A historia da Branca de Neve dos nossos dias

No outro dia chamaram-me Branca de Neve, e eu que até nem me acho assim tão bonita, nem tão elegante, nem tão ingénua, imaginei uma historia da Branca de Neve com contornos reais e actuais, daquelas historias em que uma personagem, que não é a má da fita, acaba morta, daquelas historias em que há tiros, sangue, lágrimas e outras coisas mais que os miúdos ainda não deviam aprender.

– Fedelhos, sentem-se aqui à  minha beira, eu vou contar a historia da Branca de Neve e os sete anões!

– Ah Maeeeeee, que seca de historia. Não queremos ouvir, conta-nos antes a historia do Humpty Dumpty!

– Não miúdos impertinentes, esta historia é diferente da que vocês viram e ouviram até hoje. Na minha historia existe sangue, monstros e vampiros!

– Fixe, mãe! Conta conta!

Era uma vez…

Uma tipa estranha de nome Maria José, a quem deram o apelido de Branca de Neve, porque ela estava sempre a comer rebuçados flocos de neve.

Dizem que a mãe morreu porque era muito doente, mas a realidade é que o marido a matou com três tiros, porque ela tinha um caso com o padeiro da aldeia, que era um homem charmoso e bonito, do género do Hércules.

Como o viúvo ainda tinha muita carne para defumar, arranjou uma fulana, por sinal feia de dar dó, e poucos meses depois casaram-se numa cerimonia do tipo Kim Kardashian e o preto rap que não me lembro agora o nome. 

A Branca de Neve, com 17 anos,qestava naquela fase irritante da adolescência, com 17 anos, não gostou nada daquela cena, e comecou a ter umas atitudes que não agradaram nada ao pai. Começou a fumar uns charros (sim, naquela altura já eram uns grandes malucos), a faltar às aulas, a vestir-se de maneira impropria, a pintar-se tipo macaca e a dizer palavrões.

Um dia, o pai fartou-se de ver a filha com um gajo diferente todas as semanas no castelo e ordenou que ela fosse para uma instituição (sim, naquela altura já havia instituições), curar a sua depressão de miúda mimada e excêntrica.

A instituição chamava-se ” Um dia vou ser feliz”, localizava-se no meio da floresta, com umas instalações precárias, tinha como presidente uma velha feia que tinha por habito comer maças a toda a hora.

– Olá Branca de Neve, sê bem-vinda a este local sagrado de harmonia com o teu “eu”!

-Ah? Não percebi!

– Oh, rais parta a miúda! Olha é assim  princesa de meia tigela! Eu sou a B.M. abreviatura do meu nome Bruxa Má, eu sou a presidente desta espelunca aqui no sitio aonde Judas perdeu as botas e as meias, e tu és a minha primeira paciente mulher! Portanto, porta-te bem ou vai haver stress!

– Única miúda? Glup! Estou a ficar assustada!

– Não fiques! A situação é simples! Só vais ter de dividir quarto com mais sete chavalos! São sete miúdos anões que já não bastava o facto de serem nanicos ainda foram abandonados pela mãe alcoólica. Eles vivem permanentemente nesta instituição. A monarquia paga por isso estou-me a borrifar!

– Anões? Oh, bolas! Eu queria tanto comer um gajo por aqui!

-Ei miúda insolente, tens 17 anos, a única coisa que deves comer com essa idade é um prato de cereais chocapic. Acorda para a vida, no futuro terás um reino para reinar!

– Mas B.M, você já viu a minha triste situação? O meu pai casou com uma mulher que além de feia é má. 

– Quero que o teu pai e tua madrasta se fodam! Aqui vais aprender tudo o que é preciso para te tornares numa princesa e triunfares com toda a tua beleza no teu futuro reino!

– Uau! Falas tão bem…arranja-me um cigarro.

– Olha eles estão a chegar! Pessoal, apresento-vos a mais recente paciente deste nobre local, a futura rainha Branca de Neve!

– Olá miúdos, tudo bem? Posso saber os vossos nomes e o que fazem por aqui.

– Eu sou o Manel, apelido Mestre, porque sou o mais inteligente dos meus sete irmãos.

– Eu sou o Francisco, apelido Feliz, porque sou o mais bem disposto dos meus sete irmãos.

– Eu sou o Salvador, apelido Soneca, porque sou o que dorme menos dos meus sete irmãos.

– Eu sou o Alfredo, apelido Atchim porque sou o mais doente dos meus sete irmãos.

 – Eu sou o Daniel, apelido Dengoso porque sou gay.

– Eu sou o Zé, apelido zangado, porque não tenho paciência para estas merdas!

( Oh, finalmente alguém normal por estas bandas) pensou a Branca de Neve.

– Mas falta um! Vocês não são sete irmãos? Perguntou a princesa.

– Falto eu, princesa. Olá, eu sou o Diamantino, apelido Dunga. Dizem por aí que sou mudo e que sou o mais novo dos meus irmãos! Mas ser o mais novo tem as suas vantagens, não achas Branca de Neve?

– Uau Dunga, realmente de mudo não tens nada!

E tu, princesa que fazes por estas bandas? Perguntou o Feliz.

– Não devias estar a vestir vestidos cor-de-rosa e a provar sopas gourmet? Perguntou com ironia o Zangado.

Todos se riram às gargalhadas.

– Calem-se todos! Posso chamar o meu pai, que só por acaso, é o rei deste reino e mandar-vos prender e passar fome para o resto da vida!

– És dinamite, miúda! Exclamou o Dunga.

– Branca, deixa-me explicar-te uma coisa. Estás neste fim do Mundo tal e qual como nós, o teu paizinho não te vai servir de nada aqui, por isso aconselho-te a calares a matraca a a baixares a guarda! Acredita que acontecem coisas muito estranhas por estas bandas à noite. Não queiras ser mais uma vitima da floresta assombrada! Disse o Mestre.

– Meninos, hora de dormir! Conto o final da historia da Branca de Neve amanhã.

– Oh Mãe, agora que estava a ficar fixe!

– Amanhã, já disse! Oupa, chichi, dentes e cama!

Continua…

Crónica de Sandra Castro
Ashram Portuense