Angela Merkel: “super-vitória agri-doce” – Nuno Araújo

A votação para as eleições legislativas na Alemanha, ocorridas ontem, Domingo 22 de Setembro, ditou uma vitória – a terceira consecutiva – para Angela Merkel e a sua CDU/CSU. Merkel disse ter sido uma “super vitória”, mas eu entendo ter se tratado de uma “super-vitória agri-doce”, pois a Chanceler não alcançou maioria absoluta, nem ficará com o seu parceiro de coligação, FDP, agora “arredado” do parlamento alemão.

Observados esses resultados, percebe-se o carácter agri-doce da vitória de Angela Merkel. Essa vitória agri-doce explica-se por dois motivos essenciais: o primeiro trata de enunciar que Merkel ficou a três lugares da maioria absoluta, conquistando cerca de 300 dos 598 lugares do Bundestag (parlamento alemão), mas ainda assim aquém das necessárias 304 cadeiras para garantir como certa essa maioria absoluta. Já o segundo motivo prende-se com a necessidade de mencionar que a votação do FDP foi a mais baixa de sempre, o que automaticamente “retira” o parceiro de coligação de Merkel do Bundestag, curiosamente algo bastante “festejado” pelos apoiantes do SPD.

Porém, os militantes de base do SPD não se mostram “animados” perante a hipótese da “Grande coligação” com a CDU de Merkel, até porque isso seria uma repetição do governo de Merkel do período de 2005 a 2009. Seria, sem dúvida, melhor para o SPD formar governo com Merkel do que a CDU conseguir maioria absoluta e assim governar “sozinha” a Alemanha.

Assim sendo, numa primeira leitura, dir-se-à que foi uma vitória expressiva de Merkel, muito expressiva, mas perigosa para os intentos do seu partido, a CDU. Os intentos da CDU passaram pelo “esvaziamento” dos partidos à direita da CDU de Merkel, e isso paga-se caro com a inexistência de um parceiro de coligação do mesmo quadrante político que a CDU de Merkel. O efeito “eucalipto” de Merkel, que “secou” os liberais presentes a seu lado no governo, inviabilizou a entrada destes no Bundestag. Irá alguma vez o FDP “perdoar” isto a Merkel?.

O SPD, de Peer Steinbruck e Sigmar Gabriel, poderá não estar interessado numa coligação com Merkel, mas por outro lado ainda não é claro se o SPD preferirá formar uma maioria de esquerda com o Die Linke, considerando já como criada a aliança estratégica com os Verdes. O SPD, refira-se, remeteu a responsabilidade da formação do novo executivo governamental na Alemanha para Angela Merkel, a vencedora destas eleições, mas a verdade é que não havendo nenhum partido de direita no Bundestag para formar maioria absoluta com Merkel, restará apenas uma solução para formação de maioria sólida no Bundestag: a maioria de esquerda.

No entanto, uma maioria de esquerda, a ser formada, terá mesmo de esperar que Angela Merkel tente formar um governo apoiado por uma maioria absoluta no parlamento, em primeiro lugar; depois, há que aguardar que Merkel sugira ao presidente alemão que aceite, à boa maneira de um regime democrático republicano semi-presidencialista, uma solução minoritária, procurando assim a CDU fazer acordos “caso a caso”.

A verdade, e a verdadeira reflexão a fazer por Merkel, uma “senhora política” que conseguiu fazer “secar” todos os partidos à sua direita (inclusivé a AfD, o partido anti-euro, e que não chega ao parlamento alemão por 0,1%), é se no seu partido cabem “realmente” políticas de cariz mais proteccionista e menos efusivas quanto a ideais de solidariedade institucional europeia, como as que foram exploradas durante a campanha eleitoral. Se políticas mais proteccionistas couberem no programa de governo de Merkel, então terá sido uma sorte para a UE o facto de Merkel não ter conseguido obter maioria absoluta.

Crónica de Nuno Araújo
Da Ocidental Praia Lusitana