Linha Saúde 24: a criar hipocondríacos desde 2007

Ora viva, caríssimos leitores do Maisopinião. Vamos lá a saber uma coisa: como foi a vossa entrada em 2015? Esperemos que tenha sido tão espectacular como foi a minha, que acabou comigo a olhar para o interior de uma retrete, chamando por um indivíduo de seu nome Gregório. E o mais absurdo não é a situação em si, mas sim o simples facto do pelintra do Gregório fazer-se de surdo, levando-me a ficar cerca de 3 horas a chamar por ele. Enfim, são coisas da vida.

Agora que acabei de dedicar um parágrafo inteiro a espalhar parvoíce da boa, vamos então ao tema que escolhi para vos brindar no início deste ano: a Linha Saúde 24. Hoje em dia, o sinónimo de uma ida às emergências de um hospital é o mesmo que dizer que vamos passar uma bela noitada a observar zombies vestidos de batas brancas a laurear a pevide pelos corredores do hospital. Por essa mesma razão, e com base na minha experiência pessoal, opto sempre por telefonar para a Linha Saúde 24, antes de decidir em aventurar-me numa espécie de Walking Dead da realidade, que são os hospitais deste país. Mas isso pode, eventualmente, também ser uma experiência aterradora, ou mesmo traumatizante.

A Linha Saúde, por norma, devia ser um opção válida para nos aconselharmos antes de decidirmos partir numa louca demanda em direcção ao hospital da nossa área. Mas, invés disso, a Linha Saúde 24 fez-me pior: tornou-me num hipocondríaco. Pode parecer uma espécie de exagero da minha parte, mas é um facto real. E como prova disso, eu vou transcrever nesta crónica, o que foi a conversa que tive com uma enfermeira da Linha Saúde 24, e que me deixou completamente hipocondríaco. Ora atentem…

Enfermeira: Linha Saúde 24, em que posso ajudá-lo?

Eu: Boa tarde. Quer dizer, podia ser boa tarde, se não fosse o facto de eu padecer de uma doença que me levou, já em desespero de causa, optar por telefonar para a Linha Saúde 24.

Enfermeira: Vamos a ter calma. Primeiro que tudo, como se chama?

Eu: Ai isso é que é o mais importante? Em vez de me perguntar quais são os sintomas de doença que apresento, o mais importante para si é saber o meu nome? Já agora, quer saber a minha idade, estado social, número de telemóvel e morada, não?

Enfermeira: Calma… Eu necessito de saber os seus dados, para no caso de ter de o direccionar para o hospital mais perto de si. Só preciso de saber a sua morada e o seu número de utente. O telemóvel já o tenho aqui no meu visor.

Eu: E se eu estivesse a morrer? Hã? Também teria de responder a um inquérito?

Enfermeira: Por favor, mantenha a calma… Vá, depois logo tratamos dos seus dados. Diga-me, por favor, quais são os seus sintomas?

Eu: Ah, finalmente. Olhe, estou há 3 dias com febres altas.

Enfermeira: Febres altas? Quais as temperaturas?

Eu: 37 graus.

Enfermeira: Ah, mas isso não é bem febre… Sabe, só a partir dos 38 graus de temperatura é que é considerado febre. Mas acontece que, em alguns casos de pessoas mais fracas, 37 graus as deixem com a sensação de febre alta. Quando isso não é verdade…

Eu: Hã?! Então eu sou uma pessoa fraca? Ai, meu deus. Será que tenho algo mau?

Enfermeira: Calma… Que mais sintomas tem?

Eu: Dores no corpo e uma enorme dor de cabeça.

Enfermeira: Hum… Dores de cabeça… Hum…

Eu: Ai! O que foi? Será que tenho algo mau? Ai, meu Deus! Será um tumor cerebral?

Enfermeira: Ei, tenha calma… Não vamos exagerar… Tem o nariz congestionado?

Eu: Sim, por vezes parece uma torneira a largar ranho, e por outras está tão tapado que faço tanta força para o ranho saia, que sinto a cabeça a querer explodir. Está a ver, como quando estamos a sofrer de uma prisão de ventre, e depois de fazermos tanta força para conseguirmos evacuar, algo acaba por sair, mas não são fezes, mas sim hemorróidas?

Enfermeira: Hum… Estranho…

Eu: Ai! É estranho eu fazer tanta força e acabar por sair hemorróidas em vez de fezes?! Ai, será que tenho um problema intestinal. Ou melhor, no ânus?! Ai, será cancro?! Ai, meu Deus!

Enfermeira: Calma! Concentremo-nos no nariz. As dores de cabeça normalmente são causadas pela acumulação de expectoração nos seios perinasais…

Eu: Ai, meu Deus! Será que as febres altas de que tenho sido alvo, estão relacionadas com algum tipo de problema nos seios?! Ai, Ricardo, tu queres ver que tens um cancro mamário?! Ai, mãe… Ai, meu Deus!

Enfermeira: Ó senhor… Não são esses seios… São os seios perinasais! No nariz!

Eu: Ah, eu tenho cancro no nariz? Ai, credo! E agora?! O que vou fazer à minha vida?! O melhor é ir já ao hospital e na triagem dizer que tenho cancro no nariz, e que foi uma enfermeira da Linha Saúde 24 que o diagnosticou, não é?

Enfermeira: Ei! Tenha calma! Você já ouviu bem o que está a dizer?

Eu: Tem toda a razão! Eu não deveria estar aqui a perder tempo a falar consigo. Tempo precioso que pode vir a salvar o meu nariz, no caso de se tratar de um diagnóstico precoce!

Enfermeira: Mas… espere…

Eu: Era o esperavas! Eu vou é já para o hospital! Adeus!

E aqui está a prova de que me tornei hipocondríaco depois desta chamada telefónica para a Linha Saúde 24. Mas esperem… Agora que voltei a reler o diálogo telefónico, constato que já era hipocondríaco antes de ligar para a Linha Saúde 24! Ai, meu Deus! O melhor é ir já a correr para o hospital! Desculpem, mas não tenho tempo para despedidas cordiais! É a minha saúde que está em risco! FUI!