Traí-te…mas a culpa foi tua – final

– Não posso ser a mulher que era há dez anos atrás, casamos, tivemos dois filhos, deixei de ter tempo para cuidar de mim, a casa, o trabalho…

– Não é apenas o desleixo contigo mesma, é o teu desleixo comigo, casaste comigo e agora desprezas-me, não tens tempo para mim, não tens paciência para mim…nem sequer olhas para mim.

– Tive um bebé há duas semanas, que queres que faça Pedro? Que deixe o bebé contigo e vá a correr como uma louca para o ginásio? Que vá para o cabeleireiro arranjar o cabelo e as unhas? Que vista um vestido sexy, calce um salto alto e me insinue a ti? Eu estou um caco Pedro, sinto-me gorda e flácida, estou deprimida, não durmo de noite por causa do bebé, tenho o Gaspar comigo o dia todo e está na fase das birras, quando temos cinco minutos para conversar, eu e tu, é sobre as contas para pagar, fraldas e papas para comprar, consultas dos pediatras…foda-se, já viste a quantidade de roupa que tenho na lavandaria para lavar e passar? Não aguento isto, estás a ser egoísta! Não tenho vontade de ir para a cama contigo, e depois? Estou exausta! Isso é motivo para te envolveres com outra pessoa?

– Mas ages como se eu tivesse culpa desse cansaço, desprezas-me a toda a hora, ages como se eu não estivesse aqui. Antes eras tão carinhosa, tão sexual, tão sensual, não prescindias da minha companhia, era como se não soubesses viver sem mim.

– Continuo a amar-te, mas as minhas prioridades mudaram. Temos dois filhos, lembras-te? Devias ter maturidade suficiente para entender isso.

– Um homem cansa-se.

– A mulher também se cansa, Pedro. A diferença é que as mulheres tem uma enorme capacidade de suportar tudo e de gerir a vida em prol dos outros.

– E a parte divertida acabou? Tu sabes que eu não queria o segundo filho, Maria. Há muito tempo que me sinto pressionado e contrariado.

– És tão estúpido Pedro. Se não és feliz podes ir embora! Foi por já “não ser divertido” que me puseste os cornos? Foi assim tão fácil? Se eu vestir umas meias de liga e te fizer sexo oral todos os dias já passa a ser divertido para ti? Vai-te foder!

Separamos-nos dois meses depois, ainda tentamos que desse certo depois da traição do Pedro, mas eu não consegui lidar com a perda de confiança na pessoa que amava. Não senti que fosse uma separação definitiva, foi um “até um dia destes”, até curar esta mágoa que  carrego comigo. Numa das muitas conversas que tivemos, ele contou-me que foi um caso que durou pouco mais de quatro meses, foi meramente sexual, colega de trabalho, insinuou-se a ele, ele não resistiu, estava carente, pensou em contar-me, mas depois do nascimento do bebé não teve coragem, ela era solteira, bonita, com um bom corpo, gostava muito de sexo, especialmente sexo anal, e encontravam-se sempre nos dias da semana, em casa dela, sempre usaram preservativo…no dia em que nasceu o nosso filho ele pôs um ponto final no caso, sentimento de culpa, justificou ele.

Decidimos reatar o casamento algum tempo depois, mudamos de casa, alguma mobilia também, gozamos umas ferias juntos, eu tornei-me uma mulher  mais interessante, cuidava mais de mim, sorria mais e dedicava-me mais ao meu marido, ele numa tentativa de se redimir do sofrimento que me causou, fazia de tudo para me ver feliz. Estávamos felizes os dois, o pesadelo fazia parte do passado, finalmente tinha perdoado o Pedro.

Setembro, um dia de sol, eu estava de folga, estava em casa sentada no sofá, a ler o livro ” A Alma Está no Cérebro”, os miúdos estavam na escola, o Pedro a trabalhar, tocam à campainha, vou abrir, na porta estava uma mulher morena, trinta e tal anos, a seu lado um miúdo que não teria mais de cinco anos, olhos claros, também moreno.

– Posso ajudar? Perguntei.

– É a mulher do Pedro?

– Para que é que quer saber?

–  Este é o filho dele, o Bruno.

” No homem, uma infidelidade casual é uma coisa insignificante…quase o mesmo que ir a um cinema.”

Flavio Gikovate