“…A crise unifica a UE” – Nuno Araújo

O mundo está em mudança. A Crise que vemos todos os dias nos noticiários televisivos está já a unificar a União Europeia (UE), e vamos perceber que a crise servirá, essencialmente, para unificar a UE em termos políticos, económicos e monetários.

Um governo para a UE, uma política económica comum para a UE e uma moeda (o Euro) que sairá mais forte desta crise. São estes os objectivos a atingir pela UE, finda a crise que atravessamos.

A mudança virá com o fim da crise para a UE, mas isso acarretará problemas para os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) que têm crescido desde o início da chamada globalização, e do surgimento das classes médias nesses mesmos países. A mudança virá finda esta crise, tal como veio com o fim de todas as outras no passado, mas esta é a crise que todos os dias desfaz sonhos de jovens no desemprego, pessoas com vidas estruturadas que se vêem desempregadas, outras com emprego mas com sacrifícios muitos, reformados com uma velhice atribulada por causa de filhos e netos. É a crise mais grave do período pós-segunda Guerra Mundial, sem dúvida alguma. Porém, nesta crónica, enumero diversas razões, explico, recorro a exemplos actuais, e desafio o pensamento divergente de cada pessoa que ler este texto (ao que desafio a comentar o que pensa do mesmo) para essa mudança que está a caminho.

Havendo palavra-chave que defina a solução desta crise, terá sempre de passar por Coesão. Em boa verdade, esta crise financeira de dívida soberana da zona euro (a mais grave desde 1945), fez com que a UE desse em alguns meses mais passos em torno da integração europeia, do que tinha feito em vários anos.

Joga-se muito com esta crise do Euro. Joga-se, no fundamental, o futuro da moeda única. Sendo uma moeda muito cara para negócios, mas muito segura para acumular capital, o Euro tem aqui um grande desafio: ou prossegue com os actuais desassete membros da eurozona, ou então vai perder, necessariamente, a Grécia, mais por pressão externa, do que por vontade do povo grego, que não
quer voltar a usar o “Dracma”, anterior divisa helénica.

A globalização oferece, aqui, mais um episódio da sua dinâmica: os problemas das menores economias europeias afectam as maiores economias europeias. Como tal, seis bancos alemães viram “downgrades” serem-lhes aplicados, e o mesmo se aplica aos três maiores bancos austríacos. Interessante é que a Alemanha apresenta o maior crescimento de PIB da UE e a Aústria, não obstante a crise de dívida que também enfrenta, detêm a menor taxa de desemprego da UE. Logo com isto, verificamos que os problemas bancários são bem reais, no que diz respeito à falta de liquidez, de obtenção de empréstimos, de capacidade de recapitalização; e a situação da dívida dos Estados soberanos não tem relação forçosa com o estado da banca dos seus países. Espanha é um bom exemplo: a banca espanhola está “nas ruas da amargura”, mas o Estado espanhol até conseguiu baixar o desemprego, no último balanço estatístico de que se tem conhecimento.

A crise das dívidas soberanas ensina, portanto, uma premissa por demais importante: há que separar dívidas soberanas e bancos, pois a crise de um leva a que o outro entre em crise, mais dia, menos dia. Se há falta de liquidez dos bancos, os Estados não conseguem financiar a economia; se os Estados não têm liquidez, os bancos ficam credores, mas sem “matéria-prima” (aquilo que tão bem sabem os bancos fazer: vender dinheiro).

A especulação em torno das dívidas soberanas dos países é, agora, uma evidente realidade: se os países conseguem crescer economicamente, mas os seus bancos agentes financiadores da economia, estão débeis, isso não significa de maneira nenhuma que os Estados poderão entrar em incumprimento. Daí que as políticas da UE tenham de mudar 180 graus, e em muito pouco tempo. Dizia o milionário George Soros que a UE tinha três meses para salvar o Euro. Talvez ele tenha razão, talvez ele tenha dado um sério aviso a Merkel e Hollande.

1. Espanha

Como se tem dito, o pedido de ajuda financeira externa feito por Espanha, no valor de 100 mil milhões de euros, é para ser directamente aplicado no sector bancário espanhol, que denotava já evidentes fragilidades. O que também acho interessante é Mariano Rajoy, primeiro-ministro espanhol, ter pensado que pode pedir dinheiro sem que a receita da austeridade seja aplicada, ou
como uma pizza que se pede mas sem ter a base de tomate, tal como se escreveu na imprensa internacional na semana passada. De qualquer das maneiras, o Eurogrupo anunciou que a ajuda externa a Espanha será canalizada “através do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF)/Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE)”, o que já mostra ser um apoio financeiro diferente daquele aplicado na Grécia, Irlanda e Portugal.

2. Grécia (outra vez?!)

Dia 18 de Junho, prepare-se: depois da vitória do Syriza, se por acaso tem depósitos ou aplicações financeiras em bancos expostos à dívida grega, vá levantar todo o seu dinheiro. É que na Grécia, já se prepara essa “corrida” aos bancos.

Não se assuste: o problema é que o 5º maior banco grego, o Agrícola, vai falir e não vai ser “resgatado”. Fontes da Comissão Europeia (CE) já admitiram que será mesmo melhor deixar esse pequeno banco (e outros mais, já agora) ir à falência. A crise sistémica, portanto, já está confirmada: se por um lado temos corrida aos depósitos, por outro temos a própria CE a deixar um banco ir à falência.

Juntemos mais pólvora: foi aprovado um empréstimo aos quatro maiores bancos gregos (que deixou de fora o Agricola), como tal o Banco Nacional, o maior credor, recebeu 7400 milhões de euros; o Banco Piraeus 4700 milhões de euros; o Eurobank, 3900 milhões  de euros; e o Alpha, 1900 milhões de euros. Se em Portugal as necessidades de financiar o Millenium BCP com 3500 milhões de euros,   CGD com 1700 milhões, esse “pequeno” banco grego precisa de 3000 milhões de euros, imediatamente.

Também devo confessar achar engraçado (sem graça nenhuma) que fontes bancárias chegaram a dar como certo que o novo FEEF (aquele fundo europeu que não servirá de grande coisa…) é que iria emprestar dinheiro a esse banco moribundo…é assim que se desmantela, a pouco e pouco, a economia helénica.

3. …e ainda o Chipre!

O Popular bank, segundo maior banco do Chipre, que está fortemente exposto à dívida grega, necessita de se recapitalizar. Agora só o conseguirá, de acordo com o presidente do banco central cipriota, Demetriades, com a ajuda da União Europeia, pois antes já beneficiou de um empréstimo da Rússia, no valor de 1500 milhões de euros. Os números, agora são outros: são necessários de 1,8 mil milhões de euros para injectar no Popular Bank até dia 30 de Junho, se não lá chamam os “homens de negro” (nome dado pelo governo espanhol ao FMI). O dinheiro dos milionários gregos está bem seguro, e não há risco de colapso do sistema bancário cipriota, até porque como o pequeno país, que vai assumir a liderança da UE a 1 de Julho (mas não será reconhecida pela Turquia, ide pesquisar no Google porquê), perdoou 76% da dívida grega, ainda pôde registar lucros de quase 60 milhões de euros.

4. Os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul – South Africa)

China

O Banco Popular da China desceu a sua taxa de juro, em 0,25%, pela primeira vez desde 2008, situando-se agora em 6,56% para 6,31% para empréstimos, e em 3,5% para 3,25% dos depósitos. Esta medida, que contempla ainda um desconto agora de 20% (antes era de 10%) que os bancos ofereciam sobre a taxa de referência, visa que o sector bancário chinês atinja o número de empréstimos que está obrigado a cumprir, algo que já não falha há sete anos. Há menos concessão de empréstimo na China, e este pode ser o prenúncio de que a verdadeira crise financeira global está a chegar (simultâneamente com o fim da crise do euro): em 2015, segundo alguns especialistas.

No final deste ano, deverá ocorrer a mudança de líder na China. A substituição de Hu Jintao, actual presidente, por Xi Jinping, para liderar a República Popular da China, país mais populoso do mundo, está prevista para o próximo mês de outubro, e deve decorrer com a maior das normalidades.

Xi Jinping, futuro líder chinês, e cujo pai era muito próximo de Mao-Tse Tung, é um engenheiro químico de 59 anos, visto como um liberal e com personalidade carismática e figura física imponente. Vejamos se é este senhor que terá a tarefa de enfrentar a crise, mas desta vez do lado da China enquanto “aflita”.

Índia

Está destinada a enfrentar peíodo de menor crescimento da sua economia, por dois motivos:

1) O Estado Indiano pede muito dinheiro emprestado, mantém inflacção alta e premite “crowding out” (queda de investimentos privados). Por falta de consensos políticos, há já alguns anos que não se verifica nenhuma reforma estrutural de fundo na Índia, numa máquina estatal ainda por modernizar.
2) Os dois grandes partidos, o Congresso Nacional Indiano e o opositor Bharatiya Janata Party (BJP), estão a perder o apoio para os pequenos partidos regionais. Talvez por serem pouco sérios quanto às suas decisões, até porque quando o governo decide aumentar o preço dos combustíveis, os protestos populares fazem-no voltar atrás na decisão.

Rússia

A economia russa mostra sinais de falta de vigor e dinamismo económico. Em primeiro lugar, saibamos que o rublo (divida russa) tem desvalorizado. O preço do petróleo caiu 15%, isto só durante o mês de Maio. A inflação está no valor mais baixo de sempre: 6%.

Para combater este estado de coisas, o governo russo decidiu empreender uma vaga de privatizações. A venda do banco VTB, da empresa aérea Aeroflot, do grande estaleiro Sovkomflot (construtor de grandes navios petroleiros), da empresa ferroviária RZD, e da super empresa petroleira Rosneft ( a maior do setor na Rússia) fazem crer que o Estado russo já começa a sentir repercussões da crise internacional, tal como os seus parceiros no grupo BRICS. A venda de todas estas empresas estatais russas ascenderá a 10 biliões de dólares, e é para ser efectuada ainda este ano.

A BP (British Petroleum) também se prepara para vender a participação que detém na petrolífera russa TNK-BP, petrolífera do Cáucaso. Prevê ganhos na ordem dos 30 biliões de dólares, o mesmo valor apontado por alguns especialistas económicos.

Conclusão

Após ter lido toda esta crónica, faço apelo a que enumere:
– o desaceleramento das economias dos BRICS,
– as mudanças fortes de tendências políticas em países da UE,
– o facto de os países da UE serem os primeiros a racionalizar as suas economias, antes de os BRICS o fazerem.
Esta conjugação de eventos leva a que eu considere que a UE tem pela frente, se conseguir prosseguir com o seu plano (“a meias” com os Estados Unidos da América), anos de sólido crescimento macroeconómico, logo, o aspecto microeconómico (o das famílias) será bastante risonho para aqueles que vivem em solo de UE.

Crónica de Nuno Araújo
Da Ocidental Praia Lusitana