Dia Internacional Contra a Homofobia

“A homofobia é a atitude de hostilidade para com os homossexuais. O termo parece ter sido utilizado pela primeira vez nos Estados Unidos, em 1971, mas foi somente no final dos anos 1990 que ele começou a figurar nos dicionários europeus. Embora o seu primeiro elemento seja a rejeição irracional ou mesmo o ódio em relação a gays e lésbicas, a homofobia não pode ser reduzida a isso. Assim como a xenofobia, o racismo ou o antissemitismo, ela é uma manifestação arbitrária que consiste em qualificar o outro como contrário, inferior ou anormal. Devido a sua diferença, esse outro é posto fora do universo comum dos humanos.” (Borrillo, 2001: 15)

“No cerne desse tratamento discriminatório, a homofobia tem um papel importante, dado que é uma forma de inferiorização, consequência direta da hierarquização das sexualidades, que confere à heterossexualidade um status superior e natural.” (Borrillo, 2001: 17)

Caro leitor, hoje é dia 17 de maio, e celebra-se o Dia Internacional Contra a Homofobia. A data foi escolhida por causa da exclusão da Homossexualidade da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID) da Organização Mundial de Saúde (OMS) a 17 de maio de 1990, oficialmente declarada em 1992.

– Olha aqueles dois a beijarem-se… Que nojo!

-E aquelas duas? Parecem mesmo lésbicas… Quem será a mulher e o homem na relação?

Sabia que estas duas frases ou semelhantes são recorrentes na nossa sociedade porque é difícil perceber que “a minha liberdade acaba onde começa a liberdade do outro”?

Por isso, hoje escolhi dar voz não à homofobia, mas sim a quem sofre com ela, seja de que forma for! Dentro de poucos segundos estará a dar personalidade às experiências, interrogações e certezas da Maria (27 anos) e da Raquel (22 anos), um casal homossexual na sociedade portuguesa! Por breves instantes, e enquanto seres humanos, vamo-nos pôr na pele deste casal de namoradas!

A comunidade LGBT

Quando conversei com a Maria e a Raquel ambas me disseram que o preconceito está no seio da comunidade. Estamos a falar de uma comunidade de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transsexuais.

Existe o preconceito entre o gay mais afeminado vs o gay mais discreto. Existe o preconceito entre as lésbicas femininas vs as lésbicas “machonas”. Existe muito o preconceito entre drag queens, travestis e transexuais.

“Uma coisa é ser gay. Outra coisa é ser bicha.”

A influência da religião

A Raquel fez uma parte do seu percurso escolar num colégio católico só para raparigas. E tal como ela, haviam outras raparigas lésbicas ou bissexuais. Contudo, não era algo bem visto aos olhos da comunidade onde estava inserida. Em testemunho real, a Raquel conta que as próprias professoras do colégio (pessoas com um nível académico superior) encaravam e referiam-se à homossexualidade como um vírus, algo contagioso. Daí que reprimissem ao máximo o assunto. E muitas vezes nas missas, as raparigas lésbicas ou bissexuais eram sentadas no banco da frente da igreja, para receberem melhor os ensinamentos divinos e “se libertarem daquele mal”.

A influência da família

Quando nos deparamos com este tópico, caro leitor, diríamos que a família apoiará sempre um filho, certo? Afinal, faça as escolhas que fizer será sempre família. Mas não é assim! Temos que colocar os pés na realidade! A família muitas vezes é a primeira a tentar esconder o assunto; a tentar que o/a filho/a experimentem o lado oposto àquele pelo qual se sentem atraídas/os. Tudo isto motivado por aquilo que os outros possam pensar. Geralmente são pessoas muito preocupadas com a imagem que vai passar para as pessoas mais próximas. Sejam outros familiares ou amigos de família.

E, neste aspeto, a Raquel e a Maria não tiveram histórias nada felizes. Ambas sofreram com a rejeição, a tentativa de mudança, as interrogações constantes, o abandono, a obrigação de fazer escolhas.

O bullying

Entramos num tópico muito delicado, mas que espelha uma realidade muito vincada quando falamos da homofobia.

A Maria foi uma pessoa que sofreu muito por causa da sua orientação sexual. Quando andava na escola, e tinha educação física, as colegas não a deixavam tomar banho com elas porque não queriam que visse os seus corpos. Reportou, também, que outra vez foi chamada no final de uma aula pela professora que lhe disse que os seus comportamentos eram inapropriados e que isso se podia refletir na sua nota final. De imediato, a Raquel não percebeu que comportamentos eram esses, e a professora explicou-lhe que não era normal ter uma relação com uma rapariga e que isso havia de ser discutido em conselho de turma.

A sociedade

Claramente vivemos numa sociedade que apregoa a igualdade; apregoa a integração; apregoa a livre escolha. Ficamo-nos pelas palavras? Se fosse caso disso seriamos a sociedade ideal. Contudo, as atitudes ficam muito aquém. E muitas vezes as palavras proferidas são mesmo a pior arma.

Enquanto namoradas, a Maria e a Raquel, já viveram de tudo um pouco no que diz respeito à sociedade. Desde olhares fixos, de tentativas de agressão, a comentários inapropriados. Contaram-me que já lhes perguntaram, “como é que ela te converteu?”. Já lhes disseram, também, que era apenas uma fase.

Mas ao serem duas pessoas bastante determinadas, a Maria contou que muitas vezes a sua sexualidade é questionada por pessoas heterossexuais. Quando isso acontece, faz as perguntas inversas: “Quando descobriste que eras hétero como foi?” ou “O que faz de ti o homem da relação? É porque ela limpa e tu despejas o lixo?”.

Tanto uma como outra defendem que a homofobia é apenas o resultado do desconhecimento daquilo que foge ao padrão. E muitas vezes associa-se ao medo dessa incógnita.

A mensagem principal a retirar, caro leitor, é que a sexualidade não é uma escolha que se faz, mas sim uma questão de sentimentos! E dentro desse prisma, que sentido faz a homofobia? Não temos o direito de amar e viver com quem quisermos? No fundo, a Maria e a Raquel só pedem o mesmo que eu: serem felizes! Mas a normalidade está longe e a aceitação plena também…  Haverá sempre alguém…

“Como um atributo da personalidade, a homossexualidade deve permanecer fora do interesse interventor das instituições. Tal como a cor da pele, a opção religiosa ou a origem étnica, ela deve ser considerada um dado não pertinente na construção política do cidadão e na qualificação do sujeito de direitos.” (Borrillo, 2001: 16)

Deixo aqui a informação que vai decorrer no próximo dia 23 de junho a “Arraial Lisboa Pride 2018” que “é o maior evento LGBTI em Portugal e desde 1997 traz visibilidade à população lésbica, gay, bissexual, trans e intersexo, numa celebração de orgulho na igualdade que decorre na principal praça da cidade de Lisboa – o Terreiro do Paço.” A entrada é gratuita!