Governo: rua, já! – Nuno Araújo

Um milhão de pessoas na rua. Um Portugal inteiro, de alma e coração, juntou-se-lhes, e assim demitiu o governo PSD-CDS. As políticas de austeridade têm em Passos Coelho um “grande timoneiro”, mas o “povo é quem mais ordena”. Governo: rua, já!

A manifestação gigantesca de 2 de Março selou ordem de demissão para o governo PSD-CDS, de Passos Coelho, Vítor Gaspar e Paulo Portas. Não há governo, em democracia, que resista a tamanha demonstração de indignação perante políticas destruidoras de vidas e de sonhos de pessoas de carne e osso, crianças, jovens, adultos, para além de retirarem uma velhice descansada a cerca de 2 milhões de portugueses aposentados.

Com quase um milhão de desempregados, e mais dois milhões e meio de trabalhadores precários, Portugal demonstra nesses indicadores a chancela própria de uma govenação falhada, uma governação “à vista” desgovernada. Passos Coelho e o seu governo não demonstram “humildade democrática”, parafraseando o social-democrata Luís Filipe Menezes, ao prosseguir com as mesmas políticas e não colocando os seus lugares à disposição.

Governo pedirá mais tempo…para quê? “Para fumar sem inalar?”

Passos Coelho vai pedir mais tempo à Troika para consolidar o défice. Ao mesmo tempo afirmou que não iria pedir nem mais tempo nem mais dinheiro. Então, em que ficamos? Será que o governo quererá “fumar sem inalar”? Pedir tempo para uma coisa não é pedir tempo à mesma? Bom, o maior risco deste pedido é que o país poderá já não existir verdadeiramente em 2015, vítima de tantos cortes “cegos e abusivos”. A economia portuguesa, em ano eleitoral (teoricamente, claro está), poderá ser um “esqueleto enterrado num caixão”.

Na semana passada, Passos Coelho foi ao SISAB, uma feira internacional de agentes portugueses dos sectores das bebidas e da restauração. Nesse evento, o primeiro-ministro afirmou que o governo vai pedir ao FMI e à UE , vulgo Troika, mais um ano para consolidar o défice. Ao mesmo tempo afirmou que o “envelope” do empréstimo de 98 mil milhões de euros se manteria tal como está.

Uma pergunta: será este pedido do governo à Troika uma “mini-renegociação” da dívida?

Passos Coelho diz que não vai pedir mais tempo nem mais dinheiro à Troika. Mas…pedir mais mais um ano para consolidar o défice das contas públicas não será pedir mais tempo? Enfim…

Com esta decisão de pedir mais tempo, Passos Coelho assume que as suas políticas têm vindo a falhar sucessivamente. Passos Coelho demonstra o quão errado tem sido fustigar os portugueses com a sua constante inclinação para políticas de austeridade; o primeiro-ministro assume não conseguir criar um único posto de trabalho nem mostrar ao país que, apesar da credibilidade do país no exterior estar melhor (pudera, com tantos sacrifícios exigidos a tanta gente), o país das pessoas trabalhadoras, desempregadas, estudantes e reformadas ainda não sente o significado dessas ditas “melhorias” nesse âmbito.

Ora, sendo assim é mais do que natural e indiscutível uma subida do descontentamento geral da população portuguesa, de resto como se verificou bastante bem na manifestação do passado 2 de Março. O PS tem subido, gradualmente, nas intenções de voto demonstradas em vários estudos de opinião. E a tendência será de subida, pois o PS só poderá crescer com a derrocada que a maioria PSD-CDS provocou ao nosso país. Dentro de poucos meses, o PS estará já perto de uma percentagem que lhe daria maioria relativa em eleições legislativas.

Encontro de Hollande com Putin

No encontro que François Hollande teve na passada semana com Vladimir Putin, e que teve a duração de quatro horas, o presidente francês saiu satisfeito deste evento bilateral. O inquilino do Eliseu, que foi muito bem recebido no Grande Palácio do Kremlin, referiu ter em comum com Vladimir Putin uma visão do mundo: resolver os conflitos recorrendo à diplomacia, defender a paz e lutar contra o terrorismo.

Claro que se abordaram os assuntos referentes ao Mali, que preocupam a França, mas também se conversou acerca da guerra civil síria, que agora terá novos desenvolvimentos, em virtude do apoio dos EUA à chamada “oposição” síria, que contempla os grupos armados reconhecidos como tal pelo lado norte-americano, o que exclui grupos paramilitares de ocasião e, por ventura, alguns grupos de índole terrorista.

A adesão da Rússia à OMC (Organização Mundial do Comércio) foi naturalmente abordada. Com a diminuição das exportações de crude, a Rússia tem de procurar outras formas de continuar a senda do crescimento económico e “desbravar caminho” na OMC, entrada essa que só ficou concluída no final do ano passado; porém, depois de 18 anos de negociações para a entrada do país liderado por Putin no “mercado mundial”, é natural que o princípio da actividade comercial externa do país mais extenso do mundo não seja fácil de efectuar. As dinâmicas da OMC são muito mais complexas do que aquelas constantes nos acordos da OMC; as relações comerciais da Rússia com os outros 155 países da organização terão de se selar com vários acordos bilaterais, essencialmente.

George Soros, o maior milionário do mundo, é conhecido como “o homem que venceu o Banco de Inglaterra” (porque o ia levando à falência) ao ganhar mil milhões de dólares num só dia ao pressionar a desvalorização da libra. Em boa verdade, falava-se que Soros tinha uma “regra de ouro”: não investia financeiramente em países onde praticava filantropia. A Rússia era um desses casos, portanto Soros nunca investiu, ele que quando investe nalguma empresa, as acções dessa empresa sobem o seu valor em bolsa, qual “alquimista”. Facto é que nem para a Rússia, aquando da senda das privatizações em período de desmantelação da ex-URSS, George Soros fez uma excepção na sua “regra de ouro”…porque será?

Itália, ou uma deriva esquizofrénica?

As eleições italianas ditaram resultados bem evidentes: ninguém ganhou. A fragmentação de votos corresponde à dispersão desordenada das opiniões, descrentes em grande parte com a nova lei eleitoral, confusa e obtusa, mas acima de tudo com a falta de alternativas à austeridade.

Pois é, Bersani e a sua coligação de centro-esquerda venceram uma câmara parlamentar, a outra foi ganha por Berlusconi, que voltou para derrotar Mario Monti e afirmar que outra grande derrotada foi Merkel. Sim, mais uma derrota para Merkel, a somar à derrota sofrida na Grécia, ainda que com efeitos menos visíveis.

A verdade é que Beppe Grillo, um comediante napolitano logrou colher quase 20% dos votos, e assim pôde dizer, orgulhosamente, que não apoia ninguém para formar governo. Pudera, candidatos como Grillo são a antítese da política, são a anti-política e não resolvem os problemas das pessoas, antes os fazem aumentar de gravidade. Como pode alguém apoiar um governo se nada mais apoia senão uma anarquia institucional? Em suma, 20% de votos deitados ao lixo, mas sem dúvida uma dura consequência do mau elenco que se apresentou a votos em Itália. A respeito disso, disse Peer Steinbruck, opositor de Merkel, que a Itália tinha “escolhido dois palhaços”…

Berlusconi até saiu vencedor destas eleições, porque verdade seja dita, “Il cavaliere” partiu com enorme desvantagem face aos rivais na luta pelo poder. E só com muita sorte é que Merkel não verá o magnata italiano na próxima cimeira europeia…

Que futuro para Itália? Novas eleições? Aposto que sim…

Eslováquia: Robert Fico contra as minorias

Da Europa profunda, o primeiro-ministro eslovaco Robert Fico consegue tirar as luzes dos holofotes de Victor Urban, o infâme primeiro-ministro húngaro, o qual que até recentemente revogou a lei que proibia o uso e difusão de símbolos nazis.

Disse Fico, que “as minorias estão a chantagear-nos”. São homossexuais, minorias religiosas, mas também étnicas, sobretudo a húngara, as camadas populacionais visadas pela falta de tolerância do líder do governo eslovaco.

Disse que “o estado foi fundado para os eslovacos, e não para as minorias”, numa clara alusão à influência que os húngaros têm no país, pois conseguiram fazer com que as estações de comboios junto às fronteiras com a Hungria tenham também o nome em língua magiar, para além da eslovaca. Vozes da oposição afirmam que essa atitude não é mais do que uma tentativa de escamotear a crise económica e o desemprego que assolam o país, e que o governo parece não conseguir contornar.

Crónica de Nuno Araújo
Da Ocidental Praia Lusitana