Irão: um novo despertar

O fim das sanções económicas ao Irão significa um novo despertar: é efectivamente um virar de página na história da diplomacia mundial. Os Estados Unidos da América (EUA) retiraram um sem número de sanções económicas sobre o Irão, e embora Washington tenha colocado outras sanções, Teerão agradece podendo perspectivar desde já um crescimento da sua economia de 5 a 6 pontos percentuais para este ano de 2016.

Rouhani, Presidente do Irão, visitará a Europa, nomeadamente Roma e Paris, na próxima semana, numa altura em que o petróleo vai atingir, certamente o valor mais baixo em cerca de vinte anos, em solo europeu. Sairão 25 superpetroleiros com 50 milhões de barris para vários locais do mundo, o que irá sem dúvida abastecer a muito baixo custo os países com indústrias dependentes de petróleo.

Quem não aceitou de bom grado esta novidade foi Israel e a Arábia Saudita. Os primeiros, os israelitas, por verem no Irão um eterno inimigo, que não reconhece a legitimidade da existência do estado Judaico; os segundos, os sauditas, parceiros de Teerão na OPEP, a organização de países exportadores de petróleo, e aliados regionais dos EUA no golfo pérsico, não gostam da presença de tal República Islâmica, a iraniana, devido à divisão religiosa dentro do próprio islamismo entre Irão e Arábia Saudita, sendo que os iranianos são maioritariamente xiitas, enquanto que o território liderado pela família Saudi é sobretudo povoado por fiéis sunitas, ditos salafistas.

O desconforto saudita vai mais longe: o Irão será um concorrente directo da monarquia sediada em Riade quanto aos negócios do petróleo. Neste momento, o Irão produz já mais 500 mil barris de petróleo diariamente, para aumentar o valor próximo de 3 milhões de barris que produzia anteriormente, o que faz descer vertiginosamente o preço do “ouro negro” (que está a preços de saldo, situando-se abaixo dos 30 euros por barril – ndr: terça-feira, 19 de Janeiro, o valor negociado em Londres do brent era de 28,82 dólares o barril). Por força desta intromissão iraniana nos negócios sauditas, a Arábia Saudita está a implementar, lentamente, um plano de austeridade assente na tributação de alguns bens de consumo, pois a sua renda do petróleo vale 70% do PIB saudita, enquanto que o iraniano apenas representa 25% do PIB. De resto, é algo extensível de alguma forma a todos os países da OPEP, que são tão dependentes da riqueza advinda da exportação dessa matéria em bruto que as suas economias pura e simplesmente não se conseguiram diversificar, embora haja a ressalva de que o Irão não está assim tão dependente da venda de petróleo para se desenvolver economicamente.

O Irão tem vendido petróleo a alguns países, nos últimos anos, e sobretudo desde a revolução islâmica em Teerão, datada de 1979, que tem perdido compradores, devido às sanções económicas impostas pelos EUA. O país que deu nome à antiga Pérsia é hoje um país moderno, com uma juventude altamente alfabetizada e exigente, e cujas oportunidades de negócio o Ocidente quis aproveitar, e Teerão aproveita o sempre bem vindo investimento estrangeiro. É isto mesmo, são assim as relações diplomáticas, a realpolitik em acção: se as relações entre Ocidente e Arábia Saudita, devido a incidências indirectas derivadas do conflito na Síria, acabam por “esfriar”, tem de ser posta em prática uma alternativa. E essa alternativa chama-se Irão.

Perante petróleo barato, a China “esfrega” as mãos de contentamento. O ano de 2015 foi o ano de menor crescimento em pontos percentuais (6,9%) e nem mesmo a descida do preço do petróleo ajudou. Este ano de 2016 começa com preços realmente deflacionados da matéria-prima, e assim a China e a UE podem vir a sair realmente beneficiadas do aparecimento em jogo do joker chamado Irão.