Antes de começarem a ler este artigo, percam uns segundos a olhar para a minha fotografia. Sim, está estranha e estava a usar um barrete em plena primavera. Mas olhem bem para a minha cara. Tenho ar de quem gosta de ser incomodada? Nem por isso, não é? Pois bem, parece que nem toda a gente tem essa ideia de mim.
Estou cansada. Sinto-me insegura para qualquer lado que vá. Ora aparece uma testemunha de Jeová ao virar de uma esquina, ora atropelo um vendedor da cabo. Estou destinada a estes encontros “casuais” e nunca me consigo safar deles. Não gosto de discussões, zaragatas, confusões… Chamem-lhe o que preferirem. E depois tenho um grave problema: não sei dizer “não”. Estou a falar a sério! Já mudei de religião três vezes, já tenho contas em mais de três bancos e tenho mais canais do que é humanamente possível visualizar num dia.
Comecemos pelas testemunhas. São quase sempre senhoras de idade. Vêm ter connosco a perguntar algo tão trivial como: “que horas são, menina?”. Eu sou simpática, não uso relógio mas vou buscar apressadamente o telemóvel só para responder à senhora. Depois disso começa a conversa. “A menina já ouviu falar de Jeová?” Tento não revirar os olhos e manter-me simpática. A senhora continua a falar, entrega-me uma espécie de revista e diz-me para lê-la atentamente assim que puder. Eu já peço tudo para conseguir escapar-me àquilo: chuva, aulas ou até um pequeno terramoto. Mas é impossível! E é por ficar a ouvir tudo até ao fim que já fui católica, jeová, budista e hindu.
O meu outro grande problema são os senhores da Meo, Zon e afins. Os políticos, antes de enveredarem definitivamente por essa área, devem estagiar numa empresa de comunicações para aprenderem a lábia. Chegam de colete, prancheta e uma caneta. Tocam à campainha e não desandam até que alguém lhes abra a porta. E eu, que estou de pijama a ver televisão, apresso-me a vestir um fato de treino, a ajeitar o cabelo e a ir abrir a porta porque já não aguento ouvir a campainha. A ladainha é sempre igual independentemente da empresa. Prometem mais de 70 canais, uma internet extremamente rápida e chamadas ilimitadas para sítios onde Judas perdeu as botas e onde não mais voltou para as procurar. Por enquanto é simples livrar-me deles: “a minha mãe é que trata disso, depois falo com ela”. E eles acenam e vão embora. Que vão com Deus, com Jeová ou com qualquer entidade religiosa em quem acreditem.
Este ano tem sido tão pesado que até pensei em increver-me na Casa dos Segredos. Lá não apareciam testemunhas de Jeová nem pessoal das comunicações. Em contrapartida, teria de aturar a Teresa Guilherme, o que seria incomparavelmente mais complicado. Estou condenada a isto, a ser incomodada diariamente com coisas que não me interessam. Como não sei dizer “não”, um dia pedem-me a chave do carro e eu dou-a. Mas voltem lá a olhar para a minha fotografia. Tenho cara de quem gosta de ser incomodada? Se calhar até tenho e não sei.
Cara Colega Bárbara,
Seguramente não são as testemunhas de Jeová, os senhores da Meo, Zon e afins,como refere, que têm a ver com o tempo que lhes cede, creio sim, que o problema reside em si, não pela sua cara, para a qual olhei a vez necessária, mas sim porque não utiliza a palavra “não” na altura devida. Aliás, esse é um problema de várias pessoas, que como não sabem dizê-lo, sujeitam-se. Ora, o “não” está sempre garantido para todos. Dizer “não” , não significa ser-se mal educado, mas que não está interessado. É totalmente diferente e, quem lhe pretende passar, informação (testemunhas Jeová) ou sobre a banca ou telecomunicações, somente está a procurar cumprir o seu trabalho e/ou função. A Bárbara só tem que aceitar ou não. Vê? aqui está, sim ou não, são as duas únicas palavras que existem para definirmos o que queremos efectivamente. Já agora, a sua cara é simpática, será por isso mesmo que a abordam?
Abraço
fatima ramos
Olá Fátima,
Concordo com o seu comentário. Eu própria já estive na posição deles, a publicitar serviços mesmo quando sabia que as pessoas não queriam ouvir. O meu maior problema é quando eu digo mesmo “não” e eles não aceitam. Porque a partir do momento em que digo não, podem estar uma hora a falar-me das vantagens disto e daquilo; eu não vou mudar de ideias e estão a perder potenciais clientes (isto no que diz respeito à Meo e à Zon, claro).
Quanto às testemunhas de Jeová, começo sempre por dizer que não ligo à religião mas, mesmo assim, insistem em ficar à minha beira como se eu fosse mudar de ideias da noite para o dia. Quando eu não digo “não”, é claro que me ponho a jeito para ser “chateada”. Tenho é um azar tremendo porque no meio de tanta gente que vai na rua, abordam-me sempre a minha. Daí a minha queixa. Não é culpa deles, é culpa de qualquer coisa no universo que me escolhe sempre a mim.
Mas nunca leve a sério um texto meu. Tenho tendência a exagerar e a pôr sempre muita ironia à mistura. E digo-lhe mais, admiro muito quem faz esse trabalho de ir bater às portas, eu não tinha capacidade para ouvir tantas respostas negativas e outras coisas más que devem ouvir de certeza. Não da minha parte, costumo ser sempre o mais simpática possível.
Muito obrigado pelo comentário e por ter lido o artigo.