O Idiota da Aldeia – Hora do Chá Gelado

Era um dia de calor. Entrei no café mais próximo que encontrei e dirigi-me ao balcão. Quando o servil finalmente notou a estranha presença de um cliente no estabelecimento onde trabalha, perguntou-me o que iria eu consumir. “Queria um Ice Tea de limão, se faz favor”, disse-lhe eu. Claro que imediatamente fui vítima daquela original e elaborada piada: “Queria ou quer?!”. Sim, também tive essa mesma reacção, leitor. O que me apeteceu naquele momento foi tirar o meu taser do bolso e castigar aquele servil com 50.000 volts de pura raiva. Infelizmente, tinha-o deixado a carregar em casa porque estava sem bateria. É que tinha estado a utilizá-lo, toda a noite, numa pessoa que proferiu a pseudopalavra “mortandela”. Assim sendo, optei apenas por fazer um sorriso forçado para que ele se despachasse a servir-me.

Pouco tempo depois, o servil trouxe o chá gelado que eu tão ansiosamente aguardava. O problema é que não era um Ice Tea, mas sim um Nestea. Ora porque é que, quando eu peço especificamente um Ice Tea, muitas vezes estas bestas que trabalham em restauração me trazem um Nestea ou, ainda pior, um Frutea? Por algum motivo eu pedi essa marca e não nenhuma das outras. É porque é precisamente essa que me agrada e que quero consumir. Sim, leitor, eu sei que são todas marcas de chá gelado e que são bastante parecidas. São parecidas, mas não são exactamente a mesma coisa. Imagine que o leitor pedia a um cirurgião para lhe operar o rim esquerdo e, em vez disso, ele operava-lhe o rim direito. São os dois rins e bastante parecidos, mas não são exactamente a mesma coisa, pois não? Percebe agora o que eu sinto sempre que isto me acontece.

Mas o que mais me irrita é o desplante com que me fazem isto. Estes tipo de empregados não dizem que não têm Ice Tea – que seria o comportamento normal – não tentam disfarçar nem sequer fazem o esforço para me distrair de alguma forma. Não. Eles simplesmente optam por colocar à minha frente um produto que eu não pedi sem dar qualquer tipo de justificação. Tentam vender-me gato por lebre, sem sequer fazerem o mínimo esforço para me convencer ou simplesmente aldrabar e, depois, esperam que eu ingira a bebida que eles seleccionaram para mim sem o mínimo protesto. Eu gostava de saber como é que estas bestas iriam reagir se, quando fossem comprar um BMW Série 5 azul, alguém lhes entregasse um Skoda Octavia da mesma cor. Será que aceitavam a marca de automóvel que o vendedor escolheu para eles e pagavam o mesmo valor?

Apesar da solução ideal para este problema ser raptar o empregado, levá-lo para um armazém e forçá-lo a ingerir apenas Ice Tea, Nestea, Frutea e urina gelada até que ele conseguisse distingui-los a todos pela diferença de sabor – para o fazer compreender a minha posição – esta solução levanta alguns problemas logísticos, pois os armazéns estão cada vez mais caros e a urina ainda demora a arrefecer. Por isso, desenvolvi uma outra solução mais prática. Agora, sempre que peço um Ice Tea e o servil me traz uma outra marca de chá gelado, eu não digo nada e bebo-a calmamente até ao fim. Depois, pergunto-lhe quanto é. Se ele me responder “é um e meio”, eu pago a bebida em Kwanzas. Afinal de contas, são todas moedas. E depois castigo-o com o taser.

Crónica de Amílcar Monteiro
O Idiota da Aldeia