Humanos como nós – Memórias com Alma sobre animais e devoção

Era muito pequenina, pelo menos é como me recordo desse tempo, criança, como todos nós fomos um dia…meninos e meninas que vamos esquecendo até a vida permitir recordar tão doces dias…
Prefiro trazer na sacola das memórias, as coisas boas que a vida foi trazendo, a leveza de quem releva o Amor e despeja aquilo que apenas pesa na bagagem durante esta nossa viagem…
Lembro com ternura todos aqueles pequenos e grandiosos momentos que faziam rotinas diárias, mas tão cheios de histórias para contar…

Outras vezes lembro aqueles que são os momentos que ficam gravados nas nossas memórias, com uma força imensa, pela dimensão que tiveram e tomaram nas nossas vidas…Os dias e ocasiões especiais…
Mas o que aqui lembro hoje, e recordo com profundo amor, são os animais com quem partilhamos momentos essenciais da vida, afeto e companhia, que nos devolvem a alma…Esses animais são pessoas como nós.
E, ao lembrar e falar deles, escrevo necessariamente sobre afetos humanos dos mais puros e nobres que podemos almejar…falo portanto, e também, de todos os que nos são queridos afinal…Porque um afeto vem sempre carregado de memórias e emoções que nos lembram quem amamos.

Lembro pois,como todos nós, os que ousamos lembrar, porque muitos têm uma nostalgia terrível em lembrar o que já passou, por vezes por uma imensa tristeza de uma vida em que tudo sorria mais do que mais tarde…Outras vezes, o contrário, marcas de tristezas mal elaboradas no momento em que o deviam ter sido…Vivências
Mas muitos de nós podem ousar recordar, vivendo o presente, construindo o futuro, e recordando o passado e as suas lições…

Quando assim é, e quando trazemos na bagagem apenas aquilo que importa, lembramos com ternura imensa aquilo que foi e que nos tornou aquilo que somos…
Lembro-me dos animais que me foram acompanhando ao longo dos tempos, de forma muito próxima, e dos que eu acompanhei, como muitas crianças o fazem…
Lembro-me de ter tido grilos…os grilos que tive em casa, e que não queria ver nas gaiolas. Antes preferia a sua liberdade… E aí sim, livres, gostava de não os ver, mas tão somente ouvir, por estarem bem escondidos nas ervas dos campo ou por entre os relvados e flores dos jardins, entre fadas, elfos e duendes de locais encantados que apenas as crianças conseguem ver bem, deliciando-me com as alegres melodias dos grilos falantes e das cigarras que cantam nas quentes noites de Verão.

Recordo o Verão do Algarve, as férias em família e as noites quentes de cheiro a mar, o céu estrelado e o luar…
Lembro-me até hoje do caminhar para entrar em casa, depois daqueles jantares que só acontecem no Verão das férias, sempre ao som do ritmo melódico destas pequeninas criaturas divinas…adormecer a ouvi-las e sonhar…
Memórias que não se esgotam no tem nos aquecem o coração.

Encontro na minha sacola de memórias, os encantadores bichinhos da seda, que trazia para casa quando a Primavera se fazia anunciar… Bichinhos que me levavam com os meus pais, em muitas manhãs de Domingo, à velha e sábia Amoreira, junto a Caxias (na altura o local mais perto onde encontrar as folhas que os meus preciosos bichinhos comiam)…Lembro-me de dizer com ar muito sério: “Não, não lhes posso dar folhas de alface, tem de ser de amoreira…é isso que podem comer…”
E o meu pai, alto, lá se esticava todo para apanhar aquelas abençoadas folhas que alimentavam os meus fiéis companheiros toda a semana…
Adorava vê-los a andar na minha mão, pelo chão do meu quarto e da varanda, até ficarem finalmente enrolados aos cantinhos das caixas onde estavam as suas folhas para comer, e transformarem-se em ovais casulos de seda branca…Todos os meninos e meninas tinham bichinhos da seda nessa altura…ou tinham os que podiam…
Era maravilhoso depois ver o rasgar do casulo e as lindas borboletas brancas que dele saíam, leves soltas, a esvoaçar na varanda do meu quarto…

Abria a janela de vidro da varanda e lá voavam para fora dali… Deixava-as ir…livres e soltas…as lindas borboletas em que os meus bichinhos se tornavam…
Não interessava se era pouco o tempo que durariam com vida…Naquele momento eram eternas, lembravam que a vida é transformação, e mostravam a todas as crianças que presenciavam tal evento solene, em tons de cor de pureza alva, suave e terna, como se aprende sem livros a perceber o que é a Vida, o Mundo, o Cosmos…a capacidade de transformação, o ciclo de vida…

Mais tarde chegaram momentos de imensa partilha com outros animais…chegou o tempo de ter comigo, como tantos de nós, os maiores amigos do humano, os nossos fiéis quatro patas.
Gatos e Cães, que partilham connosco momentos eternos e que só quem os tem ou já teve como devota companhia poderá perceber.

São afetos verdadeiros e únicos, que trazem consigo a humanidade transformadora do amor real…
Em vida, dão o melhor de si, verdadeiras dádivas de luz e amor, alegria pura…
Quando partem deixam-nos a saudade imensa da carícia, do olhar vivo e atento, dos pelos suaves e macios, de elos jamais quebrados…

Deixam connosco o que nos trouxeram: um sabor doce e fraterno de amizade pura, mesmo nos dias mais tristes, em que tê-los ao nosso lado é aconchego suave e seguro, com eles jamais se encontra a solidão…
Se choramos, acorrem a nós, com olhos doces de quem consola como nenhuma pessoa o consegue…Chamam-nos com patadas ternas e focinhos meigos…

Outros deitam-se sobre as nossas pernas, bem junto à barriga, onde o inconfundível ronronar se torna cada vez mais sonoro, como se nos estivessem a proteger naquele momento, retirando-nos toda a negatividade que para si absorvem, num zeloso dever e missão…
Cães e gatos, diferentes entre si, de um calor humano inestimável.

Acompanham-nos na alegria, no sono, recebem-nos com doce ternura, acordam-nos com o miar carinhoso, ou o latir e o focinho frio, corações quentes, tornando o nosso amanhecer esplendoroso e com uma renovada energia positiva que vibra e soa nas casas onde eles habitam e a quem permite que este calor humano toque a Alma…
São na sua essência verdadeiros irmãos com quem partilhamos os bons momentos e os menos bons, que evoluem connosco, crescem e adoçam o coração de quem os ama, que, acima de tudo, nos humanizam mais e nos fazem evoluir de verdade, naquilo que mais importa.

A humanidade que muitos destes animais têm encontra-se bem acima daquilo que é o comum humano…
Os nossos quatro patas são sempre pessoas como nós…sofremos com eles quando envelhecem e ficam limitados, choramos quando percebemos que estão doentes de verdade, levam parte de nós quando nos deixam…
Costumava imaginar em pequena que existia um lugar especial para eles depois de partirem…uma espécie de paraíso onde todos ficam depois, com a comida que era deles a preferida, os brinquedos mais fantásticos que os fazem divertir, onde as dores da idade e das doenças cessaram por completo e os afetos são plenos…Onde existem donos como os seus bons donos desta vida, que ali são recriados, com o cheiro que apenas os quatro patas reconhecem…
Costumava acreditar, e ainda creio, que havia um lugar na nossa consciência que é assim para todos nós, onde nos juntamos aos nossos, e recriamos uma vida onde todo o bem se reproduz, e tudo o que de bem não se concretizou poderá finalmente acontecer até chegar um outro tempo.

Também gosto de acreditar que cada vez mais destes nossos amigos, neste mundo, em vida, todos os animais no geral, terão direitos, serão respeitados e amados, um pouco por toda a parte…
Que haverá para sempre um tratamento ético e humanizado para pessoas e animais, em vida e depois dela…
Na vida, como na partida, costumava acreditar que o Mundo seria cada vez melhor, que o Amor era o ingrediente secreto para a eternidade, o elixir para a Alma, o bálsamo para o Espírito…
Porque só o Amor vence sobre todas as coisas, só ele perdura e se torna eterno.
E é de Amor que falo…O Amor é precisamente o que os nossos quatro patas nos deixam de lição mais profunda, se deixarmos, se os escutarmos, se os soubermos amar como eles merecem…

Não há lição mais importante do que essa em boa verdade…
Nasceram animais…pelo Amor que são capazes de dar e pelo Amor que recebem, morrem humanos, e é pelo Amor que nos humanizam ainda mais…Devemos-lhes muito…
Quando acredito numa melhor Humanidade e num Mundo melhor, sei que animais e Natureza fazem parte dessa evolução…

Acredito na Humanidade quando olho as pessoas com os seus cães, com os seus gatos…com os animais que adotam como seus companheiros…
Recordo para sempre o amor carinhoso e incondicional dos meus quatro patas…
Sei que vocês também recordarão sempre os vossos.
São humanos como nós, que nos tocam a Alma, e mudam quem somos e o que sentimos de forma inexorável.
Vidas de Amor e devoção, memórias com alma.