De quem é a culpa dos incêndios?

Antes de começar, devo dizer – ou reforçar – que este é um artigo de opinião. E cada qual tem direito à sua. Pode não concordar com a minha, mas tem de a respeitar, como eu respeito a dos outros. Normalmente não seria necessário fazer esta nota, mas as reacções mais violentas que se lêem nas redes sociais obrigam a isso. Outro ponto prévio: deixem de falar em Portugal, Madeira e Açores. Madeira e Açores também é Portugal, logo, quanto muito, podem referir-se ao continente (ou, no limite, Portugal continental), Madeira e Açores.

De quem será então a culpa dos incêndios? A meu ver, há que repartir por muita gente.

Desde logo por quem anda a colocar fogo nas matas. São demasiados os indícios de fogo posto em grande parte dos incêndios que têm assolado o território nacional. Há, por exemplo, incêndios com ignição por volta das 3 da manhã, com condições nada favoráveis para isso e incêndios com inicio separados por poucos minutos e poucos quilómetros uns dos outros. A Policia Judiciária investigará e determinará se foi mão criminosa ou não a iniciar tais fogos. Contra estes não há prevenção possível pois, mesmo que ainda tivéssemos guardas florestais, conseguiríamos reduzir o espaço de manobra dos criminosos e diminuir o tempo de resposta das autoridades, mas não conseguiríamos ter um guarda em toda a floresta.
Depois dos proprietários que não limpam os seus terrenos e da população em geral que não pressiona as autoridades. Depois do incêndio é muito fácil dizer “eu sabia que isto qualquer dia ia acontecer”. Mas queixou-se às autoridades? Fez saber que o proprietário – mesmo que se não se saiba quem é – não limpou o terreno e que representa grande perigo para si e para os seus bens? Ou limitou-se a comentar isso no café? E o senhor proprietário, se não tem possibilidades financeiras para proceder à limpeza do que é seu, pediu ajuda?
Quantas vezes viu o carro da frente lançar uma beata pela janela do veiculo? Dessas, em quantas fez alguma coisa para se certificar que aquela beata não tinha provocado uma ignição na berma da estrada? Denunciou alguém?
Quando faz o seu churrasco ao ar livre, no parque de merendas ou no pinhal, antes de sair certifica-se sempre que ficou tudo bem apagado? Quando vê alguém a fazer uma queimada não supervisionada, reporta às autoridades?
Nas festas e romarias, está atento ao destino que os engenhos pirotécnicos (vulgo fogo de artificio) tomam? Alerta as autoridades quando suspeita que aquele “fogo” pode colocar em perigo pessoas ou bens ou simplesmente ignora? O ideal seria mesmo que não existisse fogo de artificio nestes meses mais perigosos.

Ninguém espera que cada um de nós tome as medidas preventivas e, durante os incêndios, as medidas necessárias para combatê-los – apesar de muitos particulares terem sido obrigados a ajudar – que cabem às autoridades. Mas podemos fazer o que está ao nosso alcance para prevenir. Limpar em redor das nossas casas, limpar os nossos terrenos, evitar fazer fogueiras e queimadas nos períodos mais perigosos e com condições meteorológicas propicias à ignição de incêndios. Para quem fuma, apagar o cigarro no cinzeiro e não jogar a beata pela janela do automóvel. Podemos também sensibilizar familiares, amigos e vizinhos para essa prevenção, fazendo-os entender  a sua extrema importância.

Bombeiros, GIPS (GNR) e outros militares, pilotos entre outros agentes do sistema nacional de protecção civil trabalham até à exaustão para proteger a nossa integridade física, a nossa vida e os nossos bens. Mas são humanos, como todos nós, que também ficam sem forças e necessitam de recuperar, para além de não terem (obviamente) a possibilidade de estar em vários locais em simultâneo. Daí que seja cada vez mais importante apostar na prevenção, para evitar a ocorrência de incêndios. Se não o fizermos, os meios de combate serão sempre escassos.

A comunicação social também devia repensar as imagens que mostra, pois àqueles que gostam de ver arder e que provocam incêndios, as imagens dos incêndios nos media são motivadoras para continuar a actividade criminosa. É a tal fronteira entre o que deve e não deve ser mostrado e/noticiado, como já falei noutra crónica.

Crónica de João Cerveira

Este autor escreve em português, logo não adoptou o novo (des)acordo ortográfico de 1990