Morrer da cura – João Cerveira

Em 2011, toda a oposição, da direita à esquerda, fez-nos crer que o país não precisava de mais austeridade, como anunciava o famoso PEC IV, tendo votado contra o mesmo, apesar do aviso que a alternativa seria a vinda do FMI.

Tiveram o que pretendiam. A saída de Sócrates e a entrada do FMI e seus parceiros (a chamada Troika) no nosso país.  E quem disse “basta de austeridade” enquanto oposição, não faz outra coisa agora senão aumentar, consecutivamente, a “dita cuja”. E ainda se isso trouxesse resultados. A saber:
– a despesa pública do Estado diminuiu? Não;
– o deficit diminuiu? Não.
Se, a isto, pensarmos que os impostos aumentaram drasticamente, que originou o decréscimo do consumo, que por sua vez originou o decréscimo dos lucros das empresas (algumas deixaram mesmo de ter lucros), desde as pequenas às grandes, que originou que muitos trabalhadores perdessem o emprego, até porque muitas fecharam, que – finalmente – por sua vez diminuiu a matéria tributável (aquilo onde o Estado pode ir cobrar impostos) e aumentou a despesa social (subsídios, etc).

Não contentes com isto, os senhores do FMI – que já pediram desculpas pelo menos duas vezes por errarem os cálculos – dizem que o tempo não é para “complacência” e que há de continuar as reformas e cortes. Agora dizem que há professores a mais. E que se gasta muito na saúde. E que todos os outros sectores deviam estar sujeitos à mobilidade.
Deixem ver se percebi: os hospitais, que já não fornecem medicamentos a doentes oncológicos porque são muito caros ou que fecham blocos operatórios porque não há dinheiro para o material necessário para as cirurgias, ainda gastam muito para os economistas do Fundo; se todos deviam estar nos planos de mobilidade, mas, no entanto, há professores a mais, estarão os economistas do Fundo a sugerir que os professores a mais podiam muito bem estar num outro serviço, quiçá limpeza urbana ou jardinagem numa câmara municipal ou auxiliares de acção médica num hospital? Mas esperem! As câmaras e os hospitais não podem receber mais ninguém porque não têm receitas para isso. Fazemos o quê, senhores economistas? Ficam no desemprego? Isso não pode ser, porque aumenta a despesa do Estado em prestações sociais. Fazemos o quê, senhores economistas?

Os economistas do FMI saberão, provavelmente, de acções na bolsa, de investimentos de capital em empresas. Mas já se viu que pouco ou nada entendem de como governar um país. Fazem asneira nos cálculos, põem países em recessões severas porque não previram as consequências dos seus cálculos, originam pobreza e dificuldades a milhões de pessoas e depois pedem desculpa, como se pede na rua, a alguém com quem chocamos sem querer ou ao colega com quem tínhamos combinado emprestar um livro mas esquecemos o livro em casa.  E, no minuto seguinte, vamos lá pisar mais um pouco estes desgraçados que, mesmo na miséria, ainda vivem acima das suas possibilidades.

Houve entre 1933 e 1945, na Alemanha, um governante que se preocupava tanto com a população como estes senhores. E hoje em dia na Alemanha têm vergonha de falar nele e proibiram a ideologia politica que ele defendia. Mas prosseguem um dos seus objectivos: colocar a Europa de rastos, à mercê e subserviente à poderosa potência.

 

 

Crónica de João Cerveira

Diz que…