Dia Mundial da Diabetes – Uma doce catástrofe

 

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O facto de haver uma data, um dia dedicado a uma doença, mostra que a mesma tem um impacto forte na sociedade. E o impacto da Diabetes Mellitus (ou diabetes) é de tal ordem grande, que até já é considerada uma das epidemias do século XXI. A celebração do Dia Mundial da Diabetes (dia 14 de Novembro) tem como finalidade chamar a atenção sobretudo da população para a problemática desta doença e para a necessidade de prevenção, especialmente da diabetes mellitus tipo II.

A Diabetes é uma doença crónica que não tem cura, que implica tratamento, vigilância diária, consultas e exames frequentes, internamentos mas, acima de tudo, que pode implicar a diminuição da qualidade de vida pelas complicações invalidantes que pode originar a longo prazo (amputações, feridas, ataques cardíacos, diálise, cegueira, entre outros).

Existem vários tipos de diabetes, sendo as mais frequentes a tipo I, a tipo II e a Gestacional (que surge na gravidez). Pelo facto da Diabetes Mellitus tipo II estar muito relacionada com os estilos de vida e ser possível de prevenir, será a esta que dedicarei mais atenção neste artigo.

Apesar de se tratar de uma doença crónica, é possível que quem tenha sido diagnosticado com diabetes tenha uma vida completamente normal, apenas com alguns cuidados acrescidos. Vamos primeiro perceber o que é a diabetes para depois compreender melhor o tratamento associado.

O que é a Diabetes Mellitus?

Da mesma maneira que um carro utiliza gasolina ou gasóleo como fonte de energia, as células do organismo utilizam glicose (açúcar). Mas, para que a glicose chegue às células, precisam de um “transportador” especial – a insulina.

O que acontece na diabetes é que a insulina produzida pelo pâncreas ou não é suficiente ou não consegue ser utilizada pelo organismo e por isso fica acumulada em excesso no sangue, chamando-se a este fenómeno hiperglicemia.

Na Diabetes tipo I, que tem normalmente início em idades jovens, por alguma razão, algumas células do pâncreas morrem e por isso não há produção de insulina, daí este tipo de diabetes ser muitas vezes designado por insulinodependente.

Na Diabetes tipo II, de longe a mais frequente, fatores como sedentarismo/pouca atividade física, obesidade e má alimentação fazem com que haja aumento da massa corporal, e que a insulina produzida seja insuficiente para tantas células. No início, o pâncreas ainda consegue compensar mas depois acaba por entrar em “exaustão” e não conseguir produzir as quantidades necessárias.

Com o aumento dos níveis de açúcar, os rins tentam eliminar esse excesso e daqui surgem dois dos sintomas típicos da diabetes: urinar com muita frequência e sede excessiva (porque se perde muitos líquidos pela urina). Para além disso, pode também existir fome fora do normal e ainda cansaço fácil, porque as células não têm “combustível” – glicose. Quando o organismo não tem açúcar para produzir energia, acaba por desenvolver um mecanismo que utiliza as gorduras como energia. Por esta razão, um dos sintomas pode ser também perda de peso.

Estão em risco acrescido de desenvolver diabetes tipo II pessoas que: tenham familiares com diabetes, tenham excesso de peso, tenham uma vida sedentária, sejam hipertensas e/ou tenham níveis elevados de colesterol, triglicéridos e ácido úrico no sangue, assim como mulheres que tenham tido diabetes durante a gravidez.

Complicações

O tratamento da diabetes tem como objetivo manter a glicose no sangue (glicemia) em níveis estáveis e normais, ou seja, entre os 70mg/dl a 126mg/dl em jejum, e entre os 70mg/dl e os 140mg/dl duas horas após as refeições. As complicações surgem a curto e a longo prazo quando não se consegue manter a glicemia nestes níveis.

As complicações a curto prazo ocorrem quando há picos de glicemia: hipoglicemia (valores muito baixos de glicemia, abaixo dos 60mg/dl, sensivelmente) ou hiperglicemia (valores muito altos de glicemia).

A hiperglicemia é a “definição” de diabetes (há excesso de açúcar no sangue). No entanto, em certas alturas (por falta de exercício, refeição com excesso de hidratos de carbono, stress, algumas doenças) a glicemia pode aumentar ainda mais e provocar sede excessiva, boca seca, visão turva, comichão (especialmente nos genitais). Nesta situação, é aconselhável que a pessoa com diabetes aumente a ingestão de água (para ajudar a eliminar o excesso de glicose).

A hipoglicemia é a mais perigosa, porque o cérebro não tem glicose para transformar em energia. Pode acontecer por toma em excesso de insulina ou de antidiabéticos orais, saltar refeições ou estar muito tempo sem comer ou excesso de exercício físico. Em situações de hipoglicemia, deve-se tomar açúcar puro (nada de chocolates ou bolos) e, quando recuperar (5 a 10 minutos), deve-se fazer uma refeição ligeira que inclua hidratos de carbono (“farináceos”). Se a hipoglicemia não for corrigida rapidamente, pode levar a pessoa ao coma.

As complicações a longo prazo apenas surgem se os valores de glicemia se mantiverem durante muito tempo elevados, porque a glicose vai “entupindo” os vasos sanguíneos e os nervos periféricos, que, estando lesionados, acabam por afetar os rins, o cérebro, o coração, os pés e os olhos.

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Os vasos sanguíneos atingidos vão espessar e vai ser mais difícil para o sangue circular, o que coloca a pessoa em risco de sofrer hipertensão, acidente vascular cerebral, tromboses, enfarte do miocárdio (ataques cardíacos) e gangrena (que pode levar à amputação das pernas). Quando os vasos sanguíneos dos olhos são afetados, surge retinopatia diabética, glaucoma (aumento da pressão dentro dos olhos) e cataratas (que tornam a visão baça), podendo até levar à cegueira. Quando os vasos sanguíneos dos rins são afetados (nefropatia), surge a insuficiência renal crónica, que pode terminar em hemodiálise. Para além disto, quando os vasos sanguíneos são lesados, surge a “famosa” dificuldade de cicatrização, porque o sangue não consegue chegar a ferida para fornecer nutrientes e oxigénio.

Quanto às lesões nos nervos (neuropatias) há alterações na sensibilidade ao nível de alguns órgãos como os órgãos sexuais, a bexiga, os intestinos, os pés. Assim, pode surgir disfunção sexual, incapacidade para detetar dor e alterações de temperatura (sobretudo nos pés), formigueiros, dor constante, incontinência urinária e fecal, entre outras.

É extremamente importante que as pessoas com diabetes, especialmente as que já estão num estado avançado, vigiem diariamente os pés. Como quando há diminuição da sensibilidade à dor e à temperatura, podem acontecer algumas lesões nos pés sem que os doentes se apercebam (por exemplos, pedras nos sapatos). Se os pés não forem vigiados, as feridas podem aumentar e ficar muito complicadas, até porque também pode já haver dificuldade na cicatrização.

É muito importante que as pessoas com diabetes diariamente: vigiem, lavem e sequem muito bem os pés, especialmente entre os dedos; hidratem os pés (mas não coloquem hidratante nos dedos); cortem as unhas a direito e não rentes; não façam caminhadas com calçado novo nem andem descalços e não utilizem calicidas. Periodicamente, consultem profissionais de saúde, como os podologistas, para uma melhor vigilância.

Estas lesões só aparecem quando os níveis de açúcar se mantêm muito altos durante muito tempo, e isso demonstra que é muito importante seguir corretamente o tratamento para evitar estas complicações que podem deixar a pessoa com grandes incapacidades (feridas, amputações, ataques cardíacos,…). É por isto também que, de três em três ou de quatro em quatro meses as pessoas com diabetes têm uma consulta com o médico assistente.

Tratamento e prevenção

Estando explicado o que é a diabetes, consegue-se facilmente perceber porque é que o tratamento assenta em três pilares, que são medicação, alimentação e exercício físico. Para controlar a glicemia, só a medicação não é suficiente: é necessário diminuir a glicose que se ingere e gastar o excesso, daí ser necessário complementar com cuidados alimentares e exercício físico.

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Bem vistas as coisas, o tratamento da diabetes, que também serve para prevenção, representa, basicamente, a adoção de um estilo de vida saudável, aquilo que todos nós deveríamos diariamente fazer para sermos saudáveis.

Quanto à medicação, deve cumprir aquilo que o médico lhe receitou. Normalmente os diabéticos tipo 1 têm que fazer insulina e aos diabéticos tipo 2 é receitado um antidiabético oral e/ou insulina. Não deixe de tomar a medicação espontaneamente sem aviso e consentimento do médico (a menos que esteja incapaz de comer).

 Em termos de alimentação, embora o ideal seja consultar um nutricionista para adaptar o “regime” alimentar ao seu dia-a-dia (trabalho, exercício, medicação,..), no geral, as regras a seguir são: fazer cerca de seis refeições diárias; não ficar mais de três horas sem comer nem saltar refeições (para evitar hipoglicemias e manter os níveis de insulina estáveis); ingerir cerca de 1,5 de água/chá por dia; evitar fritos, bolos e aumentar a ingestão de legumes; ao almoço e ao jantar comer arroz ou batata ou massa ou pão (estes são alimentos ricos em hidratos de carbono que contribuem muito para o aumento da glicemia, apesar de não serem doces); preferir alimentos integrais; se comer fruta ao lanche, acompanhar sempre com uma porção de “farináceos” (hidratos de carbono).

Relativamente, ao exercício físico, o mínimo recomendado, não só diabéticos mas para a população em geral, são 30 a 45 minutos de marcha vigorosa em terreno plano, na maioria dos dias da semana.

A estas medidas, é ainda necessário acrescentar outras atitudes como: perder o peso em excesso, deixar de fumar, diminuir os níveis de colesterol/triglicerídeos e ácido úrico e controlar a hipertensão.

Para que haja sucesso no tratamento há ainda mais dois pilares a considerar: conhecimento sobre a doença e autovigilância. É muito importante que, especialmente as pessoas com diabetes, conheçam bem a doença e dominem a autovigilância, para que consigam fazer corretamente, todos os dias, a gestão da sua vida, colaborando assim com os profissionais de saúde, para obter os melhores resultados possíveis e, sobretudo, para ter níveis máximos de qualidade de vida. Por isso, qualquer dúvida que tenha, não hesite em esclarecê-la com profissionais de saúde.

Volto a frisar: apesar de não ter cura e de o tratamento ser para toda a vida, a pessoa a quem foi diagnosticada diabetes, pode ter uma vida perfeitamente normal, apenas precisa de adotar um estilo de vida saudável. Se é diabético, incentive os seus familiares mais próximos a aderirem também. Assim, não só será mais fácil para si esta mudança, como também será possível para eles evitar esta doce catástrofe.