“Esquerda dividida = direita fortalecida” – Nuno Araújo

O Partido LIVRE deu o seu “pontapé de saída” para a campanha das eleições para o Parlamento Europeu, sendo que estas têm data marcada para 25 de Maio. O Movimento 3D (M3D), que inclui Carvalho da Silva (ex-líder CGTP e ex-militante PCP) e Daniel Oliveira, colunista do Expresso e ex-dirigente do Bloco de Esquerda (BE), também pretende elaborar uma lista para o mesmo acto eleitoral. O que terão em comum estes dois movimentos?

Estes dois movimentos anunciam-se como sendo movimentos dissidentes de alguns sectores da esquerda. Ora, o Partido LIVRE é encabeçado pelo ainda eurodeputado Rui Tavares, eleito em 2009 então como independente na lista do BE. Se o LIVRE existe, parece devê-lo a uma “extensão da personalidade” de Rui Tavares, até porque do pouco que se conhece desse novo partido, só se sabe que é liderado (mesmo desde antes da própria formação do partido!), por Tavares, ele próprio.

O Movimento 3D é um movimento de intenções ainda não firmadas. Dado que somente partidos políticos poderão concorrer às eleições de 25 de Maio, este movimento teria de se imiscuir numa lista de um partido político já existente, ou por formar, de modo a poder participar no processo eleitoral para o Parlamento Europeu; Daniel Oliveira, que já tinha saído do BE por divergências várias, e Carvalho da Silva já afastado “dos holofotes mediáticos”, não serão bons mediadores de negociações com o BE, embora possam ser bons interlocutores de uma parte de cidadãos “crentes” em políticas de esquerda, mas não totalmente representados pelos partidos existentes. Talvez mesmo por este facto, das negociações tidas pelo M3D com o BE não resultaram na formação de uma lista conjunta para concorrer às eleições. Um outro factor, talvez mais determinante para o desfecho dessas negociações, tenha tido a ver com as imensas dificuldades do BE, nos próximos anos, em atingir percentagens altas como as eleições europeias de 2009, em que superou os 10% e obteve três lugares no hemiciclo de Estrasburgo. O BE parece estar internamente dividido…e daí não deverá progredir para uma “coexistência pacífica”, finda que está a “guerra fria” das tendências existentes dentro do BE. O aparente sectarismo do dirigismo bloquista é apenas uma forma de defesa perante a debilidade dessa liderança. O próprio João Semedo já assumiu que 2014 é o ano da disputa da liderança dentro do próprio BE.

Um outro factor em comum entre o Partido LIVRE e o Movimento 3D tem a ver com o facto de ambos dividirem a esquerda. Essa é a sua grande intenção, pois perceberam que podem obter dividendos advindos do actual processo de implosão do BE. A actual liderança bicéfala bloquista percebeu que não pode associar-se aos movimentos que poderão mesmo roubar o espaço político do BE.

Porém, algo de mais tremendo pode ocorrer com esse sector da esquerda: os dois novos movimentos políticos podem promover também a possibilidade de dispersão do voto do eleitorado de esquerda a 25 de Maio, sabe-se lá para que outros partidos…talvez para o Movimento Partido da Terra, com o ex-bastonário da Ordem dos Advogados, Marinho Pinto? Verdade incontornável é que os partidos de direita são aqueles que poderão capitalizar com estas divisões à esquerda, até porque PS e PCP-Verdes estão “à margem” destas polémicas (felizmente para esses partidos, diga-se!), e não ganhando nada com a derrocada do BE, também não deverão perder força eleitoral. A debilidade da esquerda só fortalece a direita, como é óbvio.

Crónica de Nuno Araújo
Da Ocidental Praia Lusitana