Marcelo Rebelo de Sousa: carta aberta ao professor

Exmo. Sr. Prof. Marcelo,

Antes de mais, dou-lhe os parabéns pelo lugar conquistado na presidência da republica, deve estar fora de si e eu considero um verdadeiro acto de coragem a sua candidatura. Mostra-nos que muito para além dos partidos existem pessoas que valem por si e não apenas por ideologias politicas. Escrevo-lhe esta carta porque acredito que tem a noção dos esforços que os portugueses fazem, acredito que não fará parte dos que compram serviços de jantar e afins para satisfazer os luxos dos seus convidados. Acredito que fará diferente. Acredito que de facto fará parte de um projecto de mais valia para todos os portugueses. E digo todos, porque neste momento considero que vivo num país onde se premeia a corrupção e a preguiça, felizmente nem todos os portugueses são corruptos e preguiçosos.

Prof. Marcelo dizem as estatísticas que Portugal é o 12º país do mundo com mais emigração, que é rara a família que não tem um familiar a trabalhar no estrangeiro. que a nossa mão de obra qualificada vê-se obrigada a sair do país, etc. Coloquei-me na pele de um destes emigrantes, que se viu obrigado a sair do país que o viu nascer, deixando as suas raízes, a sua família, os seus pertences, tudo. Na sua mala leva apenas algumas roupas, a suficiente para alguns meses de estadia num país desconhecido, parte… De imediato fiquei com um vazio no coração, mesmo sabendo que no destino estaria uma vida melhor, uma vida que Portugal já não me oferecia, esse vazio preencheu-me. Ser emigrante não é o que a maioria pensa, ser emigrante é um acto de coragem que neste momento Portugal despreza. E despreza porquê? Porque simplesmente não se preocupa em oferecer condições para os que querem voltar. “Obriga-nos” a ficar presos ao desconhecido, não tem um subsidio ou outra “coisa” qualquer para que aquele que deseja regressar possa requerer até encontrar um solução de trabalho. Autoproclamaram o desejo do regresso dos portugueses, mas quanto a mim não passam de promessas… Desminta-me se estou enganada.

Prof. Marcelo neste momento Portugal vive uma politica de contrariedades, ou seja tenta-se contrariar tudo aquilo que anteriormente tinha sido feito, retiram-se os exames ao 4º e 6º ano, retiram-se as 40h semanais aos funcionários públicos, só porque estas e outras medidas faziam parte do anterior governo… Confesso-lhe que repudio a politica, faço parte de uma geração que está farta de politiquice, promessas sem fundamento, orçamentos sem pés nem cabeça e mais recentemente de uma politica “é assim porque tem de ser, nem que seja à força”. Não faço parte da função publica, trabalho 40h semanais, desconto mais que o salário mínimo e por isso Portugal não tem nada para me oferecer. Não tenho direito a quaisquer subsídios, tenho de pagar todos os meus impostos e não tenho um livro de graça para as minhas filhas estudarem. Nem vale a pena queixar-me porque de nada vale, os governantes deste país estão a borrifar-se para os esforços que tenho de fazer para cumprir com todas as minhas obrigações a cada mês. Ao invés disso, utilizam o dinheiro dos meus impostos para dar subsídios aos que precisam e aos que têm ipads e outros ais… Ultimamente voto porque acredito num futuro melhor para as minhas filhas. Não me decepcione.

Prof. Marcelo, por ultimo queria pedir-lhe um favor, vou dar um jantar em minha casa, mas não é um jantar qualquer. É um jantar para cerca de 50 pessoas, da ementa fará parte o cozido e o arroz doce e à mesa pretendo sentar sem-abrigo, famílias carenciadas e emigrantes com saudades do seu país. Queria pedir-lhe se nos empresta o faqueiro recentemente comprado? Sei que não farão qualquer diferença na nossa mesa, mas como são parte do interesse nacional e foram adquiridos com algum do meu dinheiro, gostaria de pelo menos uma vez na vida poder usufruir de alguma coisa que paguei com os meus impostos. Peço-lhe desculpa por lhe estar a fazer o pedido a si, sei que foi eleito há poucas horas, mas de facto não costumo dirigir a palavra a desconhecidos e neste momento não conheço os governantes do meu país.

Certa de que este assunto vai merecer a sua atenção, os meus respeitosos cumprimentos,

Maria Raquel