Este país não é para velhos – Desnecessariamente Complicado

O que me traz a este tema é a triste notícia do falecimento do maior historiador que este país já viu: José Hermano Saraiva.

Através da sua habilidade com as palavras, o seu discurso fácil, os trejeitos nas mãos, o tom de voz e a entoação muito particular, a facilidade com que improvisava e acima de tudo a sede de conhecimento e de transmitir tudo o que sabia a todo um povo ficará para sempre na memória de todos nós.

Para mim sempre foi uma referência. Confesso que não era um espectador assíduo dos seus programas, mas sempre o admirei e sempre lhe reconheci uma inteligência muito acima da média, assim como uma capacidade de comunicação invulgarmente desenvolvida. Dominava a câmara como ninguém. Sabia atrair a atenção do espectador como poucos. Sabia qual era a melhor forma de transmitir os ensinamentos sobre a nossa história.

Podem passar anos, décadas, milénios, mas há algo que nunca mudará: qualquer povo vale acima de tudo pela sua história, pelas suas raízes. E o José Hermano Saraiva sabia-o melhor que ninguém. Era um exímio contador de histórias. Dos melhores que este país já conheceu. E ficará para sempre na nossa história por isso mesmo.

Um verdadeiro líder não se impõe, é reconhecido naturalmente como tal pelos restantes. E ele sempre foi um líder. Na escola, na universidade, na tropa, na mocidade portuguesa, enquanto professor universitário, enquanto advogado assim como apresentador de televisão.

Na altura em que para mim ele era novo já ele possuía mais de 70 anos de idade. A nossa diferença de idades é escandalosa, contudo graças à jovialidade da sua aparência nunca o encarei como um idoso, nem nunca tinha sequer pensado sobre que idade teria. Agora que faleceu e que a sua idade foi amplamente divulgada constatei que possuía 92 anos de idade. Dei comigo a pensar: “Já? Mas como chegou ele tão depressa a tão avançada idade? Mas ainda há tão pouco tempo ele era “novo”….”

José Hermano Saraiva vai representar para as gerações mais jovens que ainda não têm idade para perceber a sua importância o que representou o Fernando Pessa para a minha geração. Daqui a 50 anos poucas personalidades serão lembradas, mas estas duas estarão certamente incluídas.

Este país não é para velhos porque a memória é curta e acabam esquecidos com extrema facilidade. Basta não terem um programa semanal na televisão, ou na rádio, ou não escreverem regularmente nos jornais, diários ou semanais, para acabaram invariavelmente esquecidos. As homenagens apenas chegam postumamente, e muito raramente em vida. Felizmente, este não é o caso e o José Hermano Saraiva foi amplamente homenageado, vendo reconhecido o devido mérito por ter desempenhado, durante tantas décadas, um papel absolutamente fulcral para a sociedade portuguesa. Fossem todos os casos como este e Portugal seria um país melhor.

De todas as entrevistas e reportagens que passaram desde sexta-feira eu tomei especial atenção a duas frases ditas pelo próprio José Hermano Saraiva. É com estas duas citações que vos deixo.

“Qualquer que seja o futuro haverá sempre noites de luar, a serra de Sintra e o Tejo a correr pró mar”.

“Quando um dos meus filhos me aperta a mão eu sinto o fluxo da vida a correr dele para mim.”

Descansa em paz José Hermano Saraiva.

 

Crónica de Bruno Neves
Desnecessariamente Complicado
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