A grande Revolução dos Media

Desde que Gutemberg apresentou ao mundo o seu método original de impressão que tudo mudou. A partir desse momento, e citando o próprio Gutemberg, o mundo saía das trevas. A palavra de Deus podia finalmente ser transmitida às grandes massas, e todos os seus fieis deveriam rejubilar. Era a impressão da primeira Bílbia a iniciar a Revolução da Imprensa.

A invenção de Gutemberg teve indubitavelmente o condão de levar a palavra e o conhecimento mais além  e é seguramente um dos momentos de viragem no curso da História. No entanto, com grande poder vem grande responsabilidade e a invenção de Gutemberg não trouxe apenas um admirável mundo novo. Como um dia disse Mark Twain, o grande novelista americano, a invenção de Gutemberg traz liberdade a uns, mas também a escravatura a outros. É a protectora e fundadora da Liberdade mas leva o despotismo aonde antes era impossível. E assim foi. Com o passar dos anos e com o descobrir das imensas potencialidades dos media e da comunicação social, o poder político acabou por tomar as rédeas da situação, umas vezes para o bem, outras para o mal.

A este respeito, Noam Chomsky e Edward Herman teorizaram sobre os vários filtros por onde passariam os conteúdos noticiosos. Segundo o que estes autores afirmaram na sua obra «Manufacturing Consent», existem cinco filtros que estabelecidos como pré-condições para os conteúdos noticiosos. O primeiro filtro seria o tamanho, concentração de propriedade, riqueza do proprietário e orientação para o lucro das companhias de ‘mass-media’ dominantes. O segundo filtro estava relacionado com a grande dependência de receitas publicitárias que afecta as grandes companhias de ‘mass-media’. Outro filtro avançado por estes autores consiste na dependência dos meios de comunicação nas informações fornecidas pelo governo, empresas e “especialistas”, todos eles financiados e aprovados por essas mesmas fontes primárias e agentes do poder. Os dois últimos filtros avançados por Chomsky e Herman são o mecanismo disciplinador dos media, ou seja, a crítica a que estão sujeitos, e o filtro do anti-comunismo como mecanismo de controlo e religião nacional. Este último filtro viria ser revisto pelos próprios autores, sendo que, de acordo com Ed Herman, deveria ter sido apelidado de ‘ideologia dominante’, já que desta forma seria mais fácil de compreender e deixaria algum espaço para interpretação.

Durante anos, foi isto mesmo que se passou, e se primeiramente tivemos a Revolução da Imprensa, a chegada do advento da internet virou a mesa novamente e traz-nos a grande Revolução dos Media. A internet trouxe consigo mudanças radicais nos paradigmas da informação e na maneira como percepcionamos as comunicações. As velhinhas estruturas enunciadas e promovidas pelos grandes teóricos dos media e das comunicações encontram-se agora em estado crítico. O desenvolvimento da internet potenciou a colaboração, a interoperabilidade e também o design centrado no usuário, sendo que estes princípios acabariam por facilitar o desenvolvimento de comunidades na internet, redes e aplicações sociais, vídeos interactivos, wikis e blogs.

Esta revolução acabaria por tornar conceitos como receptor  e emissor absolutamente obsoletos, pois produtores e consumidores de informação muitas vezes são apenas um. A topografia dos media alterou-se radicalmente durante a última década e a tecnologia seguiu-lhe os passos, tornando-se mais barata e portanto muito mais acessível a todos, o  que resultou numa certa democratização do acesso e da produção de informação.

Estas alterações fizeram com que a informação disponível nas redes sociais, wikis e blogs passasse a ter um peso muito maior nas sociedades actuais, o que acabaria por ser combatido pela emergência de um novo tipo de política destinada a este novo tipo de media, uma política que embora sendo de não representação, pode ainda assim levar a mudanças sociais e ter impacto na tipologia da cultura política. Os exemplos disto mesmo são inúmeros: desde a guerra no Iraque à Wikileaks, passando pela primavera Árabe ou pelo 15 de Maio espanhol, parece claro que a internet teve um papel importante.

Mas será que tudo são rosas? Obviamente que não. A verdade é que tal como disse Mark Twain acerca da invenção de Gutemberg, não há nada de determinista na internet ou nas ferramentas que a mesma nos trouxe. São apenas meios para atingir determinados fins, fins esses que podem ser melhores ou piores. E enquanto assim for, menos mal. O problema está nas tentativas que são feitas para controlar um espaço que encontra na anarquia o seu ponto de equilíbrio. Tal como anteriormente, o poder político e as suas estruturas anseiam controlar mais este meio. Compete-nos a nós impedir que isto venha a acontecer, pois tal concentração de poder é deveras perigosa e pode constituir um factor decisivo no curso da História.