Cavalheirismo: para onde foste?

Ora viva, caro leitor. Hoje, para além de ser sexta-feira e o fim-de-semana estar aí à porta, é igualmente um dia especial. E sabe porquê, meu caríssimo amigo? Porque hoje é dia de festa! E por que razão hoje é dia de festa? Porque, meu caro amigo, hoje celebra-se uma data muito especial. E por que razão se celebra uma data muito especial, hoje? Porque, meu caro leitor (e prepare-se para o que aí vem…), hoje é a crónica número cem! É a loucura! Hoje vai ser um dia de arromba! Um dia de puro e extremo forrobodó! E quero desde já convidar você, caro leitor, para a mega festa que se vai realizar hoje, em comemoração da centésima crónica no Mais Opinião.

E para que esta celebração seja de tal forma memorável, eu decidi alugar um mega armazém para um convívio em grande — uma espécie de passagem de ano. E para abrilhantar esta grande comemoração, eu decidi perder a cabeça e contratar uma stripper para animar a festa. Mas, atenção, que não estou a falar de uma stripper vulgar que nem dançar ou roçar no varão como manda a lei, sabe. Mas sim, uma excelente bailarina que, para além de dançar, ainda sabe cantar — e pasmem-se! — tal e qual a Ana Malhoa. Ela é de tal forma brilhante que até fez questão de tatuar todo o seu corpo e rapar o cabelo, para se aproximar bastante da personagem que irá interpretar durante a comemoração da centésima crónica no Mais Opinião. Ah, e até faz questão de falar igualmente como a Ana Malhoa, usando exageradamente a palavra “turbinada”. Se isto não é ser profissional, então não sei o que seja, caramba. Ainda há gente competente neste mundo…

Bom, mas deixemo-nos de euforias. Hoje, nesta centésima crónica, eu quero abordar uma temática que, lamentavelmente, está pelas ruas da amargura — falo obviamente do cavalheirismo. Os homens — e a raça masculina que me perdoe, mas as verdades são para serem ditas! — de hoje em dia são umas bestas! É isso, mesmo. Por mais que me custe admitir, a raça masculina está a cair em desgraça a uma velocidade vertiginosa, como se tivesse saltado de um avião sem paraquedas. E isto, meu amigo, é uma calamidade.

Todos os dias, pela fresquinha — e aqui estou mesmo a referir-me no sentido literal e não figurado — saio de casa para uma caminhada no parque com o meu velho. Sempre é uma forma de esticar as pernas e de obrigar o meu velhote a envelhecer mais rapidamente, acabando por estoirar os joelhos mais rápido do que seria suposto. Mas diz que é bom para o coração. E, convenhamos, mais vale ter um coração saudável e os joelhos completamente estoirados, do que o oposto — sendo assim, estou apenas a zelar pelo bem-estar do meu velho. Sou ou não sou o filho que todos os pais querem ter?

No parque, pela manhã, é possível cruzarmo-nos com inúmeras pessoas que aproveitam a “fresquinha” para caminhar ou praticar o seu jogging. E é também o local ideal para se constatar que já não existe cavalheirismo hoje em dia. E eu passo já a explicar como é que cheguei a esta conclusão, mas antes disso quero relembrar que hoje temos festança da boa para celebrar as cem crónicas no Mais Opinião. Não se esqueça de aparecer, caro leitor.

Durante uma pequena pausa para hidratação, eu presenciei uma situação que prova que já não existe cavalheirismo nos dias que correm. Um senhor que pacatamente caminhava pelo parque, foi interpelado por um casal. Até aqui tudo bem, não fosse o facto de a reacção do senhor ter revelado a besta que há em si. Pelo que me apercebi, a mulher do casal parecia conhecer o senhor, mas há já algum tempo que não o via. Então, assim que chegou perto do senhor, a mulher gritou algo como “Senhor Antunes! Há quanto tempo!”. Por breves momentos, o senhor olhou para a mulher ostentando uma expressão confusa, como quem pensa: “Mas quem é esta maluca, caramba?” Mas passados alguns segundos lá se fez luz na sua cabeça, e a prova de que ele é uma besta e que o cavalheirismo não existe na sua pessoa veio ao de cima, quando ele proferiu as seguintes palavras: “Ah, Joaninha! És tu! Estás tão gordinha, que já não te conhecia! Como é que foste engordar tanto, rapariga? Estás mesmo gorda!”

Ou seja, já não bastou o facto de ele afirmar que não a reconhecia por ela ter engordado, ainda fez questão de reforçar a sua constatação por mais duas vezes. Desde tenra idade aprendi que, apesar de ser a triste e dura realidade, nunca se deve dizer a uma mulher que ela está gorda. É uma extrema falta de cavalheirismo e, direi até, uma oportunidade falhada de acabar a noite no forrobodó com essa mesma mulher. E, no entanto, aquela besta anti-cavalheiresca diz uma coisa daquelas à pobre mulher que, de facto, era bastante anafada. A mulher — que ostentava até àquele momento uma expressão de felicidade — ficou com a desilusão estampada na sua cara. Deixou imediatamente de sorrir, e respondeu: “Pois… é a vida. Nem todas podem ser como a trinca-espinhas da sua esposa, senhor Antunes. Passar bem, e cumprimentos à família.” E seguiu o seu caminho, de cabeça baixa. Tive pena daquela mulher. Só me apeteceu espetar dois bananos no “senhor Antunes”, e estava quase a fazê-lo quando sinto um puxão no braço. Era o meu velhote que, sorridente, proferiu as seguintes palavras: “Eish! Viste aquela gorda? Aquela vai ter de caminhar durante anos para perder aquelas banhas todas! Ah, ah, ah!” Olhei para o meu velhote, lancei-lhe um ar fulminante e disse-lhe: “Anda, vamos lá rebentar com esses joelhos!” E lá continuamos na nossa vida…

(Ah, não se esqueça que hoje há festa da boa! Apareça, caro leitor! Diz que vai ter uma stripper que é igualzinha à Ana Malhoa! Vai ser a loucura! Apareça, que eu pago-lhe um copo! Ah, pois é. Esqueci-me de dizer onde fica o armazém, que cabeça a minha! Então, o armazém onde se vai realizar esta comemoração da centésima crónica do Mais Opinião, fica na Rua do Arm…)

Raios, acabou-se-me a bateria do portátil…

Até para a semana, malta catita…