Ah, Pois!…”

Gosto particularmente da boca dela e da atração subjacente ao seu olhar. De podermos conversar e, aos poucos, sondá-la, auscultando o que pensa a meu respeito.

Talvez uma tampa me soubesse à tentativa frustrada de agradar, oferecendo-lhe nos anos um bouquet das flores prediletas, mas numa cor de que não gostasse, pensando em que se fosse um anel ou uns brincos, mesmo perdido o talão de troca, ainda poderiam vir a servir na mulher, que numa ocasião posterior, porventura viesse a conhecer.

À parte a minha modéstia, só tinha a meu favor, a lisura do meu caráter, mas para tentar convencê-la, talvez pudesse os que eu considerava serem os aspetos mais positivos da nossa amizade: ela ser duradoura existindo há mais de vinte anos; as garantias que dava de dava a título pessoal de vir a ser-lhe fiel; ou a evidência do meu pendor artístico, que permitiria escrever-lhe poemas ou, quando encarnasse uma personagem de Shakespeare, citar com acentuação dramática uma daquelas mais de vinte mil passagens da Bíblia em que se apela ao amor.

Há muito evito encará-la de frente, por temer, devido à comoção, um fanico que me abalasse ao ponto de captar a sua atenção, mas infelizmente pelos piores motivos. Embora ela não note, há muito trago o amor está latente em mim, como a imagem de marca dum produto que serve para distinguir o original duma imitação que serve para dar-lhe má fama..

Num registo ímpar, tem o ar tranquilo duma mulher a quem não é exigido que lide diariamente com problemas no trabalho ou em casa ature um marido chato. Tem olhos equiparados a estrelas que brilham o dobro do sol, e, quando sai do banho, cabelo escorrido como quem, com aparelho, alisa pacientemente em casa sabendo que vai agradar a alguém. Noutras ocasiões, prende o cabelo atrás num carrapito, com que não deixo de gostar de vê-la, a não ser quando se despede e sei que se vai embora.

Sem tirar, nem pôr, à vista do exemplo de mulher que já era, mais facilmente se percebe estarmos hoje na presença duma mulher feliz, do que quando, mesmo sorrindo, eu nem sempre entendia por que razão, ao invés, não chorava.

Gosto dela, pese embora morar a mais de nove mil e trezentas milhas terrestres de mim, e comprovadamente ser a única pessoa a quem já se ouviu falar na nossa amada Língua Inglesa, num lugar ainda mais distante daqui do que as remotas terras da Austrália. Gosto tanto dela, que de bom grado a veria sentada agora aqui, a chapinhar comigo os dedos num prato de caracóis, enquanto me deliciava supondo, que era em mim que pensava quando sorria, simplesmente imaginando o petisco que iria comer de seguida.

Ah, pois!…

In Trevor sailor’s travel diaries Ed. London 1855

FIM