A vida faz mais sentido quando se está desempregado!

Olhando para o título que decidi atribuir a esta crónica, o leitor pode pensar que eu perdi a cabeça. Ou que eu sou, simplesmente, uma besta. E a verdade é que sim, confirma-se: eu sou, de facto, uma enorme besta. Mas não, caro leitor, eu ainda não perdi a cabeça — e não vale a pena dizer em voz alta que “Ai pois não perdeste. Sabes porquê? Porque ela está agarrada ao teu pescoço!” porque isso é uma piada gasta, e que já não faz muito sentido aplicar nos dias que correm. (E correm para aonde? Só Deus sabe, caro leitor… Só Deus sabe…)

Pode parecer estúpido — o que vindo da minha pessoa, por si só já confirma que o é… — mas a verdade é que eu cheguei mesmo à conclusão de que a vida faz mais sentido quando se está desempregado. E por uma simples razão: o facto de se ter muito mais tempo para observar o que se passa à nossa volta, com mais calma e clareza. E quando se tem mais tempo para observar o que se passa à nossa volta com mais calma e clareza, acabamos por descobrir coisas que antes seria totalmente impossível de descobrir, porque se saía de casa bem cedo para ir trabalhar e só se voltava à noite, depois de um dia duro de trabalho, onde só nos apetecia era desligar do mundo. (Sinónimos de “desligar do mundo”: jogar PlayStation; ver séries na televisão; ler livros; e ver pornografia… — que não é o caso do cronista que está a escrever esta crónica, está bom? O cronista que está a escrever esta crónica é um jovem sério, que não faz nada dessas badalhoquices de que se ouve falar em certos filmes que envolvem certas ferramentas de sadomasquismo, e tal… e coiso.)

Então, desde que estou desempregado que descobri, por exemplo, que o carteiro que traz a minha correspondência é um preguiçoso do camandro, que opta por deixar um postal no meu marco de correio, do que subir até ao primeiro andar para entregar a encomenda. Eu sempre pensei que era por não estar ninguém em casa — visto que estava a trabalhar — que ele deixava o postal em vez de entregar a encomenda. Afinal não. É só o carteiro que é uma besta. Muito agradecido, ó shôr carteiro…

Mas isto não fica por aqui, no que toca a descobrir coisas novas desde que estou desempregado. Por exemplo, descobri que meu vizinho, todas as manhãs, acha muito engraçado dar de comer aos pombos a partir da sua janela. E o que é que os pombos fazem em abundância? Fazem descargas industriais de bosta, em cima de automóveis. Agora sim, já percebi porque é que todos os dias, quando chegava do trabalho ao fim do dia, deparava-me com a minha viatura coberta de manchas brancas de fezes de pombo: porque o meu vizinho anda a alimentar os pombos, para que eles façam a digestão durante o dia e acabem por utilizar a minha viatura — que está pacatamente estacionada à minha porta — como casa-de-banho privada. Muito obrigado, sua besta, perdão, vizinho… Um abraço!

E mais (sim, que isto de se estar desempregado é mesmo algo super porreiro! Há-de experimentar, caro leitor… Vai ver que não quer outra coisa…), tenho alguns vizinhos que ainda não sabem que estou desempregado e, por essa mesma razão, pensam que eu não estou em casa durante o dia. Então, o facto de estar desempregado, levou-me a ter a oportunidade de saber o que os meus vizinhos pensam de mim, assim como de toda a vizinhança em geral, visto que algumas vizinhas minhas passam horas à janela, a partilhar coscuvilhices sobre a vida de toda a gente do bairro. O que eu agradeço, pois assim já sei que, ao cruzar-me com elas no prédio, o sorriso que me fazem não é de simpatia, mas sim de gozo. Obrigado, suas bestas, perdão, vizinhas… Beijinhos.

Isto de se estar desempregado é mesmo porreiro, não acha leitor?

Até para a semana, malta catita!