Especial Óscares 2018 – Previsões

Está a chegar mais uma edição dos Óscares e, como tal, o Ideias e Opiniões regressa com as suas previsões para a grande noite. Não vamos analisar os vestidos nem os fatos, e muito menos quantas trocas de envelope haverá nesta edição, mas esperamos com afinco que haja espectáculo e rigor, com muita atenção ao detalhe. A Academia tem surpreendido nos últimos anos com algumas decisões bastantes inesperadas e refrescantes para a atribuição das estatuetas, e isso tem de ser levado em conta no contexto em que vivem os Estados Unidos da América. Poderá a academia mostrar uma visão politica ou humanística? Certamente, sobretudo se passar uma mensagem clara, como foi o caso de O Caso Spotlight e Moonlight, respectivamente.

Este ano há uma grande diversidade de filmes e de histórias, e algumas surpreendentes omissões, mas o grupo de nomeados é uma espiral de qualidade bem característica, e para todos os gostos. Chama-me Pelo Teu Nome é uma história de amor para consciencializar um mundo ainda tão homofóbico, pensando num futuro de uma só igualdade, Dunkirk e A Hora Mais Negra são uma análise politica e bélica do passado que, curiosamente, se toca historicamente como se estivesse tudo combinado entre realizadores.  Foge (“Get Out”) é uma surpresa que ostenta a mensagem subliminar, num clássico de terror que perturba mais, do que assusta. Lady Bird é o drama adolescente de trama banal, mas que suscita boas interpretações por parte das suas actrizes. Linha Fantasma é uma espécie de A Bela e o Monstro num drama real e bem executado com o regresso de Daniel Day-Lewis, que brilha em tudo o que faz, mesmo que a sua assiduidade em filmes seja péssima. The Post debruça-se sobre a liberdade de imprensa, um tema tão actual na sociedade americana hoje, como no pré-Watergate. A Forma da Água é uma maravilha cinematográfica de Guillermo Del Toro, que apenas peca pela história mais que vista. Três Cartazes à Beira da Estrada é um filme que insiste em passar a fronteira entre o drama e a leve comédia negra, e é nessa procura de identidade que reflecte a sua principal mestria.

No meio de tanta qualidade, a que os Óscares já nos habituaram, é de esperar uma academia imprevisível. Alguns filmes serão arrasados, outros triunfaram, está na hora de fazermos a previsões anuais para algumas das mais importantes características…

Melhor Realizador

A escolha: Guillermo Del Toro, A Forma da Água

Este ano bem que poderíamos ter Denis Villeneuve outra vez na corrida, no entanto a Academia não deu a devida importância ao seu contributo para Blade Runner 2049. Não é escolha fácil, mas mesmo assim é possível que a realização característica de Guillermo Del Toro leve a melhor. A Forma da Água pode não ultrapassar fronteiras pela sua história, contudo encanta pela atenção ao detalhe num mundo intemporal, mesmo que de alguma forma contextualizado pela Guerra Fria, ao gosto de um dos realizadores mais originais da nossa época. Com os seus altos (O Labirinto do Fauno), e os seus baixos (Crimson Peak: A Colina Vermelha), esta é mais uma oportunidade para o realizador mexicano.

No entanto, é seguido de perto por Christopher Nolan, realizador de Dunkirk, que embora com pouco conteúdo, tem uma cinematografia brilhante e irrepreensível. Entre o histórico e o intemporal lovecraftiano a Academia tem, sem dúvida, muito que ponderar, mas a aposta do Ideias recai no realizador mexicano que transporta a história banal para um nível aquático, e prova que nem sempre é mau “meter água”. No meio das banalidades, Del Toro escreve e executa um filme que toca o coração e esse é, talvez, o maior testemunho, obstante de qualquer critica que possa ser feita noutras dimensões da fita.

Melhor Fotografia/Cinematografia

A escolha: Roger Deakins, Blade Runner 2049

Alguns chamam-lhe fotografia, outros cinematografia. A última parece ser a mais ilustrativa do que realmente premeia esta estatueta. Dunkirk surge novamente como principal candidato, mas há um ligeiro underdog que não pode ser subestimado, até porque conta com a assinatura do catorze vezes nomeado (duas delas no mesmo ano em 2008!), mas nunca vencedor, Roger Deakins. Não é a sua primeira contribuição para Denis Villeneuve, mas parece ser este o derradeiro contributo para a Sétima Arte. Poderá o leitor criticar o filme pelo seu distanciamento global do original, mas é inegável que a cinematografia contribui para um pormenor essencial tão difícil de replicar, está perto o suficiente do original para ser reconhecível, e está longe suficiente para ser único. Esse equilíbrio no fio da navalha, é o balanço necessário e o testemunho que vale o prémio.  Blade Runner 2049 é um monstro em termos de cinematografia, que Dunkirk não atinge com realismo. E melhor do que idealizar a realidade, só idealizando um mundo ficcional que tem tanto de passado como de futuro! As cartas estão lançadas, mas o universo inspirado de Philip K. Dick, assume proporções visuais e novas abordagens que certamente não escaparão à Academia.

Melhor Actriz Principal

A escolha: Frances McDormand, Três Cartazes à Beira da Estrada

Nunca é fácil premiar um actor ou actriz individualmente. Este ano há um combate de titãs que junta veteranas e mais ou menos recém-chegadas. Receio que já não haveria Óscares sem a nomeação da melhor actriz do nosso tempo, Meryl Streep, que mais uma vez interpreta na perfeição um papel ambicioso.  Na indecisão que mais destaca a sua personagem, Kay Graham em The Post surgem todo um conjunto de facetas humanas que certamente podem valer-lhe a estatueta. No entanto, de um filme tão indeciso consigo próprio parece surgir a verdadeira rainha dos Óscares…

Frances McDormand e a sua luta para encontrar o homicida da sua filha e punir as forças policiais pela falta de acção é a premissa fantástica de Três Cartazes à Beira da Estrada, que tinha todos os motivos para falhar. No meio do drama com apontamentos leves de comédia negra McDormand dá tudo o que uma actriz pode oferecer, numa performance humana, e natural, mesmo que com um ligeiro misto de loucura. Mildred é badass, e de um certo ponto de vista, é também uma personagem que oscila na nossa consciência entre o justificado e o injustificado, e esse balanço contribui para uma actuação de uma vida. A aposta do Ideias recai certamente na actriz que ganhou o seu primeiro e único óscar há 11 anos, com Fargo.

Destaque ainda para Margot Robbie em Eu, Tonya, e Saoirse Ronan, em Lady Bird que não ficam muito atrás, e tem excelentes ou boas hipóteses de ganhar. Mas é difícil concorrer com os dois titãs já apresentados.

Melhor Actor Principal

A escolha: Gary Oldman, como Winston Churchill em A Hora Mais Negra

Todas as actuações nomeadas para os Óscares têm algo que as destaca, mas só há um actor com capacidade camaleónicas tais para se tornar irreconhecível a cada investida na Sétima Arte. O Winston Churchill de Gary Oldman, em A Hora Mais Negra, não é apenas o trabalho de um maquilhador tirado da reforma, Kazuhiro Tsuji, que não punha os pés na indústria americana desde 2012, é um trabalho de actor completado por toda uma outra equipa, que começa no argumento, passa certamente por um processo de transformação prostética, mas que no fim do túnel depende do actor e da performance do mesmo. Poderão certamente tirar-lhe pontos pela ajuda de Tsuji, mas é injusto não analisarmos o realismo que Oldman entrega à personagem. Imitar tal individualidade do século XX, absorver todos os tiques e maneirismos, actuar sem parecer um actor vestido dentro de um fato, e acima de tudo, acentuar o factor velhice sem que isso seja forçado e pouco natural, são tudo dimensões que caracterizam a sua actuação e expandem a lenda que é Gary Oldman. É esta a magia do cinema!

No entanto, a concorrência conta com um dos mais dotados actores do nosso tempo, Daniel Day-Lewis. O seu papel em Linha Fantasma não é o melhor da sua carreira, mas seria certamente bem premiado. É outro dos principais candidatos, e provavelmente aquele que mais se aproxima de Oldman na chegada à linha da meta.

Melhor Actor Secundário

A escolha: Sam Rockwell, como Dixon em Três Cartazes à Beira da Estrada

Dixon é a personagem que mais suscita emoções controversas em Três Cartazes à Beira da Estrada. Odiamo-lo no início, abominamos a relação horrível que tem com a mãe, tecemos criticas à sua acções até mais de meio do filme, mas subitamente, algo muda! E de certa forma, a audiência compadece-se, sem nunca esquecer o cargo dos trabalhos que causou durante todo o filme. A personagem chama a si todos os males da polícia norte-americana, e mesmo assim a história catapulta-o para uma meia redenção, que serve a carapuça e a critica. Todo este misto de emoções só é possível através de uma actuação fantástica de Sam Rockwell, que se arrisca a ganhar o óscar nesta sua primeira nomeação.

No outro lado do espectro está o atencioso personagem de Richard Jenkins, Giles, em A Forma da Água, e Christopher Plummer, na sua abordagem a J. Paul Getty. Concorrência de peso que certamente trará uma visão equilibrada à Academia. A imprevisibilidade da mesma o dirá…

Melhor Actriz Secundária

A escolha: Allison Janney, como LaVona em Eu, Tonya

Disfunção maternal em forma de bullying e um misto de loucura e ambição juntam-se na interpretação de Allison Janney, como LaVona, a mãe da polémica skater campeã Tonya Harding. Há certamente outro bom trabalho de maquilhadores, mas isso, assim como com Gary Oldman, não desvaloriza o tremendo trabalho da actriz em fazer passar a realidade desta figura maternal demente. Como todo o filme, esta é uma interpretação que não deixa ninguém indiferente, e parece a favorita para atribuição do óscar. É talvez o maior reconhecimento de Eu, Tonya como peça singular, que se posiciona entre a comédia e o drama, às vezes na baliza de indecisões entre o riso e o choro.

Na concorrência destaca-se principalmente Laurie Metcalf, como Marion McPherson em Lady Bird, um papel muito mais naturalista, como todo o filme, que vive de banalidades bem representadas. No equilíbrio entre dois papeis reais, é possível que ganhe a abordagem mais mirabolante, e a vida real bem que parece mais interessante em Eu, Tonya.

Melhor Filme

A escolha: The Post

A Academia já nos habituou a esperar o inesperado. Se referi no início desta crónica que a estatueta tem sido entregue a filmes com mensagens claras que criticam a sociedade americana, ou que realçam um tema particularmente pertinente, podemos dizer que este ano não há forma mais directa para expressar um posição do que nomear The Post para Melhor Filme. Porquê? Porque é um lembrete bastante pertinente sobre a liberdade de imprensa, que certamente servirá para criticar a presidência de Donald Trump, e a sua aversão a jornalistas. É assustador ouvir os telefonemas do Presidente Nixon e fazer o paralelo com a realidade americana de Trump. No entanto, não é só uma questão política que moverá esta escolha. As interpretações de Tom Hanks e, principalmente, de Meryl Streep, são como já é habitual sublimes. Acresce a realização do enorme Steven Spielberg, o que torna o filme numa reunião da “Santíssima Trindade”, expressão baptizada pelo The Guardian referindo-se a este triângulo de vedetas. No entanto, The Post tem concorrência de peso, especialmente, com Três Cartazes à Beira da Estrada, que lidera as apostas, e é certamente o vencedor se a Academia optar pelo filme pitoresco de Martin McDonagh. Será The Post outro O Caso Spotlight? É bem possível!

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Ainda como menção honrosa apostamos em Logan para melhor argumento adaptado, e em Três Cartazes à Beira da Estrada para melhor argumento original. Para melhor filme de animação parece que Coco tens as melhores possibilidades. Por fim, para melhor banda sonora, a nossa escolha recai em A Forma da Água, e para melhor música original This Is Me, de O Grande Showman.

Como todos os anos, as nossas apostas têm-se traduzido em várias boas suposições e outras tantas que são um fracasso. Embora escreva no colectivo o leitor deve desde já saber que as falhas são exclusivamente minhas, Luís Antunes, este que assina muitas das crónicas de cinema. Em 2015, acertámos 6 das 9 categorias propostas. Em 2016,  arriscámos a cabeça de dois cronistas (juntou-se Fábio Valentim), com 6 categorias, acertamos sensivelmente 4, embora nem sempre em voz unânime. Por fim, em 2017, das 7 categorias propostas, acertámos duas, D-U-A-S, imagine-se!

Com prémios que se adivinham sempre bem entregues, é de esperar uma marcação mais cerrada aos envelopes, para que não aconteçam acidentes de percurso, falamos de um em particular que manchou de forma hilariante a edição passada. Será certamente tema para ser explorado pelo anfitrião Jimmy Kimmel, e sabemos que não lhe escapa nada. Sendo esta a edição noventa, é também uma oportunidade para olhar para o passado, e começar a planear o futuro, pois o centenário aproxima-se! Até lá, votos de boas sessões de cinema, e uma saudação aos corajosos que estarão até às 5 da manhã a ver a cerimónia, mesmo que trabalhem no dia seguinte!