(A) Normalidades

                Tenho alguns amigos que me dizem… És esquisita… Não és normal. Mas o que é ser-se esquisito? O que significa não ser normal? Ando na rua sem que alguém fique pasmado a olhar para mim, portanto sou suficientemente vulgar. Porém, a minha anormalidade está mesmo nos meus hábitos e comportamentos estranhos. Porque falarei hoje de hábitos invulgares? Porque sei que existem por aí pessoas com hábitos muito esquisitos. Amigos…não estão sozinhos!

                Se é pra ser anormal que se comece de pequenino.  A primeira anormalidade da qual tenho memória foi o dia em que me caiu o primeiro dente. Estava eu tranquilamente a comer uma maçã, quando…o dente fica preso na maçã depois de uma bela trinca…Estive cerca de uma hora a chorar desesperadamente a dizer que ia morrer! Sim, na altura notei que os meus colegas de escola eram desdentados mas achei que eram simplesmente crianças feias.

                Muitas das minhas esquisitices estão relacionadas com comida. Por exemplo, comer Kiwi com casca. Incomoda-me? Só ao terceiro kiwi…aí confesso que o céu-da-boca já se queixa. Sempre ouvi dizer que a casca está na vitamina. Ora se a casca está na vitamina, só faltava agora eu dizer que também como cascas de melancia, melão, citrinos e banana, por exemplo? Bom…parcialmente correto. Melancia e melão, comia quando era mais pequena (hoje em dia controlo-me para evitar represálias), citrinos não porque é muito amargo e banana também não porque sabe mal.

                Adoro azeitonas… mesmo! Para mim, azeitona vai bem com qualquer prato. Gosto tanto de azeitonas que até engulo o caroço. Não sei se deva incluir o caroço de azeitona como coisa parva porque me dá imenso jeito na hora de não pagar couvert. Papo umas quantas, não há caroço, não há provas, não pago o couvert… Crime perfeito! No fim, ainda me deleito com um “Epá, que gustosas!” (caro leitor, não é erro ortográfico…dizer gostoso com um puríssimo sotaque português tem muito mais piada, diga em voz alta comigo: “gustoso!”). Ultimamente porém, estou mais normal, não sei o que se passa. Até comecei a comprar azeitona sem caroço por causa da úlcera e da gastrite.

                Outra das coisas que adoro é fruta, sou completamente fruto-dependente…desde pequena, aliás… eu era o sonho de qualquer mãe. Fruta, vegetais, sopa e legumes era comigo! Acho que os meus pais perceberam o quanto eu gostava de fruta em 1982, tinha eu 4 anos. Íamos a caminho de Lagos, onde passei os meus verões durante dez anos. Na altura ir para o Algarve era um tormento de várias horas, quer porque íamos nas estradas nacionais, mas também pelos modelitos de carros que existiam na altura em que velocidade era sinónimo de “Ai que o carro se vai desintegrar”.

                Recordo-me de fazer esses trajetos ou a dormir, ou a perguntar “já chegámos? Falta muito?”. No caminho, tínhamos sempre paragens obrigatórias, uma numa tasca, onde eu comprava umas gomas rançosas em forma de cabeça de gato, e outra paragem nas barracas de fruta que havia na estrada. Foi numa dessas barraquinhas que parámos para comprar 2 quilos de nêsperas…nham…onde ficaram as nêsperas? Correto. No banco de trás ao lado da pequenina Sofia. Escusado será dizer que as nêsperas nem tiveram tempo de amadurecer. Comi tudo e acabámos a fazer uma paragem extra porque a pequenina Sofia se tinha vomitado literalmente até às cuecas! Felizmente foi a única ocasião até hoje em que tive de mudar de roupa no meio da rua.

                Eu quando gosto de algo, gosto mesmo muito. Marisco, ui, o que eu gosto de marisco! Com 25 anos, já teria idade para ter juízo…errado, nunca! Como quando gosto de algo sou mesmo fanática, decidi aproveitar ao máximo o quilo e meio de camarão que a minha mãe tinha comprado numa viagem que fez. Resumindo, estive aproximadamente 3 dias a alimentar-me apenas de camarão, ou “gâmbias” como gosto de chamar a esses “gustosos”. No 2º dia, quando estava no meu trabalho de BackOffice, comecei a sentir uma ligeira coceira na pele, uns altos estranhos. Pensei…será do camarão? Vou tirar teimas…tungas, mais 1 dia de “gâmbias” para confirmar a minha teoria. Eureka! Estava certa, era mesmo uma intoxicação! Comi tanto bicho que me envenenei. Acabei nas urgências a levar injeções de cortisona e anti-histamínico. No dia seguinte… Se sorrisse, os olhos fechavam! Imaginam uma mutação de humano com peixe balão? Era a minha tromba chapada!

                Como gaja que sou, adoro inventar com o cabelo. Na realidade, quando olho para ele, pasmo-me por ver que ele ainda não me abandonou. Usei cabelo comprido até aos 18 anos. Sendo eu oito ou oitenta, decidi deixar o cabelo comprido e passar a cabelo curto, tipo rapaz. Como a cor do meu cabelo é assim um loiro acinzentado (tipo cor de cocó de quem precisa de ir ao médico), parecia que a minha cara não terminava, ou que era mesmo careca. Decidi então aderir ao que chamo de inteligência artificial…pintar o cabelo de preto! Nada contra as loiras, pelo contrário, eu adoro-me!

                Como queria poupar uns trocos e achei que não deveria ter muita ciência, decidi comprar a tinta e pintá-lo na comodidade da minha casa de banho. Sem noção da aderência de uma tinta à pele, e tendo eu pele tipo elefante que agarra tudo, fiquei com a testa e orelhas completamente negras. Descobri, da pior forma, que lixivia, acetona, detergente e álcool não retiram a tinta da pele, mas fazem uma ferida e crosta horríveis! Graças a ter chumbado de ano mais tarde e ter ido de castigo trabalhar (de graça) para um cabeleireiro, descobri que cinza era uma excelente forma de retirar tinta. Tivesse eu chumbado um ano antes e não saberia que líquidos não removem tinta, sempre a aprender!

                Para mim, a invenção e experimentação não tem limites. Não me canso de inventar, sou uma exploradora e adoro experimentar coisas novas. Um dia descobri a máquina de cortar cabelo, estava ali na gaveta, mesmo a jeito. O resultado? Como o cabelo já era curto (mas felizmente preto), andei aproximadamente um mês a retocar as minhas peladas com rímel à prova de água. Pfff, se fosse loiro ia ser muito mais complicado para disfarçar.

                Não bebo muito frequentemente, socialmente apenas, e de vez em quando. Não há muitos anos, tínhamos combinado uma saída, coisa que para mim é raríssimo fazer, nunca gostei muito de sair à noite, é muita gente, muito encontrão, não gosto… Começámos com uma bela janta lá por casa e fomos fazer aquecimento para o Singstar, ou RockBand…já não me recordo, julgo que, de alguma forma recalquei aquela noite. Ora, como estava a cantar que nem uma Montserrat Caballé (a nível de entusiasmo, não de capacidade vocal), precisava hidratar-me com licor beirão. Como é natural do corpo humano, tive a dada altura de fazer xixi…nunca mais regressei! Amigos de um raio que tardaram a dar pela minha falta. Dizem, a más-línguas, que estava a dormir abraçada à sanita… E agora que relembro este episódio… Acho que já percebi porque não bebo com frequência…Porque os meus amigos são uns negligentes!

                 Bom, já chega de humilhação (para o leitor, eu tenho a minha consciência tranquila). Mas não pense que eu sou só esquisitices… eu também tenho atributos e qualidades. Toco flauta com o nariz, sei mexer as orelhas (coisa de família, a minha mamã ensinou-me) e arroto quando me apetece (o que me dá imenso jeito quando estou com azia).

                Acham que sou esquisita? Para mim ser-se esquisito é não se ser verdadeiro. É viver e agir sempre como se estivéssemos a ser avaliados ou filmados para um casting do 007. É viver com máscara, com vergonha de mostrarmos quem somos. Adoro as minhas (a) normalidades, os meus hábitos estranhos e os meus amigos aceitam-me como sou (a família também mas eles não têm alternativa…são família).

                Ser-se diferente é normal, é o que nos torna únicos e não apenas mais um entre a multidão. E existem no mundo todo o tipo de diferenças, sejam elas físicas, mentais ou comportamentais. Qual é o seu hábito estranho, a sua anormalidade? Convido o leitor a partilhar um momento épico, mas só um, porque para gente estranha já cá estou eu!