AEC, Inglês e Educação – O que se vai passando por cá…

Hoje venho falar de um tema que tenho evitado porque quase sempre me incomoda de uma tal maneira que transcende a forma harmoniosa como gosto e prefiro estar e ser…

Hoje venho falar de uma pequena parte da Educação em Portugal, as AEC, actividades de enriquecimento curricular, tão desprezadas pelo actual governo, como desprestigiantes para quem nelas trabalha ao longo de cada ano lectivo.

As AEC, Actividades de Enriquecimento Curricular, e sem me querer alongar muito no detalhe técnico sobre as mesmas, nomenclatura e legislação concreta, surgiram no ano lectivo 2006/07, e bem, a meu ver, tornando a escola pública mais abrangente em horário, e possibilitando que na escola pública se aprendessem matérias à parte da monodocência – tipicamente o professor primário de antigamente apenas – e o 1º ciclo passasse a contemplar mais áreas disciplinares, com diferentes docentes, nomeadamente nas áreas lúdico-expressivas, na música, na actividade física e desportiva e no inglês.

É pois sobre esta última disciplina que me irei “debruçar”, pois embora todas sejam importantes é sobre esta última que melhor estou informada e aquela que mais me tem “dito respeito” a nível profissional…

É quase hilariante como o Inglês tem sido tratado em Portugal desde há alguns anos atrás, desde as habilitações para leccionar o mesmo até aos programas, muito tem vindo a ser alterado sucessivamente ao longo dos tempos…

Curioso mesmo é o facto de anteriormente existirem os designados “mini-concursos”, referindo-me há mais de quinze anos atrás, onde por exemplo o FCE- First Certificate in English, da Universidade de Cambridge, certificado internacionalmente reconhecido, ser habilitação suficiente para leccionar o Inglês em Portugal até ao 9º ano de escolaridade, e agora, pasme-se, apenas o CAE – Certificate in Advanced English ou o CPE – Certificate of Proficiency in English , ser suficiente para leccionar o pré-escolar e o 1º ciclo, nas referidas AEC…

Pasme-se pois, porque a qualidade destes Certificados internacionais é incontestável , não ficando atrás de muitas outras habilitações que conferem a “habilitação” para o ensino do Inglês em Portugal no secundário…pasme-se ainda mais, porque na maioria dos Países da União Europeia, cursos de inglês portugueses, que conferem licenciatura, não são admitidos para leccionar nesses mesmos países, enquanto que os certificados internacionais servem este propósito, porque reconhecidos pela Universidade inglesa, pois claro…

Mas o que me causa realmente espanto não é exactamente esta questão, mas antes o facto destes certificados apenas servirem em Portugal para o 1º ciclo, e alguns nem para isso…(é o caso do First Certificate, outrora servia para o 9º ano, agora não serve para o ensino…)

À parte disto, a redução destas AEC o ano passado, fez com que o Inglês passasse a ser um absurdo no 1º ciclo, ou pelo menos um “faz de conta”, na grande maioria dos casos…Por outro lado, este ano, já se ouve falar de que o Inglês passará a ser obrigatório dentro do horário curricular, passando nós a acreditar que o professor do 1º ciclo, coadjuvado primeiro, e assegurando o inglês, após formação adequada, passará a ser docente de ainda mais esta matéria…

Não me causa muito espanto porque me tenho apercebido que existem vários infantários privados em portugal que asseguram música, inglês e actividade física, através da educadora e auxiliar, sem que contratem um profissional que saiba o que está a fazer…não é grave…pois…talvez…mas a verdade é que é nestas idades que erros “grosseiros” na língua acabam por ser interiorizados, e portanto isto não deveria ser admitido…é nestas idades que a actividade física deve ser cuidadosa porque envolve o desenvolvimento da criança, a sua postura e qualidade da mesma para o futuro, portanto deveria ser levada a cabo por quem tem habilitações e conhecimentos para isso, mas nem sempre é…porque também na música muitas vezes erros e vícios começam com um mau ensino nestas idades, portanto é fundamental ter um profissional competente a ensinar…mas não…a educadora ou educador são essenciais nas suas áreas, claro que de facto  se “cruzam” com outras áreas do desenvolvimento e da aprendizagem…mas para aprendizagens concretas, os profissionais devem ser adequados e habilitados para o efeito…digo eu…Mas nem sempre assim é, e, portanto, nada melhor do que aplicar o “mesmo remédio” para o 1º ciclo, pois claro…o resultado deve ser excelente…pois claro!

Enfim, em resumo o mais importante é perceber aquilo que na verdade este governo não quer que se perceba: o ensino está a ser prejudicado e não beneficiado pelas medidas que têm sido aplicadas…e as AEC estão a ser reduzidas lentamente, talvez com o objectivo de desaparecerem de vez…Em relação ao Inglês e às AEC em geral, este governo tem aplicado medidas vergonhosas…para alunos e para profissionais…

Profissionais que dão o seu melhor, com horários incompletos, mal pagos, a contrato temporário ou a recibo verde, a deslocarem-se entre escolas, por sua conta claro, sem ajudas de custo, em muitos casos sem material de suporte – têm de ter o seu material, pois existem escolas onde não dão manuais aos alunos, nem fotocópias de fichas, nem coisa alguma…uma vergonha porque estes profissionais, licenciados ou qualificados para o efeito dão o seu melhor mas não recebem ordenado durante as pausas lectivas e muito menos nos três meses de Verão, vivendo portanto “do ar” nestas alturas”, têm muitas vezes cerca de trezentos alunos a quem dão aulas e fazem avaliação, não passam do mesmo escalão, muitos nem podem ir a concurso porque as suas habilitações internacionais não dão acesso, muito embora, o 2º ano de um qualquer curso com duas disciplinas de inglês possa dar acesso (vejam bem o disparate!), e na verdade não fazem carreira, nunca sabem se em Setembro irão ter ou não emprego, e passam anos e anos nesta vida de professor de AEC, apenas por “amor à camisola”, a esforçarem-se por dar o seu melhor sem ver qualquer reconhecimento por parte do Estado que os utiliza para a Escola pública, mas não os dignifica nem assegura que os mesmos profissionais possam desempenhar o seu trabalho com condições dignas.

Vergonha que o Estado português e este ministro da Educação não encontrem soluções dignas, justas e rigorosas, onde possam reconhecer o valor de todas estas pessoas, e retribuir na justa medida em que os mesmos têm dado de si à Escola pública.

Ao invés, todos os anos trazem instabilidade e insegurança a estes profissionais, desmotivam pessoas que vão tentando ensinar e dar um pouco de si todos os dias…

Medidas após medidas, vão desrespeitando este profissionais, as crianças, as escolas e os pais e encarregados de educação destas crianças, sem tempo para qualquer reacção e atrasando a organização das AEC e das escolas todos os anos (aliás, o último começo de ano lectivo foi caótico, sendo que houve alterações para pior já em período de férias – aliás a 18 de Julho se não estou em erro, saiu o decreto que reduzia em horas as AEC e transformava a vida destes profissionais num verdadeiro inferno, em que por vezes muitos pensam se valerá a pena continuar e outros têm medo de não serem “chamados” a continuar…)

Para finalizar quero demonstrar o mais profundo respeito por todos os professores licenciados deste país, e também por todos aqueles que possuem as qualificações legais para o exercício da profissão em alguns ciclos da escolaridade, sabendo que temos dos profissionais mais qualificados e melhor preparados em toda a Europa, mas são os nossos professores, sobretudo os de AEC, dos profissionais mais mal pagos e absolutamente precários, o que só nos pode envergonhar a todos.

Desculpem o desabafo…mas de facto é uma vergonha o que se vai passando neste país…na Saúde ou na Educação, sobretudo, é alarmante o que se vai passando…até quando o deixaremos acontecer?…

Desejo-vos uma excelente semana…

 

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Crónica de Lúcia Reixa Silva
De Alpha a Omega