente a figura real estará mais próximo dos 30% no final, e, bem vistas as coisas, isto não é governação da maioria. E você não votou em quem queria, apenas em quem odiava menos. Está a ser governado por uma das diversas minorias do país e sente que, no fim, a sua voz não vale assim tanto.

O que me leva ao meu ponto final desta semana.

O que poderemos nós fazer para sermos mais ouvidos? Como melhorar o que chamamos de democracia? Que outras formas de governação se podem implementar para que nos sintamos mais representados e em que a maioria possa ter uma voz activa?

Deixo isso ao seu critério e agradeceria qualquer comentário com respostas a estas questões. Muito obrigado.


 

Crónica de Francisco Duarte
O Antropólogo Curioso