A Minha Primeira Vez – Aida Fernandes

Para quem leu a minha crónica da passada semana, até poderia parecer que vou falar na virgindade, mas sendo a minha rubrica das crónicas a “Ultima Etapa” só o poderia fazer se já estivesse nessa mesma Etapa, o que não… de todo! Prometo que quando lá chegar, se ainda escrever crónicas, falarei sobre isso na minha pessoa!

Assim falarei então na primeira vez que entrei num Lar de idosos…Lar (casa de idosos com problemas crónicos de saúde), uma resposta social ou Lar (casa de velhos) onde tudo é deprimente, onde o cheiro incomoda, onde todos nos parecem tolinhos, chatos, surdos, irritantes e tantas outras coisas de que os velhinhos são intitulados?

Pois bem, sei que o conceito é esse e na verdade a primeira impressão que fica é mesmo essa, uma visão de um ambiente físico com velhos deprimentes, tristes e revoltados por lhe terem tirado o seu próprio lar, a sua casa onde gostariam de envelhecer.

Há momentos pela vida fora que nos marcam, mas uma entrevista para um emprego num Lar é algo que não conseguimos descrever por palavras, pelo misto de sensações e medo que nos causa.

Eu pensei nesse dia…meu Deus…isto é mesmo triste! Eu que até tenho “jeito” para velhinhos (pela experiência que tive com os avós), será que me vou adaptar a isto!

Olhei ao meu redor enquanto esperava e só via cadeiras de rodas, numa delas estava um idoso que me chamou atenção, acho que houve uma empatia de imediato pela cara de felicidade que tinha comparada com muitas que ali estavam, mas de repente ele começa…pêras, pêras, pêras…cintos, cintos, cintos… reinucos, reinucos, reinucos…sapatos, sapatos, sapatos…isto sucessivamente e num tom alto, tão alto que ecoava e entrava nos meus ouvidos sem querer sair. Pensei, isto é de loucos! O senhor não se cala, é preciso ter paciência! Olho para o lado e vejo uma senhora muito pequena, não me parecia muito idosa! Falava sozinha, perguntava e respondia, espectáculo digo eu! Não dizia nada com sentido e a palavra que mais se ouvia era…combinações, combinações! Imaginem a minha cara, já não eram só os cintos os sapatos agora também combinações! A cada momento tudo me parecia cada vez mais difícil ter que lidar com isto diariamente, comecei a sentir algum desconforto confesso, provocado por aquele cenário tão diferente e com uma visão diferente da que tinha dos meus avós.

Passados alguns anos, escrevo com muito orgulho que a opinião de um Lar não é a que fica da primeira impressão…jamais! Um Lar é algo que se aprende a gostar, a conquistar diariamente, porque para as pessoas que lá vivem (idosos) esta é a sua própria casa, casa que não escolheram (pelo menos a maior parte) para passar os seus dias até ao final da sua vida.

Também eles de uma forma mais violenta tiveram um dia que encarar esta primeira vez, sabem eles como! Já alguém imaginou este dia na sua vida, se acontecer claro! O dia em que deixamos o nosso ambiente físico, o nosso espaço, os nossos objetos, a nossa comodidade, a nossa família, os nossos vizinhos…a nossa história até então!

Haverá muito para falar sobre isto nas próximas crónicas!

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Crónica de Aida Fernandes
A última Etapa