Rui Tavares e António Costa no Congresso do LIVRE de 5 de Outubro de 2014

Tempo de Avançar ponto(e)s de partida…

No dia 31 de janeiro de 2015 reuniu-se no Fórum Lisboa a Convenção da candidatura cidadã Tempo de Avançar esta crónica visa analisar os pontos de partida com que esta apresenta nas suas linhas programáticas na área da Política Ambiental e das Energias Renováveis e se há ou não eventuais pontes (que poderão ser de partida para uma coligação pós eleitoral) entre este movimento e o Partido Socialista.

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O que é o Tempo de Avançar?

Em 5 de outubro de 2014 dá-se o I Congresso do LIVRE e neste discursaram para além de António Costa (então já SG eleito pelas primárias internas no PS), Ana Drago e Paulo Fidalgo, estes últimos a representar respetivamente o Fórum Manifesto e a Renovação Comunista os dois movimentos claramente dissensões do BE – mais recente – e do PCP – bem mais antiga– e foi neste I Congresso que se dá provavelmente a aproximação, o partido LIVRE, um jovem partido no cenário político português legalizado em 20 de março de 2014 e que tinha como principal figura promotora, Rui Tavares – deputado independente do Parlamento Europeu após sair do Bloco de Esquerda em 21 de junho de 2011 que num encontro de novembro de 2013 reuniu com cerca de 150 pessoas – mas que agrega antigos militantes do BE, PS e PCP bem como muitos libertários e independentes que nunca participaram em nenhum partido. O partido LIVRE, embora jovem, contou nas ultimas eleições europeias com 71.495 votos, feito notável se referirmos que o mesmo tinha de legalizado apenas dois meses e que teve cerca de metade do resultado do BE – partido de onde saiu o seu principal promotor – e mais cerca de 15 mil votos do PAN – partido pequeno mas já bem experiente nestas lides contando inclusive com eleitos regionais na Madeira e vários autarcas deputados municipais dos quais um em Lisboa e outro em Oeiras – e mais notável é, se virmos que em percentagem isto representou 2,2% do total dos votos e no círculo de Lisboa 3,6% dando acesso imediato a um deputado eleito para a Assembleia da República por este círculo.

Após este I Congresso do LIVRE dá-se em 17 de novembro de 2014 o anúncio da criação de um novo movimento e/ou candidatura cidadã que agrega para além dos movimentos já referidos, o MIC – Movimento Intervenção e Cidadania do Porto (antigos apoiantes de Manuel Alegre à Presidência da República e do candidato do PS à Câmara Municipal do Porto nas últimas autárquicas) e inúmeras personalidades como a atriz São José Lapa, a viúva de Saramago, Pilar del Rio, o advogado Ricardo Sá Fernandes, professores universitários como Boaventura Sousa Santos, André Freire ou Miguel Vale de Almeida – que chegou a ser deputado independente eleito pelas listas do PS – escritores como Luísa Costa Gomes, o músico Mário Laginha, o médico Júlio Machado Vaz e os jornalistas Alexandra Lucas Coelho e Jorge Wemans, muitos destes promotores do Manifesto 3D.

Assim e após este anuncio, no ultimo dia de janeiro, procedeu-se à eleição formal dos órgãos acolhendo o LIVRE como partido o “movimento que, como forma jurídica para ir a eleições se sustentará no LIVRE e sua inscrição como partido político no Tribunal Constitucional (TC), mas como forma cívica e política será um movimento de cidadãos num país em que a Lei não permite que movimentos não partidários se envolvam em eleições” tendo que os órgãos do partido, já existente juntar, através de deliberação, a designação escolhida na convenção cidadã – que confirmou a designação inicial de Tempo de Avançar – à sua designação oficial, junto do Tribunal Constitucional, de forma a que a mesma figure no futuro boletim de voto, além da “papoila” e da letra “L”.

Foto final do palco da convenção cidadã Tempo de Avançar realizada dia 31/01 no Fórum Lisboa com as suas principais figuras a cantarem a Grândola Vila Morena
Foto final do palco da convenção cidadã Tempo de Avançar realizada dia 31/01 no Fórum Lisboa com as suas principais figuras a cantarem a Grândola Vila Morena

Linhas programáticas na área de Política Ambiental e Energias Renováveis

As linhas programáticas que foram aprovadas por maioria esmagadora na convenção – e que podem ser encontradas AQUI – têm uma introdução com 5 pontos e 5 capítulos – divididos por entre 9 a 24 sub–pontos – a maioria das medidas ligadas à política ambiental e às energias renováveis estão no Capítulo 4 – que tem como tema Mais sustentabilidade para melhor desenvolvimento – mas nos pontos 4 e 5 da introdução é referido que devemos revalorizar a nossa economia, o conhecimento, o território e o ambiente e que precisamos de um desenvolvimento ecológica e socialmente sustentável.

Como se propõem atingir esse desiderato, é o que explicam mais à frente no Capítulo 4, começam logo no ponto 4.1 a enquadrar que: A ciência, a cultura e a ecologia são, simultaneamente, elementos definidores e condições essenciais no projeto de desenvolvimento que defendemos para o país. Uma sociedade desenvolvida promove a difusão do conhecimento científico, o acesso à cultura e a sustentabilidade ambiental como valores intrínsecos. Uma economia avançada exige uma aposta decisiva na investigação, na criatividade, na produção cultural, bem como em práticas ambientalmente sustentáveis e tecnologias limpas e renováveis. E indignam-se no ponto 4.4 com: A política de ambiente tem sido frequentemente considerada um obstáculo ao crescimento e subalternizada face à tutela de outros sectores da governação; em consequência,são evidentes os desmandos relativos à ocupação do espaço e à preservação da paisagem.

E propõem que – ponto 4.9os apoios públicos devem valorizar devidamente os projetos que visam o reforço do bem-estar coletivo, por exemplo, nos domínios do ambiente ou da saúde pública, promovendo-se a partilha de conhecimentos e recursos e a conciliação de esforços entre instituições e que – ponto 4.12uma política pública de conservação da natureza não serve apenas o propósito de salvaguarda do património natural, elemento caracterizador da identidade local, regional e nacional. Ao protegermos a existência e a saúde dos ecossistemas, dos processos ecológicos, dos ciclos naturais, da biodiversidade e da geodiversidade do nosso país, estamos também a assegurar a nossa saúde, a nossa qualidade de vida, a nossa economia, a sustentabilidade do nosso presente e a viabilidade do nosso futuro. Estamos além disso a promover um comportamento ético para com os animais, respeitando a sua dignidade e bem estar. É necessário prosseguir uma Estratégia Nacional para a Conservação da Natureza e da Biodiversidade que contemple a existência de planos de gestão devidamente financiados para todas as áreas protegidas, sítios da Rede Natura 2000 e Geoparques reconhecidos pela UNESCO. Desta gestão deverá resultar não apenas uma melhor conservação da natureza mas também o desenvolvimento de atividades económicas que valorizem os produtos locais e as paisagens com valor cénico e cultural. E defendem – ponto 4.13uma agricultura e uma produção florestal baseadas no uso sustentável da água e do solo, que permitam a preservação da diversidade biológica e das variantes locais, minimizando a utilização de agroquímicos e de energia por unidade produzida e recorrendo a práticas melhoradoras dos ecossistemas agrícolas. Tal orientação permitirá reduzir a dependência de importações, aumentar a cobertura do mercado doméstico e desenvolver a exportação com base em produtos saudáveis e de elevado valor acrescentado e – ponto 4.14que o investimento associado ao mar e a exploração dos recursos oceânicos possa prosseguir de forma eficiente e sustentável, defendemos o alargamento da rede de Áreas Marinhas Protegidas e a criação de um sistema de ordenamento das atividades marítimas que reforce os objetivos destas, identifique as regiões adequadas a cada tipo de atividade, adote a avaliação de impacto ambiental para o espaço marítimo e viabilize um sistema de licenciamento eficiente mas responsável.

Investigador Carlos Teixeira, membro do Partido LIVRE, faz apelo à participação na convenção cidadã Tempo de Avançar focando o seu apelo numa economia ecológica, assente na inovação.
O investigador Carlos Teixeira, membro do Partido LIVRE, faz apelo à participação na convenção cidadã Tempo de Avançar focando o seu apelo numa economia ecológica, assente na inovação.

São contra – ponto 4.15a privatização dos serviços de abastecimento e tratamento da água conduziu a situações de aumento dos preços praticados nalgumas localidades e à acumulação de défices e prejuízos avultados nalguns municípios e também defendem que os processos de privatização levados a cabo anteriormente sejam sujeitos a renegociação, assegurando novamente a gestão pública destes serviços na totalidade do território nacional e conduzindo à eliminação das assimetrias nas condições de acesso à água por parte dos cidadãos das diferentes regiões.

Advogam que – ponto 4.16os investimentos na qualidade ambiental urbana, para além dos efeitos positivos a longo prazo e do respeito pela solidariedade intergeracional que representam, oferecem também um retorno imediato na qualidade de vida dos cidadãos. Defendemos políticas fiscais e de regulação urbanística que tenham como objetivo a otimização e renovação do parque edificado existente, contrariando lógicas de expansão coexistentes com a degradação de áreas urbanas, bem como a promoção do transporte coletivo público e eficiente, dos modos complementares ditos “suaves” (nomeadamente a deslocação pedonal e em bicicleta) e a promoção da agricultura urbana. O desenvolvimento integrado do território nacional passa também pela aposta na consolidação das cidades médias, assegurando a qualidade dos serviços e equipamentos públicos e promovendo a relação territorial com os espaços rurais no sentido de dinamizar as economias locais. E que – ponto 4.17a política energética deve evoluir no sentido de uma maior autonomia e menor emissão de gases de efeito de estufa, contribuindo para o combate às alterações climáticas, apostando na redução do consumo energético e no aumento da eficiência energética, assim como na microgeração e produção de energia elétrica para autoconsumo através de fontes de energia renovável e de baixo impacto ambiental, reajustando os estímulos à produção de energia eólica, revendo os planos associados à energia hídrica e apostando no estímulo às indústrias da energia solar e das marés. Defendemos também a aplicação de medidas que permitam reduzir o défice tarifário e o impacto dos chamados custos de política energética, de sustentabilidade e de interesse económico geral, no orçamento das famílias e das empresas portuguesas.

Para finalizar propõem – ponto 4.19de modo a contrariar a tendência dos meios de comunicação social e, consequentemente, dos principais agentes políticos, para resumir o debate sobre o desenvolvimento português ao crescimento do PIB, defendemos a instituição oficial de uma bateria de indicadores de desenvolvimento sustentável que permita a monitorização permanente da evolução do país nas vertentes económica, social e ambiental, da qualidade de vida e do bem-estar da população.

Pontes de partida entre o anunciado e a Agenda para a Década do PS

aqui noutra crónica resumi de forma bem abrangente quais são as linhas programáticas de ação do PS e que estas se encontram resumidas na sua Agenda para a Década, deste modo não vos vou resumir as mesmas mas encontrar entre esta e os nove pontos já citados das linhas programáticas da candidatura cidadã Tempo de Avançar pontos de contacto e coincidência programática:
Entre o ponto 4.1 – e todos os pontos serão das linhas programáticas da candidatura cidadã Tempo de Avançar – e o Domínio de Ação Estratégico sobre a Energia – todos os Domínios de Ação e Ação-Chave referem-se à Agenda para a Década do PS – as coincidências são enormes ao ponto de ambas defenderem que uma das áreas prioritárias de desenvolvimento cientifico deve estar ligado às energias renováveis, e grande parte do ponto 4.17, também tem razoáveis semelhanças com as metas defendidas neste Domínio de Ação Estratégico sobre a Energia;
A comparação entre o ponto 4.9 e o segundo pilar da Agenda para a Década do PS, em que se defende que se deve modernizar a atividade económica e o estado e se assume na Ação-Chave #1 de promoção do investimento em projetos inovadores que os projetos a ser apoiados devem promover a sustentabilidade energética e ambiental dos transportes públicos e privados detalhando desta forma o que as linhas programáticas da candidatura cidadã Tempo de Avançar deixam na rama;
O ponto 4.13 tem grandes coincidências na sua forma de apresentação  com o Domínio de Ação: Espaços rurais e florestais a que se dedica toda a Ação-Chave #3 que refere que se deve fomentar uma gestão sustentável das florestas e entre outras medidas que se assume declaradamente que se deve potencializar e valorizar a multifuncionalidade dos espaços florestais, tanto para efeitos de lazer como em termos produtivos, deste modo o ponto 4.12, é podemos referir completamente enquadrável nessa Ação-Chave #3 e as semelhanças não se esgotam aí entre estes dois pontos e a Agenda para a Década, no Domínio de Ação: Coesão Territorial na Ação-Chave #4 o PS defende que se deve ter como o objetivo central o de favorecer uma utilização sustentável do território assumindo-se que a sustentabilidade do território deve estar no centro de qualquer política desenvolvida se reparar-mos tal defesa é enquadrável na proposta avançada no ponto 4.19 em que defendem, e cito: a instituição oficial de uma bateria de indicadores de desenvolvimento sustentável que permita a monitorização permanente da evolução do país nas vertentes económica, social e ambiental, da qualidade de vida e do bem-estar da população;
Em relação ao Mar as ideias referidas no ponto 4.14 têm grandes pontos de contacto com o Domínio de Ação: Mar no qual se defende em termos gerais que se deve promover o uso sustentável do mar e dos seus recursos, isto na Ação-Chave #1 da Agenda para a Década do PS;
O ponto 4.16 também tem algumas semelhanças, inclusivé na sua redação, com o que é defendido pelo Domínio de Ação da Coesão Territorial, a Ação-Chave #2 no qual se defende também a promoção de uma mobilidade urbana mais eficiente, sustentável e integrada e se aborda de forma transversal este tema nas suas múltiplas vertentes.

Rui Tavares e António Costa no Congresso do LIVRE de 5 de Outubro de 2014
Rui Tavares e António Costa no Congresso do LIVRE de 5 de Outubro de 2014

Como é que se explica que existam tais coincidências, que se fossem negociadas não seriam tão concertadas nem tão complementares, no meu ponto de vista é que os membros pertencentes à candidatura cidadã Tempo de Avançar têm bastantes mais coincidências ideológicas com os militantes do PS do que eles, e também nós, gostaríamos de admitir. Vejamos existe na candidatura cidadã Tempo de Avançar uma clara ala socialista democrática – Renovação Comunista e parte do Fórum Manifesto – uma razoável militância trabalhista – Renovação Comunista – e militantes que se filiam ideologicamente na área social-democrata nórdica – LIVRE, MIC Porto e antigos promotores do Manifesto 3D – com algum pendor libertário, radical – LIVRE, Fórum Manifesto e antigos promotores do Manifesto 3D – e ecológico – LIVRE. Se formos comparar estas áreas/alas/militâncias ideológicas com as que existem no PS, estas coincidem e a candidatura cidadã Tempo de Avançar só se salva felizmente de ter no seu seio as alas socialistas católicas, socialistas monárquicas e socialistas liberais e/ou de terceira via – que para grande pena minha e de outros camaradas existem no meu partido – e nós do PS de ter uma ala ideológica comunista e/ou marxista cientifica que existe no Tempo de Avançar.

Por esses motivos as coincidências programáticas são bem maiores do que há partida poderemos pensar e por isso é que eu acho que existem bem mais pontes de partida do que pontos de divergência.