Até amanhã, Paulo!

Paulo Portas anunciou a sua saída da liderança do CDS-PP, na passada Segunda-feira. Por ocasião de uma reunião da comissão política nacional do partido, Portas afirmou que ponderou, com calma, e decidiu não se recandidatar à presidência dos centristas.

Parece que Portas tomou uma decisão irrevogável. Mas…sabemos bem o quão “irrevogável” representa uma decisão tomada pelo ex-vice-primeiro-ministro. O que hoje é verdade, amanhã poderá já não ser assim…

Portas, que também deixará o seu lugar de deputado, saberá que a liderança ficará entregue a um destes dois “ilustres” elementos centristas: Assunção Cristas e Pedro Mota Soares. Ambos estão ligados ao sector teologicamente mais fechado da Igreja Católica, e foram ministros nestes governos em coligação com o PSD. Telmo Correia correrá “por fora”, mas os dois ex-ministros levam grande vantagem. Outras personalidades centristas, como Pires de Lima, ou mesmo Telmo Correia, não terão à partida tantos apoios internos por forma a obter a liderança do CDS.

Assunção Cristas tem uma posição ultraconservadora em termos ideológicos, mas consegue ter uma boa imagem genérica para a opinião pública, para além de ter conquistado margem importante de apoios dentro do CDS, sem esquecer que é uma “protegida” de Paulo Portas. Já Pedro Mota Soares, que nem sempre foi apoiante de Portas, consegue ser mais expansivo em termos da sua ideologia de base, alcançando algum liberalismo económico, mas não tem boa imagem nem bons trunfos políticos – esteve com a pasta da Segurança Social, tradicionalmente “tóxica” para os políticos (com as honrosas excepções de Vieira da Silva, actual detentor da pasta, e Ferro Rodrigues, Presidente da Assembleia da República). Assim sendo, Assunção Cristas terá vantagem numa eventual disputa à liderança do CDS-PP.

Portas sai na altura em que um dos seus arqui-rivais, Marcelo Rebelo de Sousa, se prepara para ser Presidente da República. Curioso será lembrar que Portas tinha uma admiração expressa por Marcelo, isto no final da década de 80, altura em que o semanário “Independente” foi fundado. Na minha opinião, o ainda líder dos centristas ponderou este afastamento para se colocar estrategicamente numa posição confortável por forma a efectuar crítica ao expectável futuro Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa. Toda a capacidade e conhecimento do meio jornalístico por parte de Paulo Portas fará dele, sem dúvida, um adversário temível e que estará sempre na sombra e oculto de Marcelo Rebelo de Sousa. Esses são os piores inimigos que alguém pode ter: os inimigos ocultos. Marcelo que se cuide…

Portas poderá vir a ser candidato a Presidente da República daqui a 5 anos? Penso que a hipótese será tentadora, mas muita coisa, muita coisa mesmo poderá ocorrer politicamente até lá. Porém, a toada pessoal de uma contenda eleitoral entre Marcelo e Portas seria de um enorme desgaste para os dois, e Portas sabe que correria o risco de perder esse embate eleitoral.

Seja como for, fecha-se um ciclo. Portas é um político notável, goste-se ou não dele, e um comunicador nato e infalível. Conseguiu estabilizar o CDS no parlamento com 18 deputados através do acordo de coligação com o PSD, liderou o seu partido nesta primeira coligação de direita a completar uma legislatura por inteiro, e percebe (melhor que quase toda a gente) que afinal o governo do PS poderá mesmo durar muito mais do que se lhe afigurava ser possível, pois até o PSD de Passos Coelho já vota a favor das intervenções no BANIF, e Bloco e o PCP estão lá sempre que o PS quiser – sim, porque uma vez que o PSD pode apoiar questões importantes para o “regime”, isso retira poder negocial a Catarina Martins e Jerónimo de Sousa, e confere poder a António Costa.

Nem tudo foi fácil para Portas, que terá sempre atrás de si duas “manchas” no seu curriculum vitae político: o episódio do “irrevogável”, e o caso dos submarinos.

É assim mesmo a vida. Terminou um ciclo político, iniciou-se um novo. Mas Portas tem vida longa na política, e sabe sempre reinventar-se, e certamente estará de volta num futuro não muito distante…