Mais (ou menos) Europa – Nuno Araújo

A UE recebeu o prémio Nobel em “mãos”. Enquanto isso se passou, os líderes europeus reuniram-se em mais uma cimeira europeia, que confirmou a criação da “união bancária”. Confirmou também ajuda à Grécia, que já estava bloqueada desde Junho. Mas não conseguiu confirmar aquilo que é, para já, impossível: uma Europa federal.

UE: Prémio Nobel

Eu concordo inteiramente com o prémio Nobel atribuído à UE. Sou europeísta, claro, e assumo-o frontalmente, e acho que há uma série de factores que são indissociáveis à UE, em prol da paz.

Juntar França e Alemanha numa comunidade para supervisionar a produção de carvão e aço, assim como as questões nucleares foi uma ideia brilhante e produtiva, antes de mais. O povo germânico necessitava de crescimento económico, a França também, e a Europa de paz. Juntou-se o útil ao agradável, pois gerando riqueza e prosperidade, franceses e alemães passaram a coexistir pacificamente, num ideal duradouro de estabilidade regional.

A UE contribuiu para o fim da Guerra fria e para a queda do muro de Berlim, pois acolheu a Alemanha Oriental, a “democrática”, no seu seio. Ofereceu taxas de juro baixíssimas, através dos seus estados-membros, para a reconversão da indústria obsoleta de inspiração soviética (ainda que para isso, numerosas privatizações escandalosas tenham ocorrido, para desproveito do povo oprimido até então).

Apesar da UE não ter sabido estancar as feridas da desmantelação da ex-Jugoslávia que logo entraria em guerra sangrenta, conseguiu fazer com que a divisão da Checoslováquia em República Checa e Eslováquia se processasse de modo bastante correcto e democrático.

A UE é, hoje em dia, a entidade política que mais apoia financeiramente países em desenvolvimento, assim como a entidade política que mais incentiva as boas práticas ambientais, para além de promover a democracia representativa e constitucional nos seus estados-membros.

A UE também é, em uníssono, contra a pena de morte, abolida oficialmente em todos os seus países.

A UE leva a cabo inúmeras iniciativas que promovem a inclusão social, e que recriminam a xenofobia, a exclusão social, o tráfico de seres humano, entre outras “bandeiras”.

Sabendo de tudo isto, parece óbvio que a UE merece inteiramente este prémio. Mas o desafio à UE é claro: a integração europeia deve ser um passo em frente, e não um passo atrás, como tem sido dado a entender aos cidadãos europeus.

Um balanço da cimeira europeia

A UE está necessitada de políticas vigorosas que revitalizem a economia e que ofereçam esperança aos seus cidadãos, mas os seus maiores líderes apenas vão fazendo “os mínimos indispensáveis” para a UE não colapsar.

Com efeito, a UE dispõe de tratado de Lisboa (que determina princípios gerais pelos quais a UE se rege), dispõe de orçamento comunitário (o de 2014-2020 está difícil de ser aprovado), assim como de divisa comum para 17 dos 27 países da União Europeia. Mas a UE não tem política real de integração europeia.

Um dos factores mais importantes, e que explicam o adiamento quase “sine die” da discussão mais “a sério” acerca dos passos a dar em direcção a um federalismo na UE, é que a Alemanha terá eleições legislativas já no próximo ano; outra razão prende-se com a data das eleições europeias (Verão de 2014), o que remete essa discussão para o período pós-eleitoral.

Angela Merkel e François Hollande parecem ter receio daquilo que poderia resultar da discussão acerca de um eventual federalismo europeu. Merkel, receia perder as eleições alemãs, pois só consegue colocar-se em primeiro lugar nas sondagens pois vai salvando a Grécia, mas age como se não precisasse desse país na UE (e quase que faz o mesmo com Portugal, de certa forma). Hollande tem receio de que os seus opositores internos (que não são poucos) lhe retirem margem de manobra, ele que já vem a perder aprovação por parte dos seus eleitores, pois recuou nalgumas medidas mais “duras” para com o capital financeiro e especulativo operante em França.

De cimeira em cimeira, as razões vão mudando, mas o efeito é sempre o mesmo: as respostas à crise são poucas e curtas no seu alcance. Diz o “Libération”, e com razão, que “a Europa está congelada”.

União Bancária: que união?

Já o “Le Monde” é bastante mais expansivo na sua análise à União Bancária. Escreve que “a Europa vai finalmente controlar os seus bancos (…) instituições que tenham mais de 30 mil milhões em activos, que pesem mais de 20% do PIB do país de origem ou que beneficiem de apoios europeus”, esclarece o jornal. Ora, dos seis mil bancos e instituições financeiras operantes na UE, apenas cerca de 200, na melhor das hipóteses, poderão ser alvo dessa supervisão por parte do BCE.

O “Le Monde” deve atribuir os louros a François Hollande, presidente francês socialista; mas só a ligeireza de Merkel e a sua vontade de agradar a sectores mais europeístas do seu partido e eleitorado é que dão essa vitória “inexpressiva” a Hollande.

Na verdade, a vitória é de Merkel, pois continua a proteger os bancos regionais dos estados alemães, que não queriam ser alvo da supervisão do BCE. Merkel conseguiu, igualmente, inviabilizar a garantia dos depósitos europeus.

A Alemanha consegue ter uma União Bancária que não é digna desse nome, mas é projecto feito à medida dos seus interesses.

Notas

Itália
“Il Cavalieri”, Silvio Berlusconi, ex-primeiro-ministro de Itália, prepara-se para voltar à cena política, após o presidente Napolitano ter aceite o pedido de demissão de Mario Monti, actual primeiro-ministro italiano. Diz-se nos bastidores da política europeia que a entrada de Mario Monti no governo de Roma evitou a bancarrota e descalabro da economia italiana. Diz-se que um eventual regresso de Berlusconi significa uma de duas coisas: ou Itália já está salva de cair no abismo, ou então a queda de Itália é um dado adquirido. Uma coisa é certa, os juros da dívida pública italiana têm subido em flecha desde essa notícia.

Espanha
Estava Mariano Rajoy, presidente do Governo espanhol, muito mais descansado em relação à economia (frágil) do seu país, quando soube que Berlusconi pode voltar à liderança de Itália. Deve ter sido “um balde de água fria”. Ora, Itália e Espanha têm estado em “despique”, a ver qual delas é que sobrevive à “hecatombe” do euro. Os juros da dívida espanhola aumentaram (e de que maneira!), quando os mercados souberam da notícia desse tal possível regresso em Itália. Com isso, Passos Coelho ganhou espaço para pedir IRC a 10%, em vez de 25%.

Portugal
Passos Coelho foi à cimeira europeia defender IRC a 10%, em vez dos actuais 25%. Perdeu, uma vez mais. As derrotas de Coelho têm sido mais que muitas.

Um dos seus ministros, o independente Álvaro Santos Pereira, comprou uma guerra com a ministra do ambiente, a centrista Assunção Cristas. Ele quer políticas menos defensoras do ambiente, referindo-se a uma reconversão da industrialização, ela quer mais ambiente. Pois claro, cada um “puxa a brasa à sua sardinha”. E Passos Coelho assiste, como um “chefe, mas pouco”, a uma intriga política no seio do próprio governo.

Paulo Portas reune-se com o presidente da Autoridade Palestiniana, Mahmud Abbas, que veio a Portugal agradecer o voto favorável do nosso país em sede de ONU, em relação ao reconhecimento da Palestina, basicamente, como um estado soberano. Portas “fez bonito”, e Passos Coelho prossegue em “tropeçar”, enquanto o presidente Cavaco Silva vai pedir a fiscalização sucessiva, do orçamento deplorável que irá promulgar.

O governo pede união aos portugueses, mas o governo nem sequer mostra união no seu interior. De que é que estão à espera para se irem embora? Demitam-se!

Crónica de Nuno Araújo
Da Ocidental Praia Lusitana