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Era uma vez no cinema: The Lobster

       Passando quase despercebido pelos cinemas portugueses, tal como muitos outros filmes europeus, “The Lobster” apresenta-se desde já como uma das obras mais originais que estreou nos nossos cinemas em 2016. Este mais recente trabalho de Giorgos Lanthimos, realizador grego que ganhou notoriedade com “Kynodontas” (filme que esteve nomeado ao Óscar de Melhor Filme Estrangeiro e venceu o Un Certain Regar no Festival de Cannes 2009), estreia-se em grande estilo nos filmes de língua inglesa. Num país que, infelizmente, tem sido notícia nos últimos anos pelas piores razões, Lanthimos é um dos exemplos da forte influência que a Grécia ainda tem a nível cultural.

       A história decorre num futuro indeterminado, onde os solteiros são proibidos por lei, e como consequência disso são fechados num hotel durante 45 dias com o propósito de encontrar uma parceira. Se não o conseguirem nesse prazo de tempo, estes serão transformados num animal à sua escolha. É nesta situação que se encontra David, um homem recentemente viúvo, que tem 45 dias para evitar que o transformem numa lagosta.

       Até que ponto podemos mecanizar e racionalizar algo tão irracional e genuíno como o amor? No fundo, esta é a premissa que guia “The Lobster”. O realizador grego Yorgos Lanthimos, com um óptimo uso da metáfora e hipérbole, cria um mundo utópico onde relações são orquestradas como questões robóticas, em que o puro e o espontâneo estão desconectados dos sentimentos. Uma visão perturbante, negra e insana dos relacionamentos do futuro. Como já deve ter entendido enquanto lê a crítica, “The Lobster” está longe de ser enquadrado naquele lote de filmes considerados “normais”. Aliás, esse é um dos factores que tem afastado tanto público dele, quer pela sua estrutura ou enredo pouco usual, “The Lobster” não é um filme fácil nem feito para as grandes massas, algo que tanto pode ser visto como um factor positivo como negativo (na minha opinião é positivo). Um nota de destaque também para a grande banda sonora que acompanha “The Lobster”, da autoria de Dmitri Shostakovish e com performance da Emerson String Quartet, que abrilhanta ainda mais a produção do filme de Lanthimos. É verdade que existem alguns problemas de ritmo, essencialmente na segunda parte do filme, que está uns furos abaixo da primeira metade, mas isso perde relevância quando estamos perante cenas tão bem produzidas, com múltiplos significados e interpretações, de uma inteligência cada vez menos comum no cinema extremamente comercial que nos inundou. A originalidade e irreverência de “The Lobster” fazem com que os seus defeitos sejam quase esquecidos, pois cinema deste tipo deve ser alvo de aplausos.

       No que diz respeito à representação, o elenco é composto por algumas das caras mais conhecidas do cinema actual, como Colin Farrell, Rachel Weisz, Léa Seydoux, Ben Whishaw e John C. Reilly. Na pele do protagonista, Colin Farrell não esconde as suas debilidades como actor, embora a sua performance não seja propriamente má, fica bem patente que outro actor mais talentoso teria dado uma maior complexidade à personagem. Os restantes membros do elenco cumprem o seu papel sem grandes problemas.

       “The Lobster” até pode passar ao lado de muitas pessoas, mas para quem já viu, certamente não ficou indiferente ao atrevimento da obra de Yorgos Lanthimos. Vencedor do Prémio Especial do Júri no Festival de Cannes 2015, “The Lobster” é uma autêntica lufada de ar fresco vinda do cinema europeu.

7.5/10