Hibernar ou migrar? – Mara Tomé

Começo por dizer que detesto o Inverno. Por todos os motivos. Bem sei que a neve é bonita (mas é fria), que a geada ajuda os campos a regenerar e a produzir (mas é fria), que a chuva é necessária (mas é fria), que o vento faz bem para levar sementes e abanar as árvores (mas é frio), que o frio é preciso (mas – adivinhem lá? Pois é… É frio), que há o Natal (pois, mas no Brasil também há Natal e lá não está frio). Detesto o frio. Gosto de temperaturas amenas e quentes sem serem tórridas. Gosto de me sentir descontraída e de não ter que me preocupar com o fato de treino das piolhas que não tem pelo e o pavilhão é frio e se levam os casacos mais grossos hoje ou aqueles mais leves servem e se as botas deixam entrar água ou não.

Detesto o frio e as mãos com frieiras e o pingo no nariz e os espirros e o corpo rígido/tenso do frio e os pés frios e a chuva e a roupa que nos enchouriça e a roupa que demora horrores a secar e os estendais da roupa em viagens cozinha-sala e o respirar frio e não poder sair sem casaco e ter cuidado a conduzir por causa da chuva/geada e a conta da luz que dispara e e ter as piolhas sempre (S-E-M-P-R-E) adoentadas ou com febre ou com viroses e afins porque está frio e as agriculturas que não correm bem porque a terra está ensopada-não se consegue cavar-o que nasce cresta com a geada e detesto o Inverno, pronto.



Devíamos ter a capacidade de migrar ou hibernar. Como migrar para sul poderá causar transtornos nas viagens e a Terra poderá sair dos seus eixos devido ao peso excessivo de gente no Sul, talvez só reste hibernar.

Ahhh, o preparar o “ninho” durante os primeiros tempos de outono, comer comidas saborosos e quentinhas – e vá, calóricas – para a hibernação; a família toda reunida num espaço quentinho, junta e em sossego; o silêncio quente da respiração de um sono descansado e regenerador; o não haver birras constantes pela casa nem pegas por causa dos mesmos brinquedos nem a TV a passar filmes da Barbie incessantemente nem o “mãe, hoje ficamos em casa outra vez?”, enfim, estão a ver a cena, certo?; mas, acima de tudo, o não ter que passar pela saga do frio e sair com agasalhos e roupas quentes e afins. Porque o frio rapidamente se transforma em calor tórrido nas piolhas que não param de correr e depois transpiram e depois não posso tirar-lhes os casacos de qualquer maneira porque podem apanhar variações de temperatura e depois não sei o que fazer e raios que no verão as coisas são muito mais simples e práticas.

Hibernar parece-me, assim de repente, face aos dias frios e chuvosos e ventosos que têm estado (e face à situação atual do país mas isso são outros carnavais), uma excelente hipótese de que o ser humano poderia dispor…

Crónica de Mara Tomé
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