A hipocrisia dos sindicatos – Rafael Coelho

Os sindicatos – leia-se também as confederações – têm como missão o zelo e defesa pelos direitos dos trabalhadores. Os nossos, em Portugal, na sua generalidade, sempre se têm mostrado muito ativos, dependendo também das cores que se encontram no poder.

Recordo que foi num governo de direita – de Cavaco Silva – que nasceu a chamada “Concertação Social” em Portugal e muitas das prestações sociais existentes, nasceram por esses meados dos anos 80, como por exemplo o 13.º mês para os reformados. Recordo-me que a minha mãe adoeceu em 1981 e a partir dessa altura começou a efetuar constantemente deslocações de mais de 200 km para consultas e exames, cujo transporte era comparticipado pelo SNS, mas cujo pagamento demorava uma infinidade temporal. Recordo-me que, em vésperas de eleições, nomeadamente nos governos do Bloco Central, sendo Primeiro-Ministro Mário Soares, eram acelerados os envios dos respetivos vales de pagamento dessas prestações aos utentes. Para muitos, a memória é muito curta, mas a minha, felizmente, continua intacta.

Os tempos áureos a partir de meados dos anos oitenta e anos noventa, proporcionaram talvez excessivos direitos e benefícios a cidadãos que não necessitavam deles, em detrimento dos mais pobres, cujas reformas continuam hoje sendo miseráveis, quando temos conhecimento, em contraditório das reformas de políticos, de ex-políticos e alguns senhores para os quais o sol sempre brilhou e que, como diz o povo, nasceram com o “c…” virado para a lua.

No tempo do anterior governo, não se viu grandes manifestações por parte dos sindicatos como as que existem agora, no tempo das “vacas gordas”, que afinal não passavam de puras ilusões óticas, porque as vacas estavam de facto a ficar cadavéricas, sem leite nem chicha para alimentar o papão que é o buraco permanente no nosso Estado. Vêm-se agora esses sindicatos a par com o eventualmente necessário recuo em direitos, em regras e em níveis salariais de alguns senhores e não concordam, obviamente. Estão no seu direito de protesto e de defesa daqueles seus associados que lhes continuam a prestar soldo e, por arrasto, também todos os outros. Só é triste que no nosso país os dirigentes sindicais não passem de mais líderes políticos que exercem quase tão bem ou até mesmo melhor do que os líderes partidários existentes na oposição.

Consta que muitos dirigentes sindicais ganham também eles chorudos ordenados. Consta também que muitos deles nunca exerceram a sua profissão, entrando em tenra idade para os quadros de sindicatos ou partidos e que não sabem o que é trabalhar, para além do protesto, reivindicação e negociação. Consta ainda que os sindicatos, como muitas das empresas e muito do Estado também, são um aglomerado de amigos, conhecidos, familiares, conhecidos de amigos e amigos de familiares e por isso, também só lá entra quem eles muito bem entendem.

De qualquer forma e apesar de tudo, até aqui, tudo bem.

Escandaloso é quando os próprios sindicatos praticam algo contra o qual eles próprios permanentemente se debatem: ordenados em atraso; horas suplementares (não pagas); ordenados baixos; propostas de rescisão humilhantes para os seus trabalhadores. De tudo isto e sem mencionar nomes obviamente, eu tenho conhecimento pessoal, através de pessoas das minhas relações.

Acontece, por exemplo, com formadores – que trabalhando a recibo verde – têm que esperar 3 ou 4 meses para receberem o justo valor dos seus honorários. Estou a falar de trabalhadores de sindicatos à beira da reforma (faltando 2 ou 3 anos) aos quais oferecem propostas de rescisão escandalosas e por aí adiante.

Como dizia São Paulo, “Não faças aos outros o que não gostarias que te fizessem a ti”. Passados dois mil anos, totalmente atual!

 

Crónica de Rafael Coelho
A voz ao Centro