Anda Comigo Ver os Aviões – Uma Análise

Pelos vistos, nos últimos tempos, a música “Anda Comigo Ver os Aviões”, dos Azeitonas, tornou-se numa espécie de hino romântico para muitas mulheres. Como tal, decidi ir ouvir a música em questão e, depois de a escutar repetidamente, não consigo compreender onde está o romantismo. Para esclarecer o meu ponto de vista, aqui fica uma análise séria da letra desta canção:

“Anda comigo ver os aviões 
Levantar voo,
A rasgar as nuvens,
Rasgar o céu. “

Cá está: a proposta de programa romântico que o autor faz a uma mulher é “ver aviões a levantar voo”. Que cenário romântico absolutamente idílico, não é verdade? Não, não é. É uma merda de programa! O gajo vai levá-la ao aeroporto, é isso? Bem, ela vai ficar mesmo deslumbrada… Portanto, logo nesta primeira quadra, pode-se constatar que este tipo tem pouca ou nenhuma experiência com mulheres. Porque se tivesse, levava-a a jantar fora, ao cinema ou simplesmente a um jardim e não achava que ir ver aviões fosse uma proposta bastante sedutora. Mas vamos continuar.

“Anda comigo ao porto de Leixões
Ver os navios
A levantar ferro,
Rasgar o mar. “

Ah, pronto, agora sim! Ele propõe levá-la a um porto para ver navios a zarpar. E haverá programa que deixa uma mulher mais derretida do que este? É uma daquelas imagens clássicasde filme romântico: um homem e uma mulher de mãos dadas, a andar em círculos enquanto soltam gargalhadas de pura alegria e, em pano de fundo, um porto com navios a zarpar. E, claro, é importante sublinhar que ele não a quer levar a um porto qualquer. Ele convida-a especificamente a ir ao porto de Leixões, esse arquétipo de beleza. Não sei se a leitora sabe, mas no universo masculino todos sabemos que levar uma mulher ao porto de Leixões é aquele programa garantido para nos safarmos. Acho que este programinha só poderia funcionar com uma mulher que viva no Portugal rural profundo e nunca tenha visto mar.

“Um dia eu ganho a lotaria, 
Ou faço uma magia,
Mas que eu morra aqui.
Mulher tu sabes o quanto eu te amo,
O quanto eu gosto de ti.
E que eu morra aqui
Se um dia que não te levo à América
Nem que eu leve a América até ti.”

Mais uma proposta de sedução. Agora, com a promessa de levar a sua amada à América. Antes de mais, que linguagem é esta? “América”? Estamos nos anos quarenta, é? Em que ir à “América” era um feito ao alcance de poucos? Lamento, mas hoje em dia qualquer merdas vai à América. Há voos para lá todos os dias. Claro que, não há dúvida, sempre é um programa mais estimulante que ir ver aviões ou navios. Mas agora reparem no seguinte: quando é que ele promete levá-la à América? Já hoje? Para a semana? Não, é quando ganhar a lotaria. Para além de tenrinho, este merdas não tem sequer dinheiro para nada, depositando a esperança de levar a moça a passear num jogo de sorte ou, caso isso não funcione, na magia. Como se não bastassem todas as propostas lunáticas que fez, ele acredita ainda que com uma makumba qualquer consegue transportar duas pessoas até outro continente. Ou, melhor ainda, que consegue trazer um continente até cá. Sabem como é que isto se chama? Pensamento mágico e delírios de grandeza. Portanto, para além de tudo o resto, este tipo sofre também de perturbações da saúde mental.

“Anda comigo ver os automóveis,
A avenida,
A rasgar as curvas,
Queimar pneus.” 

Cada vez mais baixo….  Como se levar uma tipa a ver aviões ou ver navios nao fosse suficientemente rasca, agora decide convidá-la a ver automóveis. Brutal, não é? Passamos portanto de 1940 para 1900, altura na qual ver automóveis era, de facto, uma actividade nova e fascinante em Portugal. E ele nem a convida a ir vê-los ao autódromo ou qualquer coisa do género. Não, é na avenida. Na merda de uma avenida, a ver automóveis. Que romântico incurável, não é verdade?

“Um dia vamos ver os foguetões levantar voo,
A rasgar as nuvens,
Rasgar o céu. “

Foguetões já pode ser uma coisa engraçada. Mas claramente aqui, constata-se que o autor disto ficou sem imaginação. Referiu o elemento ar com aviões, o elemento água com navios e o elemento terra com automóveis. E decide voltar ao elemento ar, agora com foguetões. E já nem me quero debruçar sobre o facto de ser complicado ver um foguetão, quanto mais ver vários… Saliento apenas que também as duas últimas estrofes são repetidas. Ou seja, mais um ponto a seu favor: tem a imaginação de um bloco de cimento.

“Um dia eu ganho o totobola,
Ou pego na pistola,
Mas que eu morra aqui.
Mulher tu sabes o quanto eu te amo,
O quanto eu gosto de ti.
E que eu morra aqui
Se um dia eu não te levo à lua
Nem que eu roube a lua só p’ra ti.” 

Agora é com o totobola que este gajo quer ganhar dinheiro! É impressão minha, ou este merdas tem um problema de jogo? Se calhar se não estoirasse tudo em lotarias e totobolas tinha guita para a levar a jantar fora, como as pessoas normais. Mas não, o makubeiro prefere apostar no jogo. Ou então pega na pistola. Aposta na criminalidade. Ganhar dinheiro a trabalhar é que não! Isso custa e demora. É preferível apostar no jogo, fazer umas makumbas ou então, se tudo falhar, pegar na fusca e ir roubar. Parece ser um excelente partido, senhoras. Ah, e claro, continuam os delírios: agora diz que rouba a lua. Tem poucos problemas, tem…

“Um dia eu ganho o totobola,
Ou pego na pistola,
Mas que eu morra aqui.
Mulher tu sabes o quanto eu te amo,
O quanto eu gosto de ti.
E que eu morra aqui
Se um dia que não te levo à América
Nem que eu leve a América até ti.”

E pronto, o otarinho voltou à América. Por mim já chega. Para as senhoras que consideram esta canção um hino romântico, só posso constatar o seguinte: o vosso tipo de homem é um labrego sem dinheiro, sem imaginação e sem experiência com mulheres, viciado em jogos de sorte, criminoso e com perturbaçõs mentais gravíssimas. Se é isso que procuram, então desejo-vos boa sorte. Provavelmente, vão mesmo precisar dela.


 

Crónica de Amílcar Monteiro
O Idiota da Aldeia
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