Há coisas que não são para/de crianças – Mara Tomé

Menos ainda para/próprias crianças de 5 anos! Acho que nunca me adaptarei ao ritmo demasiado acelerado a que crescem as crianças nos tempos que correm.

Posso deixar três exemplos deliciosos:

1. Acne pré-pré-precoce:

Uma das piolhas descobriu uma borbulha na cara… “Ai, pai! Tem uma borbulha na cara! Precisa creme, já já já“.

Ora bem, considerando que, na altura, as piolhas ainda nem tinham 5 anos, eu nem quero tentar imaginar como será daqui a uns meros 6 anitos… Ai… O horror, a tragédia, o drama…

 2. Há os enjoos matinais e há as birras matinais:

Ahhhhhhhh, buáááá, eu quero as botas pink para pôr as calças por dentro!!!” ou “Eu não quero levar calças de ganga porque quero levar um vestido” ou “Dá cá as botas da neve (são umas de sola mais grossa com os flocos de neve bordados) por fora das calças” ou “não quero sapatilhas nada” ou “ai! Não podo sair sem por pefume!” ou  “dá-mes? Dá-mes os teus brincos? São tão uindos…” (atente-se que não têm as orelhas furadas – ainda – exatamente por causa disto: quererem usar os meus pendentes) ou “podo levá um colá de cores?” ou ou ou ou – já perceberam o drama matinal, certo?

 3. Comprar roupa interior feminina.

Há tempos levei as piolhas comigo às compras porque queria ir comprar soutiens. O que eu pensei que fosse uma tarefa simples – ver, escolher, pegar e pagar -, revelou-se bem mais complicado pois enamoraram-se de uns soutiens de algodão azul bebé e rosa bebé e não os largavam. Por muito que eu lhes dissesse que era cedo porque ainda não tinham maminhas para encher aquilo, elas respondiam “mas, mãe, estas mamocas são tão bonitas…“. Eu pousava e elas pegavam. Eu pousava e elas pegavam. E foi asim até eu desandar até à caixa para pagar.


Uff, bora lá. Bora lá, nada. A medo e com alguma vergonha, ainda não tínhamos saído e uma das piolhas, chama-me a atenção, baixinho “olha mãe, também comprei mamocas… “. E lá estava, na mãozita dela, o tal soutien de algodão rosa bebé que ela queria. Fiquei eu envergonhada, voltei atrás e coloquei no lugar, e expliquei calmamente à piolha que comprar implica dar dinheiro (ou usar o cartão) para pagar o que levamos connosco e que, mais uma vez, ela ainda era demasiado pequena para usar soutiens. Por muito crescida que ela (ache que) esteja.

Que se passa com estas miúdas? É da água? Vou já tornar-me sócia de uma qualquer farmacêutica que me possa disponibilizar ansiolíticos a baixo preço e em doses kingsize. A adolescência vai ser um período tenebroso. Para os pais. Mas espero (desejo!) mesmo que essa fase parva e pseudo-revoltosa surja. E que surjam mais destes devaneios fúteis de crianças que já se acham femininas para usar brincos e saltos altos. É um sinal de “normalidade” que brilha como um farol num mar de incertezas. É bom, apesar do que nos espera em dose dupla.

Crónica de Mara Tomé
T2 para 4