Era uma vez no cinema: Carol

         Depois de uma pausa de oito anos na sua carreira, o realizador Todd Haynes regressa ao activo com este “Carol”, naquela que é a sua primeira adaptação cinematográfica de um livro. “Carol” desde bem cedo começou a gerar altas expectativas, a encabeçar aquelas listas que aparecem em meados de Abril e Maio com os favoritos aos Óscares do ano seguinte e a ser muito bem recebido nos principais festivais de cinema. Com o passar dos meses, o filme de Haynes começou a perder força para outras obras, como  “The Revenant” de Alejandro Iñarritu e “Spotlight” de Thomas McCarthy, acabando mesmo por ficar de fora do lote de filmes nomeados para a categoria de Melhor Filme.

       Baseado na obra literária de Patricia Highsmith, “Carol” retrata o romance de Carol e Theresse. A primeira é uma mulher de meia-idade, mãe de uma filha e a passar por uma enorme crise no seu casamento, enquanto que Theresse é uma jovem mulher insegura, ainda em busca do seu caminho. Quando as duas se encontram, o amor entre elas nasce e à medida que o relacionamento cresce, as consequências de uma relação  homossexual nos anos 50 começam a fazer sentir-se na vida de ambas.

       Nos últimos anos, os romances homossexuais começaram a ter maior espaço no mundo cinematográfico, onde se destacam obras de grande qualidade como “Brokeback Mountain” e mais recentemente o filme francês “La vie d’Adèle”, um patamar de excelência que “Carol” não consegue atingir. Ao contrário dos filmes que referi, onde a acção decorre neste século, em “Carol” a trama desenrola-se nos anos 50, época em que a discriminação e o preconceito em volta da homossexualidade eram naturalmente muito maiores do que na actualidade. A diferença temporal não é a única coisa que afasta “Carol” dessas duas obras, “Carol” é uma experiência bem mais sensitiva que, expressa as suas emoções e sentimenos essencialmente através de gestos, olhares e suspiros, deixando as palavras para um segundo plano. Se isto é algo positivo? Depende muito da forma como cada um se deixa levar pela história e já li bastantes críticas que elogiavam o tão tocante e puro era relacionamento das duas, mas no meu caso não funcionou. Embora as cenas em que as duas contracenam juntas sejam guiadas com subtileza, o romance entre estas é um tanto distante e frio, algo que num romance é fatal quando fazemos uma avaliação final. Para além da abordagem às dificuldades de manter um relacionamento homossexual nos anos 50, “Carol” foca-se também nos problemas e desigualdades vividas pelo sexo feminino numa sociedade profundamente machista. Ao nível técnico, “Carol” é extremamente rico. Desde a fotografia, banda sonora e guarda-roupa, tudo ajuda a que seja criado um ambiente de época bastante fidedigno e detalhado, por isso não é de estranhar que algumas das nomeações aos Óscares que “Carol” obteve fossem nestas categorias.

       O brilho maior de “Carol” é claramente o seu duo de protagonistas. Cate Blanchett e Rooney Mara brinda-nos com duas perfomances brilhantes que, obviamente foram reconhecidas pela Academia, nomeando ambas para as categorias de representação. Cate Blanchett, muito provavelmente a melhor actriz da actualidade, para além de todo o talento que emprega na personagem, acrescenta-lhe uma grande dose de classe e beleza, naquela que é uma das suas melhores perfomances da carreira. Voltando agora as atenções para Rooney Mara, esta é um das actrizes mais dotadas da nova geração e a sua ascensão é mais que natural, sendo cada vez mais frequente ver o seu nome associado a grandes projectos, realizadores e papéis. Em “Carol”, esta imprime a dose certa de fragilidade, inocência e insegurança que uma personagem como Theresse necessitava.

       Perante as expectativas criadas em torno do filme, não há como não sentir um pouco de frustação, embora verdade seja dita, “Carol” está muito longe de ser um mau filme. É uma obra de requinte, delicada e com duas actrizes de topo mundial, mas que peca por nunca conseguir arrebatar o público para o romance que encabeça a história, algo imperdoável num drama deste género.