Acabou a nossa paz! Qual paz?

Estava a trabalhar hora do almoço, quando uma cliente entrou no meu estabelecimento e nos deu a triste noticia: a cidade de Paris estava a sofrer um atentado. O primeiro pensamento que me ocorreu foi os meus filhos. Parece estranho não é leitor? Mas acho que é geral, quando acontece uma tragédia, seja um caso isolado ou um triste acontecimento desta dimensão, o primeiro pensamento das mães é o de protecção para com os seus filhos.

Senti-me impotente, senti que o mundo estava a entrar em colapso humano e nós, pequenas formigas que aqui andamos, estamos a dar conta deste facto tarde demais.

Não vou escrever sobre o caso em concreto do Charlie Hebdo, muitas são as crónicas que se escrevem neste momento sobre este atentado. Paris e o mundo perderam 17 vidas, doze das quais faziam um uso justo e honrado à liberdade de expressão.

Acabou a nossa paz! Qual paz? Pergunto eu. Enquanto o leitor toma a sua meia-de leite confortavelmente no seu sofá e lê esta cronica entre outras, uma menina de apenas dez anos foi obrigada a ser bombista suicida pelo grupo terrorista Boko Haram, matando 20 mortos e mais de uma dezena de feridos num mercado na Nigéria, metade do corpo da menina foi projectado a mais de 500 metros.

Qual paz? Um milhão é um mero numero estimativo, um numero sem rosto. Um milhão de crianças refugiadas na guerra da Síria.

Qual paz? Há em todo o Mundo, com maior predominância no Continente Asiático, mais de 150 milhões de crianças, abaixo dos onze anos, vitimas de exploração infantil.

Qual paz? 150 milhões de meninas e 73 milhões de meninos são vitimas de exploração sexual em todo o mundo. Nos sessenta minutos que passamos no facebook mais de 200 crianças são vitimas de exploração sexual só na América. É um contraste duro e real leitor.

Qual paz? Por ano, estima-se mil mortes por crimes de honra no Paquistão! Mulheres são apedrejadas até à morte, ou ainda enterradas até ao pescoço e apedrejadas, por familiares em plena rua. Motivo? Terem relações sexuais com outro homem mesmo que sejam viúvas é apenas um de muitos.

Qual paz? Parece uma realidade longe de Portugal, não é leitor? Pois deixe-me elucida-lo da nossa realidade portuguesa. 40 mulheres foram mortas em 2014 vitimas de violência domestica por parte de companheiros ou ex-companheiros. E ainda 46 tentativas de homicídio foram sinalizadas.

Qual paz? 122 crianças ficaram órfãs de mães vitimas de violência domestica.

Qual paz? 27 por cento é a estatística que prova que somos dos países da União Europeia, cuja pobreza mais aumentou. Somos também o país com mais desigualdade social. A classe mediana, a classe remediada acabou, actualmente existem os ricos e os pobres.

Qual paz? Mais de 120 mil crianças passam fome em Portugal, cuja única refeição diária que fazem é na escola.

Qual paz? Todos os dias, um idoso, com mais de 65 anos, é agredido pelo próprio filho. Não, já não temos dignidade para desfrutar da nossa velhice.

Qual paz? Cem crianças por dia são vitimas de maus-tratos. Leu bem leitor, cem crianças por dia. Numero assustador. O que andamos a fazer às nossas crianças? As crianças que serão futuramente os nossos governantes, médicos, professores, trabalhadores, pais…

Qual paz? Portugal é o terceiro país aonde a taxa de suicídio aumentou. A estimativa aponta para cinco casos por dia. Suicídio na adolescência também aumentou.

Impressionado com os números leitor? Eu também. Tudo o que escrevi em cima também é guerra, uma guerra que não cessa, uma guerra que aumenta em estimativas impressionantes ano após ano. Os números da guerra são importantes, as pessoas da paz são ainda mais. Façamos por isso.