Gelados Especiais não toca a todos.

Ao “meu” João.

E enquanto o mar batia na areia, e ninguém sabia o que ele dizia, batia na areia e desmaiava, apenas porque se sentia feliz… Diziam os antigos!

Agora sem brincadeiras. Enquanto o mar batia na areia e os meus cabelos colavam no gelado de chocolate que me preenchia a barriga, comecei a divagar e a pensar nas pequenas coisas. Dizem que elas são as especiais, as importantes; falam dos pormenores como os grandes senhores que marcam a diferença e focam-se em coisas minúsculas para definir as grandes.

Quando dei por mim tinha devorado o gelado e o meu corpo pedia outro…o rabo negava, as coxas também, mas a cabeça gritava por um novo sabor, desta vez morango.

E aí, perdida entre a areia e o mar, ignorando a música da esplanada e com metade do meu cérebro a dar atenção ao grão de areia metido entre o meu dedo mindinho do pé e o dedo seguinte, questionei: “ o que nos define especiais”?

Será a forma como tratamos os outros? Será o acto de nos deixarmos amar ou sofrer? Será o facto de fazermos coisas que mais ninguém faz, ou dizê-las em voz alta contrariando o rebanho, e tornando-nos assim a “black sheep” que desvirtua o sistema no seu todo?

Já baralhada comigo mesma, e meia que obcecada com o grão de areia que teimava em não sair por si, a palavra “Verdade” caiu que nem um tijolo.

Mas é claro…só em verdade nos tornamos especiais. Só o fazemos sentir aos outros quando o nosso depósito, seja de fé, confiança, carinho, ou até culpa, nos sai dos fígados. Um dia destes disseram-me que eu não fazia uma pessoa sentir-se especial.

Pois claro, eu sei como sou, e sei que às vezes as emoções me fogem quando me “apertam”, que viro “monstro” quando detecto palavras injustas, que nem sempre sou docinha como o leite-creme da Avó Manela.

Mas não há nada melhor do que a verdade para que os outros se sintam especiais; nada paga o facto de me terem em corpo e alma, de fazerem parte do meu pensamento de forma constante, de serem alvo da minha atenção e preocupação, de arrancarem gargalhadas e lágrimas quase em simultâneo e de me fazerem sentir que um pedaço de mim vive por eles. Portanto, parece-me a mim que a diferença dos especiais e dos comuns reside aqui: numa forma de sentir que não se vê, mas que está intrinsecamente o nosso coração, com a certeza de que a pessoa que está connosco, levará a longo prazo muito mais do que os olhos vêem, muito mais do que os gestos mostram, e com toda a certeza muito mais do que algum dia pensamos vir a sentir.