BPN vs. BES (versão simplificada)

Depois do aparente sucesso do GES vs. BES, volta mais uma versão simplificada. Desta vez entre o caso BPN e o caso BES, baseado nas várias noticias que tenho lido, em todo o lado e provenientes de todos os quadrantes políticos.

Desde logo a semelhança entre os ambos os casos é que ambos se tratam de “casos de policia”, em que ambas as ex-administrações (curiosamente ou não, que integravam fundadores ou descendentes dos fundadores do banco) estão a ser investigadas por gestão danosa entre outros crimes.

A diferença substancial e muito importante reside na postura do Banco de Portugal (BdP). Enquanto que, no caso BPN, o então governador (agora vice presidente do Banco Central Europeu) Vítor Constâncio informou o Governo que a falência do banco (de dimensão bastante mais reduzida que o BES) iria criar uma crise do sistema bancário e arrastar os outros bancos portugueses, no caso do BES, Carlos Costa, o actual governador do BdP, disse inicialmente ao Governo – e a todos os que o quiseram ouvir – que o banco estava sólido (ou seja, que o problema estava só no Grupo Espírito Santo e não no Banco Espírito Santo).
Todavia, o governador nunca pensou que a antiga administração do BES (nomeadamente Ricardo Salgado) não tivesse seguido as sugestões ou indicações do BdP (chamem-lhe o que quiserem, na verdade são ordens do supervisor). Mas foi isso que aconteceu. Desrespeitando indicações do BdP, a ex-administração do BES continuou a injectar (em forma de investimento) dinheiro do BES nas empresas em ruínas do Grupo Espírito Santo.

O que é que o Estado (incluindo aqui Governo e BdP) fez? Utilizou um método nunca usado em Portugal (mas já usado noutros países, ao que li) que se traduz em, como diz a sabedoria popular, “separar o trigo do joio”. Pegaram em tudo o que era “mau” (dividas, passivo, etc) e deixaram no “BES” e retiraram-lhe a licença para poder exercer actividade bancária. Basicamente o BES continua a existir, mas já não é um banco. E pegaram em tudo o que era “bom” (ou seja, os activos como clientes bancários e seus depósitos, edifícios e agências, etc) e criaram uma nova entidade bancária (bancária porque recebeu imediatamente licença do BdP para esse efeito), tendo ficado com nome de “Novo Banco”.
A promessa do BdP é que os clientes que transitam sem nada precisarem de fazer do BES para o “Novo Banco” não vão perder nenhum dos seus depósitos e pequenas aplicações. E como é isso possível? Porque o Estado vai emprestar a uma taxa de cerca de 8% quase 5 mil milhões de euros (do fundo que a Troika tinha destinado à recapitalização dos bancos e que Ricardo Salgado disse na altura que o BES só recorreria em último caso) a um Fundo gerido por um vice governador do BdP e que tem como sócios todas as instituições bancárias portuguesas, para que este invista no Novo Banco e se torne assim proprietário do banco. Ou seja, o actual “Novo Banco” pertence ao tal fundo, o que é o mesmo que dizer que pertence ao BdP e a toda a banca portuguesa.
Então e vai ficar assim? A resposta é: não. A ideia é estabilizar o banco, torná-lo mais sólido e robusto, agora que se viu livre dos “activos tóxicos”, para mais tarde vendê-lo em bolsa.  A quem? A quem quiser e tiver dinheiro para o fazer. E por quanto? Em bolsa é sempre uma incerteza, mas o BdP acredita que consegue recuperar o dinheiro que o Estado investiu no banco. Se não conseguir, o referido Fundo do qual fazem parte toda a banca e o BdP fica com uma dívida para com o Estado. No BPN, com a nacionalização, foi o Estado que pagou a “factura” das dividas do banco, pois vendeu o banco sem essas dividas e (ainda) não foram responsabilizados os ex-accionistas e ex-administradores.

O que é que acontece ao BES? O BES é agora uma empresa (não um banco) com enormes dividas devido, essencialmente, à exposição ao Grupo Espírito Santo. Quem perde com isto? Essencialmente os accionistas e quem investiu em capitais de risco. O Estado agiu para proteger depositantes (em suma, clientes bancários), não investidores, o que faz todo o sentido pois quem investe sabe que tem sempre o factor “risco” associado.
Se assim é, porque se queixam os investidores? Porque o governador do BdP disse há cerca de 15 dias que o BES estava sólido, o que os levou a não vender  as acções do banco (ou, nalguns casos, a investir mais ainda). Pior: foi a avaliação do BdP que levou os accionistas de referência a investirem muito dinheiro num aumento de capital que agora de nada lhes serve. Ficaram accionistas na mesma mas de uma empresa em pré-falência. Pode ser que ainda consigam algum dinheiro vendendo as dividas às empresas especializadas na sua recuperação (e, eventualmente, em processos contra a anterior administração), mas de muito pouco vale em relação ao que investiram.

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