Já fui de esquerda…depois cresci!

Vou começar com as touradas. Depois vou partir para a vingança e desembocar no futebol. Que relação têm estes três tópicos entre si? Mais, que relação têm estes três tópicos com o facto da maturidade ter-me feito repensar as minhas convicções políticas? É isto, caro leitor que irei tentar transmitir nas próximas linhas.

Não creio que o leitor esteja profundamente interessado na génese da mudança das minhas convicções políticas. Vou falar-lhe da mesma porque todo o caminho que percorri foi totalmente contra-natura. Qual a relação disto com touradas, vingança e futebol? Já lá vamos! Todo o meu caminho enquanto estudante, assim como muitas das amizades que fui construindo deveriam, pela lógica, desembocar apenas e só numa saída: A esquerda. Sempre ouvi, ao longo da minha curta vida, falarem-me do capitalismo feroz, desse grande cultivador de injustiça e distinção social chamado direita; essa máquina de destruição maciça da igualdade entre os homens. Curiosamente sempre tive maioritariamente professores de esquerda, daqueles que não faziam questão de disfarçar a sua opinião político-ideológica. (Sempre achei o acto de ensinar nobre demais para ser mergulhado de tentativas algo obscuras de formatação de mentes, mas bem, isso sou eu e a minha insignificante opinião). Evidentemente existem excepções mas, regra geral, os professores que não demonstram as suas convicções políticas são politicamente moderados, a pender para a direita.

Foi na universidade que comecei a compreender verdadeiramente o que é a direita e a esquerda e, curiosamente, as sucessivas tentativas daqueles que não conseguiam esconder o seu “esquerdismo” foram mais que suficientes para que conseguisse entender a primeira premissa da esquerda. A superioridade moral. Quem é de esquerda acredita piamente que todas as formas de ver o mundo diferentes são ilegítimas. A direita não se reveste da autoridade moral da esquerda, muito pelo contrário; a direita sabe que a autoridade moral é própria de quem quer construir um mundo perfeito e maquinal a régua e esquadro. A arrogância e o estilo presunçoso daqueles que defendem afincadamente uma visão, etiquetando todas as alternativas como menores sempre me enojou um pouco. A noção de justiça que me fez achar que era de esquerda, a noção de igualdade, a noção do sonho utópico num mundo perfeito começaram a ruir na minha cabeça assim que me vi no mundo universitário. O convívio com a esquerda fez-me virar à direita.

Este processo de crescimento que, creio, não está ainda concluído, nem nunca estará, teve outro ponto que considero determinante. Já pensei, como talvez a maioria, que os conceitos de “esquerda” e “direita” estavam completamente diluídos na sociedade contemporânea. Já não fazia sentido pensar tão “dentro da caixa”. Enganei-me. Enganei-me redondamente. Estou convicto, cada vez mais convicto, que este pensamento de desvirtuar ideologias é um dos principais motores para a designada crise do mundo ocidental. Uma crise de valores? Uma crise económica? Social? Não. Acima de tudo uma crise ideológica. Os Homens despiram-se de ideologias, despiram-se de ideias em que acreditar, divagam não sabem bem por onde nem como. Incoerências várias, maleáveis que desvirtuam o caminho. Hoje, mais que nunca, faz sentido reflectirmos no que é a esquerda e a direita. Faz sentido pensarmos nas especificidades e valores defendidos por cada um dos lados pois, só assim, conseguiremos criar um conjunto de elementos que fazem falta à sociedade: valores, pilares, ideais em que acreditar. Por isso mesmo, e cada vez mais, faz sentido não pensarmos na esquerda e na direita como conceitos mortos e enterrados.

Se é importante distinguir a esquerda e a direita, fará ainda mais sentido saírmos da zona cinzenta e assumirmos um dos lados. O centro é uma área demasiado dúbia. Assumir-se politicamente como uma pessoa do centro é o mesmo que dizer que se acredita em tudo e em nada ao mesmo tempo. É um anarquismo maquilhado de moderação, contudo não deixa de ser o caos. Quais então as diferenças entre a esquerda e a direita? Seria necessário estudar vários autores e, muito provavelmente, nunca chegaríamos a uma conclusão substancial. Existem no entanto elementos que podemos avançar como pertencendo à esquerda e outros à direita. Falemos, por exemplo, da utopia e do realismo. A esquerda cultiva o pensamento utópico, a direita o realista. É da esquerda que floresce a ideia que os Homens nascem naturalmente bons sendo posteriormente corrompidos pela sociedade. A esquerda esquece-se que a sociedade é o conjunto dos Homens. A esquerda também se esquece que o Homem é o único ser que, por ter inteligência, tem prazer em matar (desde as touradas ao mosquito que nos chateia durante a noite), paralelamente é o único ser que, por ser inteligente, se vinga do outro assim como é o único ser que cultiva o ódio, até por aquilo que é, teoricamente, pouco relevante. Pessoas odeiam-se apenas e só por serem de clubes de futebol diferentes, pessoas odeiam-se por terem ideias diferentes, pessoas odeiam-se no trabalho, na escola…pessoas odeiam-se por se sentirem inferiores a outrem, etc.

Conclusões? O ser humano é naturalmente mau. Ao contrário do que muitos autores argumentam não acho que a sociedade tenha uma função de corromper a bondade dos Homens. Pelo contrário, a sociedade civiliza, controla, retira os seres humanos do caos, induz regras, obriga à disciplina e impele ao trabalho. Por isso mesmo, a direita acredita na sociedade para fazer o seu trabalho, deixando os Homens livres. A liberdade é fundamental para a realização pessoal. O estado não deve, mais, o Estado não pode controlar a vida das pessoas através de impostos, de regras que não se coadunam com a especificidade de cada ser individual. Ao contrário da esquerda, a direita olha cada ser humano na sua individualidade, não cataloga as massas como uma força una e indivisível. Cada qual, pelo seu esforço e capacidade deve percorrer o seu caminho sem estar condicionado por aquilo que os outros (sociedade) desejam.

Estamos sempre a crescer. A maturidade é um processo contínuo feio de conquistas e retrocessos. Não tenho qualquer tipo de superioridade moral para afirmar que estou do “lado certo” aliás, ao contrário da maioria, estou certo que esse lado não existe. Tenho a convicção porém que estou do lado menos mau, o lado direito. Espero continuar a crescer, amadurecer as ideias estando receptivo a pontos de vista díspares do meu. Felizmente não me acho dono da razão, porque ela não existe.