Ágata e a estratégia de marketing que gozou com os portugueses

O título desta crónica não engana ninguém: vamos falar sobre Ágata. Mais concretamente sobre a estratégia de marketing por si utilizada nas últimas semanas. O quê? Não sabe o que aconteceu na vida, e carreira, de Ágata? E como conseguem vocês viver sem esse pedaço de informação absolutamente essencial? Surge este tema porque na passada semana eu próprio e o João Morais do Carmo (colega cronista do Mais Opinião) abordámos este tema no nosso programa de rádio (chamado “KOTA”, na Rádio Voz de Alenquer, podem ouvi-lo em directo no site da rádio todas as quintas-feiras entre as 22h e as 24h). Não desesperem que o “Desnecessariamente Complicado” desta semana vai informar-vos de tudo, até ao mais ínfimo detalhe!

Digamos que Ágata cansou-se da vida de cantora de música popular portuguesa (e das poucas condições financeiras que as Juntas de Freguesia e Câmaras Municipais possuem para apostar em nomes “grandes” como seu para as festas e romarias). A crise que existe em Portugal e o cada vez menor poder de compra que os portugueses têm também não ajuda, obviamente. Ora dito isto a decisão mais lógica era abandonar a carreira musical, certo? Depende do ponto de vista.

Do ponto de vista da cantora até se compreende esta decisão. São muitas décadas de carreira, o cansaço começa a acumular-se e nestas alturas de crise existe a tendência de dar protagonismo apenas aos aspectos negativos. Os sacrifícios são imensos, dado que em Portugal é praticamente impossível, para a maioria dos cantores, viver apenas da música (nem todos pertencem à família Carreira…). E para além de tudo isto temos de ter em conta a idade da cantora e o desgaste da sua imagem. E por último, e mais importante, temos o facto de que Ágata tem plena noção de que o seu tempo já passou. Claro que continua a ter fãs. Claro que continua a vender. Mas com tantos novos “cantores” a surgirem a um ritmo alucinante até que ponto vai Ágata conseguir manter o seu protagonismo?

Do ponto de vista dos fãs da cantora é um misto de emoções. Os verdadeiros fãs sabem reconhecer que o auge da cantora já passou há muito tempo (não é por acaso que Ágata não tem uma música nova a ser um sucesso nacional vai para vários anos). Mas como fãs que são querem sempre mais da artista. Mais um concerto. Mais uma ida a um programa matinal da televisão portuguesa. Mais uma entrevista à imprensa. Mais, e mais, e mais. E se a cantora “cortar” este ciclo, terminando a sua carreira, isso deixará os fãs tristes. Estamos a falar de Ágata, mas podíamos estar a falar de qualquer outro cantor ou banda nacional ou estrangeiro. Contudo, muitos dirão (acertadamente, na minha opinião) que é melhor sair enquanto se está por cima do que esquecida por tudo e todos.

E do ponto de vista da imprensa? Bem a imprensa certamente que esfregou as mãos de contente. “Porque teria a imprensa ficado contente? É porque não gostam de Ágata?”. Não, nada disso. Ficou contente porque de repente, e sem aviso prévio, ganharam um assunto. Um tema para esmiuçar ao máximo. Algo que pode parecer banal mas é de extrema importância nesta altura do ano (não se esqueçam que é verão, que não tem acontecido nada de nada e que continua a ser necessário “encher” páginas, e páginas, e páginas em revistas, jornais e sites de internet). Logo, se este assunto fosse bem aproveitado poderia render bom dinheiro em vendas e poderia ocupar muitas capas nas próximas semanas (e até meses desde que gerido da forma correcta por todos os intervenientes).

Portanto recapitulemos: Ágata anunciou ao mundo que a sua carreira iria terminar no final do ano. Certamente que a própria esperava que se instalasse o caos. Que a internet viesse abaixo. Que Portugal parasse e que todas as discussões se virassem para o seu abandono deixando o BES de lado. E o que aconteceu na realidade? Tudo, e todos, reagiram com….total indiferença. Sim, fizeram-se algumas capas de revistas. Sim, algumas televisões fizeram reportagens sobre isso. Sim, o Facebook oficial da cantora conheceu mais comentários e partilhas do que até então. Mas não aconteceu nada de extraordinário. Resumindo e concluindo: ninguém queria saber da Ágata e da sua reforma.

Como terá reagido a cantora quando se apercebeu que a sua estratégia de marketing (que na teoria a poderia catapultar novamente para a ribalta) havia falhado redondamente? Exactamente: entrou em pânico. E entrar em pânico foi o princípio do fim para esta história. Passados uns dias já toda esta história tinha-se esvanecido por completo da mente dos portugueses (e dos perfis de Facebook dos internautas também).

Foi então que Ágata percebeu que tinha que mudar o rumo dos acontecimentos e voltar a centrar a atenção na sua reforma. Mas como o poderia fazer? Anunciando que afinal não vai terminar a carreira, como é óbvio. E se até aqui a estratégia parecia fazer sentido, é neste ponto que tudo se perde por completo.

A cantora deixou na sua página de Facebook a seguinte mensagem: “A caminho de Lisboa, em conversa com a minha promotora sobre a minha decisão em terminar no final deste ano a minha carreira, parei numa área de serviço e dei de caras com [um] livro…. Abri-o ao calhas e a mensagem que tinha numa única folha era esta: ‘Desistir não é opção’. Arrepiei-me porque senti que esta frase tinha que ter algum significado para mim, pois desistir era o que me estava no pensamento… Creio que isso foi uma das coisas que me [fizeram] parar para pensar, além de ter ficado bastante sensibilizada com as mensagens dos fãs e amigos. Obrigada a todos.”

Talvez na cabeça de Ágata tudo isto soe extremamente poético, contudo na realidade é apenas triste. Porquê? Porque todos, até as crianças, percebem que tudo isto é apenas fachada. É algo criado pela mente da cantora (ou de alguém da sua equipa). E antes que perguntem: não, não acredito que a parte do livro seja verdadeira. Mas estou aberto a que me provem que o dito livro existe (basta que me digam o nome do autor, da obra e da editora assim como a referida página). Já para não falar do facto de tudo ter acontecido numa estação de serviço (porque não uma biblioteca ou uma livraria histórica de Lisboa ou Porto? Era bem mais romântico!).

Tudo isto foi bem pensado, mas executado da pior das formas. Não houve uma última digressão pelo país (e não seria descabido abranger também as comunidades portuguesas no estrangeiro). Não houve um último álbum que juntasse todos os êxitos da cantora (ou mesmo uma “caixa especial” com todos os álbuns de Ágata). Não houve direito a um documentário ou a uma reportagem alargada sobre a vida da cantora e sobre os projectos para o futuro (afinal de contas Ágata teria de viver de alguma coisa, certo?).

O próprio anúncio de que afinal não iria desistir foi mal executado. Ora se a cantora iria abandonar apenas no final do ano que sentido faz que volte com a palavra atrás em pleno mês de Agosto? Não faria mais sentido fazê-lo em meados de Janeiro ou mesmo Fevereiro (deixar o público algum tempo sem a cantora seria essencial para o sucesso do regresso)? Claro que faria mais sentido. Faria todo o sentido. E assim é que devia de ter acontecido, não estivéssemos nós em Portugal: um país que teima em não ser sério e em não se levar a sério. O que Ágata fez foi brincar com o público português, com a imprensa e em especial com os seus fãs. Contudo estes em vez de a condenarem por o ter feito ainda vão é agradecer-lhe por afinal ter reconsiderado o seu abandono. Realmente, este país nunca pára de me surpreender…

Nota apenas para dois comentários finais: não sou fã de Ágata. Assim como não sou fã da chamada música “Pimba”. Não a oiço. Não a danço. Não dou audiências aos programas que têm estes cantores. Não compro os seus cd’s. Mas apesar de tudo isto respeito os profissionais que lutam pela sua sobrevivência no negócio que amam. E Ágata é uma dessas profissionais. Goste-se, ou não, da sua voz e das músicas que canta a verdade é que conquistou o seu lugar no panorama musical português. Não existe nesta crónica qualquer tom jocoso ou de desvalorização do talento ou da pessoa que é Ágata. Existe, isso sim, uma opinião pessoal sobre todo o desenrolar do processo. E transmiti-la é um direito que me assiste. E na minha opinião tudo foi bem pensado mas muito mal executado. Por fim, resta-me agradecer ao João Morais do Carmo, pois parte da minha reflexão foi da sua autoria, aos microfones da Rádio Voz de Alenquer, durante a última emissão do nosso “KOTA”.

Boa semana.
Boas leituras.